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Empresas que têm concessionárias de rodovias como clientes fornecem funcionários terceirizados que trabalham para a Artesp (Agência de Transporte do Estado de São Paulo) para lidar com os interesses dessas mesmas concessionárias de rodovias.
Embora as contratações sejam amparadas como apoio aos serviços do órgão público, uma série de documentos entregues nos últimos dias ao Ministério Público indica uma delegação ampliada.
Eles apontam a existência de terceirizado designado na fiscalização de lotes de concessão, em pedido de projetos e estudos de obras, em grupo de discussão de termo aditivo, como destinatário de pleito de reequilíbrio contratual de concessionária e como representante em processos judiciais e em negociações com a Promotoria.
A reportagem apurou que um promotor que participou de ao menos uma dessas reuniões para tratar de intervenções em rodovias desconhecia estar negociando com um terceirizado -já que ele havia sido designado pela Artesp como representante da Diretoria de Investimentos.
Relatórios do TCE (Tribunal de Contas do Estado) paulista produzidos pela equipe de fiscalização também apontaram suspeitas de irregularidade no modelo adotado pela Artesp.
A legislação proíbe a atuação de terceirizados em atividade-fim da administração pública. Os relatos ao MP-SP apontam ainda a atuação de ao menos um deles em regulação de matéria aeroportuária sem que haja vínculo específico para isso. O órgão estadual e as empresas envolvidas negam irregularidades.
A gestão Tarcísio planeja ampliar a atuação da Artesp para que ela também assuma a regulação e a fiscalização do transporte metroferroviário e de ônibus intermunicipais da EMTU. A agência esteve nos últimos anos sob influência de Milton Leite (União Brasil), presidente da Câmara Municipal de São Paulo.
As terceirizações são uma bandeira política de Tarcísio, ex-ministro de Jair Bolsonaro (PL) e cotado para a disputa presidencial de 2026.
Em junho, ele publicou um decreto autorizando uma parceria público-privada para terceirizar serviços de manutenção de 33 novas escolas estaduais. No caso da privatização da Sabesp, como revelou a Folha de S.Paulo, a presidente do conselho de administração ocupava, até dezembro de 2023, um cargo no conselho da Equatorial, que foi a única interessada em virar acionista de referência da companhia.
Na Artesp, o consórcio EAG-SP (formado pela Sondotécnica e CAA Companhia) e Planservi estão entre as contratadas que fornecem terceirizados à agência para lidar com as concessões de rodovias.
A Sondotécnica apresenta, em sua lista de clientes particulares, empresas como Arteris e grupo CCR, responsável por concessões como a da AutoBAn, ViaOeste, RodoAnel e Renovias, que são reguladas pela Artesp.
Representação entregue ao Ministério Público aponta que, em nome da agência pública, uma funcionária cedida pelo consórcio da Sondotécnica solicitou em 2024 estudos e projetos para obras da AutoBAn e foi destinatária de pleito de reequilíbrio contratual enviado pelo grupo CCR.
Também já foi indicada pelo diretor de investimentos, João Luiz Lopes, para representar os interesses da Artesp em audiência com a Promotoria de Justiça de Campinas sobre a implantação de passarela em trecho da Renovias.
Encarregada de também ceder equipes à Artesp, a Planservi exalta na sua lista de clientes concessionárias como AutoBAn, ViaOeste e Arteris, todas com contratos regulados pela agência.
Embora não esteja listada nesse mesmo pacote entre as contratadas da Artesp, a Lancia Engenharia, que divulga a Arteris entre seus clientes, apresentava em seu site até as últimas semanas um diretor técnico que, ao mesmo tempo, era indicado como representante da agência estadual para lidar com concessionárias como a Arteris.
No caso do consórcio EAG-SP e da Planservi, os primeiros contratos foram firmados ainda no governo anterior e acabaram renovados na gestão Tarcísio, quando, segundo funcionários ouvidos pela Folha, de S.Paulo houve empoderamento das equipes vinculadas às empresas privadas.
Em maio de 2024, uma deliberação do Conselho Diretor da Artesp prorrogou a vigência dos contratos até agosto de 2025, atualizando os valores para R$ 25,25 milhões e R$ 25,19 milhões, respectivamente.
Professor da USP e do IDP, árbitro, advogado e consultor em direito público, Gustavo Justino de Oliveira afirma que agências como a Artesp exercem poder de polícia e que a jurisprudência é clara em não admitir a delegação do poder normativo, fiscalizatório e sancionador:
"A Constituição Federal atribuiu aos servidores públicos de tais entidades as prerrogativas de independência e estabilidade, a fim de proteger as agências e a própria atividade regulatória, visto que os servidores estáveis irão ter a independência do próprio cargo público em aplicação de sanções aos players do mercado", diz.
Justino de Oliveira cita "conflito de interesses imanentes" como um fator agravante e avalia ser necessário a existência de uma norma para disciplinar esse tema.
O advogado Francisco Zardo, sócio e coordenador do Núcleo de Direito Administrativo do Dotti Advogados e doutorando pela Faculdade de Direito da USP, reforça a interpretação de que só agentes públicos, livres de pressões, têm poder de fiscalizar condutas, mas ressalva a brecha para "atividades de apoio".
"O poder de representação institucional não pode ser realizado por terceirizados. Precisa ser por quem detém cargos."
Em relação à possibilidade de conflito de interesses, Zardo afirma que "não se pode atuar nas duas pontas" e considera que setores de compliance e integridade das empresas precisariam analisar os casos individuais.
Vera Caspari Monteiro, do mestrado profissional da FGV Direito SP, avalia não haver impedimento na legislação para a agência contar com auxílio de terceiros para atividades materiais relacionadas à fiscalização e ao acompanhamento dos contratos de concessão.
"Cabe à Artesp ter boa governança sobre esses contratos", afirma Vera, para quem, se a contratação das empresas não trouxer restrições, "não há vedação genérica" em razão de elas terem concessionárias como clientes.
OUTRO LADO: AGÊNCIA E EMPRESAS NEGAM CONFLITO DE INTERESSE E FALAM EM RESPALDO LEGAL
A Artesp nega a existência de conflitos de interesse e diz que a finalidade dos contratos "é a sistematização de informações e não a tomada de decisões em relação às concessionárias, restritas exclusivamente aos empregados públicos da agência".
Diz que atua em consonância ao estabelecido pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho), súmula 331, e só realiza a contratação de serviços de atividade-meio.
Apesar da indicação de terceirizados como representantes no Ministério Público e em processos judiciais, afirma que eles não são autorizados a se manifestar em nome da agência. "Apenas os diretores e empregados públicos (comissionados e concursados) possuem competência para representar a agência em reuniões/audiências com os órgãos de controle, não sendo vedada a participação de quadros de apoio."
A Artesp, que diz ter hoje 195 servidores, cita projeto do governo enviado à Assembleia Legislativa para "reformular e modernizar a estrutura das agências reguladoras" e "fortalecer a governança". Diz que a medida prevê concurso público para "recompor o quadro da agência, ampliando a eficiência administrativa".
O consórcio da Sondotécnica afirmou que os contratos estão disponíveis no Portal de Transparência e que mais informações podem ser obtidas junto à Artesp. A Planservi repetiu essa posição e disse que "não há o que se falar em conflitos de interesses".
O Grupo CCR afirmou que seu relacionamento com a Artesp "está respaldado pela legislação vigente, pelas regras estabelecidas pelos órgãos fiscalizadores e por um sólido programa de interno de integridade", com "normas rígidas para regular as interações com agentes públicos, conflitos de interesses e contratações de fornecedores estratégicos, além de prever controles internos e auditorias independentes".
A empresa disse que não tem interferência nas decisões da Artesp e que seus contratos atuais com a Sondotécnica envolvem rodovias federais.
A Arteris disse seguir "rígidos procedimentos de contratação de fornecedores, em total cumprimento à política de compliance do grupo" e citou ter recebido o Selo Pró-Ética nos últimos quatro anos. A Lancia não respondeu.
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Relatórios do TCE (Tribunal de Contas do Estado) paulista produzidos pela equipe de fiscalização também apontaram suspeitas de irregularidade no modelo adotado pela Artesp.
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Em junho, ele publicou um decreto autorizando uma parceria público-privada para terceirizar serviços de manutenção de 33 novas escolas estaduais. No caso da privatização da Sabesp, como revelou a Folha de S.Paulo, a presidente do conselho de administração ocupava, até dezembro de 2023, um cargo no conselho da Equatorial, que foi a única interessada em virar acionista de referência da companhia.
Na Artesp, o consórcio EAG-SP (formado pela Sondotécnica e CAA Companhia) e Planservi estão entre as contratadas que fornecem terceirizados à agência para lidar com as concessões de rodovias.
A Sondotécnica apresenta, em sua lista de clientes particulares, empresas como Arteris e grupo CCR, responsável por concessões como a da AutoBAn, ViaOeste, RodoAnel e Renovias, que são reguladas pela Artesp.
Representação entregue ao Ministério Público aponta que, em nome da agência pública, uma funcionária cedida pelo consórcio da Sondotécnica solicitou em 2024 estudos e projetos para obras da AutoBAn e foi destinatária de pleito de reequilíbrio contratual enviado pelo grupo CCR.
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Encarregada de também ceder equipes à Artesp, a Planservi exalta na sua lista de clientes concessionárias como AutoBAn, ViaOeste e Arteris, todas com contratos regulados pela agência.
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No caso do consórcio EAG-SP e da Planservi, os primeiros contratos foram firmados ainda no governo anterior e acabaram renovados na gestão Tarcísio, quando, segundo funcionários ouvidos pela Folha, de S.Paulo houve empoderamento das equipes vinculadas às empresas privadas.
Em maio de 2024, uma deliberação do Conselho Diretor da Artesp prorrogou a vigência dos contratos até agosto de 2025, atualizando os valores para R$ 25,25 milhões e R$ 25,19 milhões, respectivamente.
Professor da USP e do IDP, árbitro, advogado e consultor em direito público, Gustavo Justino de Oliveira afirma que agências como a Artesp exercem poder de polícia e que a jurisprudência é clara em não admitir a delegação do poder normativo, fiscalizatório e sancionador:
"A Constituição Federal atribuiu aos servidores públicos de tais entidades as prerrogativas de independência e estabilidade, a fim de proteger as agências e a própria atividade regulatória, visto que os servidores estáveis irão ter a independência do próprio cargo público em aplicação de sanções aos players do mercado", diz.
Justino de Oliveira cita "conflito de interesses imanentes" como um fator agravante e avalia ser necessário a existência de uma norma para disciplinar esse tema.
O advogado Francisco Zardo, sócio e coordenador do Núcleo de Direito Administrativo do Dotti Advogados e doutorando pela Faculdade de Direito da USP, reforça a interpretação de que só agentes públicos, livres de pressões, têm poder de fiscalizar condutas, mas ressalva a brecha para "atividades de apoio".
"O poder de representação institucional não pode ser realizado por terceirizados. Precisa ser por quem detém cargos."
Em relação à possibilidade de conflito de interesses, Zardo afirma que "não se pode atuar nas duas pontas" e considera que setores de compliance e integridade das empresas precisariam analisar os casos individuais.
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A Artesp nega a existência de conflitos de interesse e diz que a finalidade dos contratos "é a sistematização de informações e não a tomada de decisões em relação às concessionárias, restritas exclusivamente aos empregados públicos da agência".
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