A última decisão do governador de Minas nos deixa incrédulos de tão insana e inoportuna: o estado brasileiro em pior situação financeira, que vem pregando a adoção um programa duríssimo de recuperação fiscal, vai dar reajustes salariais de quase 40% para o pessoal da segurança. Isso mesmo. Nos próximos três anos de sua gestão, Zema quer favorecer ao máximo a polícia enquanto joga o peso da crise nos servidores com menor poder de pressão. Não tem como dar certo. Só pode acabar mal.

O governo não informou o impacto financeiro dos reajustes que anunciou nesta sexta-feira (22). Talvez nem tenha tido tempo de fazer contas; a decisão do aumento veio repentinamente, sob a pressão de uma mobilização de policiais nos dias anteriores. A categoria tem sido a mais privilegiada no executivo estadual; o seu piso salarial dobrou entre 2011 e 2015. Mesmo assim exigiu o super aumento a título de recomposição de perdas nos últimos quatro anos anos. E Zema cedeu.

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Os salários dos servidores praticamente estagnaram no governo Pimentel em função de restrições financeiras e legais. A despesa com a folha superou o limite a partir do qual os reajustes salariais são vetados pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso mesmo: o governo vai violar a legislação para conceder os aumentos aos policiais.

Além de ilegal, o aumento de gastos com servidores da segurança se choca contra um dos principais postulados do Regime de Recuperação Fiscal, o programa federal de socorro aos estados que o próprio Zema vem vendendo como saída para a crise mineira. Como ele vai justificar o super reajuste ao Tesouro Nacional?

O governador também terá dificuldades para explicar a decisão ao STF, que emitiu no início do ano liminares permitindo a Minas deixar de pagar parcelas de suas dívidas com a União e usufruir na prática de uma espécie de moratória branca. Embora a população não saiba, essas liminares deram alívio financeiro ao Estado. Agora, como o Supremo irá manter a atual posição complacente enquanto o governo dá reajustes de quase 40%? Afinal, a intenção da corte era dar fôlego à gestão estadual enquanto se adotam as medidas de ajuste e não abrir espaço nos cofres para aumentos salariais.

O super reajuste é tão paradoxal que impõe a pergunta: o que passou pela cabeça de Zema? Ele pirou? Não podemos ler os pensamentos do governador, mas podemos especular sobre suas motivações. Talvez tudo seja um jogo maquiavélico. Zema sabe que o super aumento é insustentável e espera ser pressionado a recuar. Mas aí teria a justificativa para os policiais de que tentou atendê-los mas foi impedido por restrições fora do seu controle. Se o plano é esse, o governador está brincando com pólvora. É temerário tentar enganar essa turma.

Há uma hipótese mais simples. Zema tremeu de medo e abriu as pernas para os policiais. Não seria o primeiro governador em Minas a perder a autoridade e os colhões diante da pressão policial. Eduardo Azeredo perdeu a reeleição após ser desafiado e dobrado por tropas de PMs.

Pode ser ainda que Zema tenha sido seduzido pelas ideias autoritárias de Bolsonaro e esteja buscando cooptar os policiais para que eles não hesitem em descer o cacete em protestos de professores e demais servidores aos quais serão exigidos sacrifícios para o Estado cumprir o draconiano RRF. Se o plano é esse, pior ainda. É temerário apostar na repressão dura a servidores que não carregam armas e escudos mas podem paralisar a máquina do Estado e possuem enorme resiliência. E exite alguma chance de que o professor aceite perdas enquanto o policial ganha aumentos? Claro que não.

Qualquer que tenha sido a motivação de Zema, o super reajuste para a polícia neste momento detona a arquitetura do programa RRF, além de inviabilizá-lo politicamente. Agora, com que argumento e credibilidade o governador irá pedir apoio e sacrifícios à sociedade e ao legislativo para fazer seu ajuste no Estado?

Parece loucura, mas é muito real: o governador acaba de implodir a saída que ele mesmo propôs para a crise mineira.