O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, Lucas Furtado Rocha, e deputados da oposição criticaram a decisão do presidente Jair Bolsonaro e do advogado-geral da União, José Levi Mello do Amaral Júnior, de pedir, ao Supremo Tribunal Federal (STF), a suspensão do bloqueio de perfis de bolsonaristas nas redes sociais. Para eles, a atitude é um desvirtuamento do papel constitucional da AGU.

 
O bloqueio dos perfis foi determinado pelo ministro Alexandre de Moraes, relator no STF do inquérito das fake news, que apura notícias falsas, ofensas e ameaças contra autoridades. A medida foi solicitada ainda em maio, quando apoiadores do governo foram alvo de buscas em operação da Polícia Federal, e cumprida na sexta-feira passada por Twitter e Facebook.
 
Um dos atingidos pela decisão de Moraes, o fundador da rede de academias Smart Fit, Edgard Corona, disse, em nota, que não se sente representado pela ação do governo no STF. "Tendo em vista o noticiário recente envolvendo reações a medidas adotadas pelo ministro Alexandre de Moraes no curso do inquérito 4781, informo que a única pessoa autorizada a me representar perante o Supremo Tribunal Federal é o advogado Celso Vilardi", afirmou.

A ação direta de inconstitucionalidade protocolada no sábado, 25, e assinada por Bolsonaro alega que o desbloqueio das contas é necessário para "assegurar a observância aos direitos fundamentais das liberdades de manifestação do pensamento, de expressão, de exercício do trabalho e do mandato parlamentar".

Para Furtado, o caminho adequado, para defender a liberdade de expressão ou algum artigo da Constituição visando aos interesses de cidadãos comuns, seria recorrer ao Ministério Público Federal. "Conseguem transformar uma questão privada em uma guerra pública. Há real interesse do presidente da República na questão. Para o bem da democracia brasileira, esse limite deve ser melhor definido", disse Furtado, que é professor de Direito Administrativo da Universidade de Brasília.

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) classificou a ação como "totalmente equivocada" e disse que a assinatura de Bolsonaro na peça tem um peso simbólico e revela a utilização do órgão com finalidade política. "Eles estão usando a máquina de governo em defesa de seus propagandistas, agitadores de internet", criticou. "Ainda que se possa discutir uma tese: se a decisão do ministro atinge interesses individuais, se é censura prévia ou não. Ainda assim, não cabe à AGU discutir isso."

"Usar a AGU para defender os amigos do presidente, em vez de interesses da União é o cúmulo da instrumentalização", afirmou o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ). "A AGU representa a União e não tem por missão institucional advogar para o grupo político do presidente", completou o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

Advogado-geral da União entre 2009 e 2016, Luís Inácio Lucena Adams classificou a ação como "não muito ortodoxa", mas afirmou que "não há nada de errado" no pedido. "Aqui a conotação política e ideológica é muito marcada, mas, independentemente disso, não é estranho nem errado, já que, nesse caso, a tese é a liberdade de expressão", afirmou Adams.

O ex-AGU explica que uma Adin não busca beneficiar apenas os casos que estão sendo julgados, mas todos o brasileiros que eventualmente forem lesados pela suposta inconstitucionalidade - no caso, a limitação à liberdade de expressão. "Quando eu era advogado-geral, entrei com uma ou duas Adins com o presidente. Nesses casos, não cheguei a assinar. Eu reservava minha posição para apresentar posteriormente, diretamente no Supremo."