Uma pesquisa do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), instituição vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovações e com unidade em Belo Horizonte, comprovou a presença do coronavírus suspesno no ar por período até quatro horas. O estudo, divulgado nesta sexta-feira (12), liga o alerta para a necessidade de ampliação dos protocolos de combate à transmissão da Covid-19: além do álcool em gel e máscara, os espaços precisam ter ventilação natural ou mecânica para evitar o contágio.

O foco da pesquisa, iniciada em maio do ano passado e com coletas de material feitas em dois hospitais e espaços públicos de BH, está na 'caminhada' feita pelos aerossóis atmosféricos no ar logo após serem gerados pelo emissor. Os aerossóis são partículas microscópicas invisíveis com baixo peso e baixa massa. Eles são muito menores do que as gotículas de saliva, que podem ser vistas a olho nu.

"Esses aerossóis são formados até mesmo durante a fala, grito, canto, respiração e tosse de uma pessoa contaminada, principalmente se não estiver de máscara, ou pela evaporação de parte dessas gotículas visíveis, que sofrem redução de tamanho e passam a ser invisíveis e 'flutuarem' no ar", explicou Ricardo Gomes Passos, pesquisador do CDTN, responsável pelo estudo.

De acordo com Ricardo, a pesquisa mostrou que, após gerado, o aerossol contendo o vírus causador da Covid faz um percurso pelo ar e pode ficar suspenso e concentrado na atmosfera por período estimado entre duas e quatro horas.

O tempo exato dessa permanência no ar não foi foco da pesquisa. Conforme o pesquisador, "cada caso é um caso" e a quantidade de tempo em que o vírus fica suspenso vai depender de diversos fatores, como a quantidade de pessoas infectadas em um mesmo espaço, o tamanho do ambiente e o nível de circulação de ar presente nesse local.

Circulação de ar

"Imagine uma pessoa que está infectada e não sabe. Ela está em um restaurante, seguindo os protocolos, passando álcool e se sentando com distanciamento. Ela tira a máscara. Mesmo com a distância, estando infectada, ela vai gerar aerossóis que, dependendo da condição de circulação de ar, podem se acumular", explicou.

Segundo ele, a preocupação com o uso do álcool em gel e máscara deve continuar, devido à possibilidade de transmissão por gotículas ou mesmo por contato com a superfície de objetos e móveis. No entanto, a infecção ocasionada por aerossóis é tão importante quanto e ainda recebe pouca atenção.

"É uma questão de necessidade de atualização dos protocolos de segurança. Neles, não é mencionada a ventilação, para evitar que os aerossóis se concentrem no ambiente. Em alguns países, como a China, os protocolos já foram atualizados", afirmou o pesquisador.

Conforme o estudioso, enquanto a desinfecção de mesas com álcool controla a transmissão, por exemplo, o contágio via aerossóis é agravado devido à capacidade deles de permanecerem no ar por longos períodos.

"Essa questão poderia ser controlada de forma mais eficaz com um sistema obrigatório de ventilação em ambientes fechados, ventilação natural ou mesmo mecânica", pontuou.

Conforme o estudo, em ambientes externos, onde há circulação de ar, as amostras negativaram para o SARS-CoV-2 - vírus da Covid. A hipótese, segundo a pesquisa, é que os riscos sejam mais reduzidos nesses locais abertos devido à "alta dispersão que pode ocorrer com os aerossóis".

O estudo

A pesquisa sobre a presença do coronavírus no ar teve início com a coleta de 62 amostras de ar, entre maio e agosto de 2020, em BH. Do total, 52 delas foram colhidas em ambientes externos e internos de dois hospitais da capital, que não tiveram o nome divulgado; e outras 10 em espaços públicos da cidade.

Os centros médicos escolhidos, conforme o estudo, têm infraestruturas diferentes para o controle de contaminação, incluindo áreas dedicadas a pacientes com suspeita ou infectados com Covid-19, e espaços sem pacientes confirmados ou suspeitos com a doença.

"O estudo reúne evidências da possibilidade maior de dispersão do vírus em espaços fechados com circulação de ar insuficiente, nos quais a taxa de troca de ar costuma ser muito menor do que o necessário, na presença de indivíduos tossindo, espirrando ou gritando, especialmente quando os protocolos de uso de máscara e distanciamento não são respeitados", informou o CDTN, em nota.

As análises, feitas pelo CDTN, instituição ligada à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e ao Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovações (MCTI), tiveram colaboração do Laboratório de Vírus da UFMG.

Além da pesquisa sobre a presença do coronavírus no ar, o CDTN realizará análise de aerossóis nas estações de tratamento de esgoto e nas casas de pessoas com Covid-19. Conforme o instituto, o objetivo é aferir os riscos de transmissão nesses locais, e projetar estratégias de cuidado e prevenção do contágio pelo ar.