ELEIÇÕES EM SP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente Lula (PT) disse durante a convenção para oficializar a candidatura do nome apoiado por ele para a Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL), que ele "já pode se considerar o futuro prefeito" e que basta comparar os aliados dele com as demais opções da eleição.

A chapa com a ex-prefeita Marta Suplicy (PT) como vice foi formalizada neste sábado (20/7), no Expo Center Norte, centro de convenções na zona norte da capital.

Lula afirmou ainda que Boulos "é a única possibilidade dessas eleições" para garantir a dignidade e o respeito para "o povo de São Paulo, sobretudo da periferia".

"Você pode ter certeza que você conta com o meu apoio em qualquer momento. Não se deixe levar pelas mentiras, não aceite provocações. [...] Você transmite a verdade não apenas pelas palavras, ela está no brilho dos seus olhos. Eu estou convencido de que você está predestinado a ser o futuro prefeito de São Paulo", disse o presidente ao aliado.

Lula disse que é preciso evidenciar "quem está com os outros candidatos" e que, com a vitória de Boulos, será possível dize que os fasistas nunca mais voltarão a governar o país.

O evento teve a participação de seis ministros do governo, entre eles o ex-prefeito Fernando Haddad (PT), hoje à frente da Fazenda. Além dele, discursaram as ex-prefeitas Luiza Erundina (PSOL) e Marta. Boulos quer explorar o legado das três administrações do PT como mote de campanha, para sinalizar a intenção de dar continuidade a medidas das gestões do chamado campo progressista.

As falas dos representantes do PSOL, PT e de partidos aliados reforçaram o enfrentamento ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) e a seu principal apoiador, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Boulos, que é deputado federal, disse que está sentindo "cheirinho de vitória", exaltou os três ex-prefeitos do PT e disse que, a despeito de rumores, está mais afinado com Marta do que a dupla Chitãozinho & Xororó. O candidato agradeceu a Lula por ter livrado o país "do atraso" e afirmou se orgulhar do apoio dele.

"Agora o nosso desafio é completar o serviço e devolver a esperança para São Paulo", afirmou Boulos, em alusão à derrota de Bolsonaro por Lula em 2022.

O deputado disse que "São Paulo precisa de um choque de humanidade" e lembrou sua trajetória no MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).

"Eu nunca aceitei injustiça", disse, dirigindo-se a Lula para falar que, como o presidente que Todo mundo que resolve lutar por justiça sofre mentiras e é atacado. "Eu quero governar São Paulo para não deixar ninguém pra trás, para derrubar os muros que separam os jardins da periferia."

Boulos disse que o desafio na eleição agora será mostrar "que São Paulo precisa de mudança" e afirmou que frustrará adversários que esperam que ele faça uma campanha discutindo ideologia ou entrará no "debate rebaixado pelas mentiras que eles inventam".

Marta, que até o fim de 2023 era secretária da gestão Nunes, na pasta de Relações Internacionais, disse que todos os demais candidatos representam "o retrocesso". Ela caracterizou a campanha de Boulos como uma frente democrática. "Esse é o meu lado na política", disse ela, que retornou ao PT para compor a candidatura.

A coligação encabeçada por PSOL e PT, batizada como "Amor por São Paulo", engloba oito partidos, todos do chamado campo progressista --a exceção é o PMB (Partido da Mulher Brasileira), que refuta rótulos à esquerda ou à direita. O último a entrar foi o PCB (Partido Comunista Brasileiro).

Antes do evento com Boulos, Lula esteve na convenção em São Bernardo do Campo, cidade considerada berço do PT, para o lançamento da candidatura de Luiz Fernando (PT) a prefeito, com William Dib (PSB) de vice. O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) também compareceu, mas se ausentou do encontro na capital paulista porque sua candidata na corrida paulistana é a deputada Tabata Amaral (PSB).

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, repetiu a argumentação do discurso em São Bernardo, conclamando os correligionários a evitar o avanço da extrema direita representada por Bolsonaro e que, nas palavras dela, "não pensa no povo" como fazem os governos do chamado campo progressista.

"A eleição de São Paulo é importante não só para São Paulo, mas também para o Brasil", disse Gleisi, reiterando a estratégia do PT de que uma vitória na cidade representará uma derrota sobre o campo liderado por Bolsonaro.

Boulos não é o candidato do PT, mas é quase como se fosse --e é essa a mensagem que Lula busca emplacar ao se engajar de maneira inédita na eleição paulistana, na primeira disputa pelo comando da capital desde a redemocratização, em 1985, que não tem o PT na cabeça de uma das chapas.

A convenção para lançar Boulos e Marta sela um projeto de Lula para marcar posição na maior cidade do país, que teve início antes mesmo de seu retorno ao Planalto, e reforça seu enfrentamento contra Bolsonaro, apoiador de Nunes.

Depois de debelar rebeliões no PT em virtude da inédita perda de protagonismo na cidade em quase 40 anos, Lula entrou em cena de novo para escolher quem seria o indicado do PT para a vice, conforme previa o acordo com o PSOL. Desfalcado de nomes competitivos, o partido era um deserto de opções.

O presidente adotou o pragmatismo e pôs em marcha talvez a mais surpreendente manobra política desta eleição até o momento. Primeiro ele convenceu seu entorno a repatriar Marta ao PT --hipótese antecipada pela Folha em novembro--, passando uma borracha nas rusgas da ex-prefeita com a legenda que ela deixara em 2015. Depois era preciso tirá-la do núcleo duro do maior adversário.

Marta topou a guinada e, em janeiro, deixou a atual gestão da prefeitura e o grupo de Nunes para voltar ao partido do qual se tornara crítica e que a tratava como persona non grata, sobretudo pelo voto favorável da então senadora pelo MDB ao impeachment de Dilma Rousseff (PT).

Boulos, igualmente, teve que fazer concessões para se adaptar ao figurino de um candidato mais próximo do sistema. Começou um trabalho para suavizar a imagem e o tom, num alinhamento com o estilo conciliador de Lula que levanta queixas no PSOL, por ora restritas aos bastidores.

O deputado acomodou Marta na vice --que já foi chamada de "golpista" na esquerda pelo voto contra Dilma-- e hoje conta na equipe que formula seu programa de governo com um ex-comandante da Rota (batalhão de elite da PM conhecido pelo histórico de letalidade e truculência). Boulos diz que ainda é o mesmo, mas quer aparentar mais amadurecido, calibrando a verve combativa que o popularizou entre os pares e lhe rendeu, dos inimigos, as pechas de invasor e radical.

O cenário está dado para se desenrolar o que representantes dos dois lados chamam de terceiro turno das eleições de 2022. Com Lula e Bolsonaro insuflando o repeteco da polarização, políticos de esquerda reconhecem ser um risco tratar o resultado de 2024 como prenúncio da disputa nacional de 2026, mas mantêm a aposta de que a rejeição ao ex-presidente como padrinho, no patamar de 65%, falará mais alto.

Boulos, que chegou a liderar as pesquisas de intenção de voto no início da fase pré-eleitoral, viu Nunes se aproximar e hoje está empatado tecnicamente com ele na primeira posição. No levantamento mais recente do Datafolha, neste mês, o aspirante à reeleição marcou 24%, e o deputado, 23%. A margem de erro de três pontos para mais ou menos.