O comportamento de Bolsonaro frente ao coronavírus pode ser indefensável, até criminoso. Mas isso não significa que os seus antagonistas na gestão da crise, os governadores e o Congresso, agem de modo menos irresponsável. De fato, se houvesse uma competição de insensatez na classe governante, com avaliação isenta, seria difícil apontar um ganhador no país, embora a maioria dos brasileiros já tenha opinião formada sobre a vitória disparada do presidente.

A resposta do Congresso, sob a liderança de Rodrigo Maia, foi triplicar o valor do coronavoucher de Bolsonaro e criar um novo benefício para mães, entre outras bondades. Nada de reduzir custos, despesas, benesses e privilégios. Maia até falou em cortar salário de servidores, mas logo recuou.

Se fosse mais responsável que Bolsonaro, o parlamento faria uma operação casada entre receita e despesa. Aumentaria gastos com saúde e proteção aos vulneráveis e, simultaneamente, cortaria gastos com altos salários e mordomias no setor público e ainda criaria impostos sobre lucros e fortunas para contrabalançar as contas e evitar um colapso do Estado no futuro.

E o que dizer de Zema? O governo mineiro terá a despesa ampliada  neste ano em R$ 1,1 bilhão com aumento salarial para a polícia. O gasto extra com a categoria, uma das mais favorecidas no funcionalismo, é mais que o dobro da verba destinada às ações de combate ao coronavirus no estado: R$ 500 milhões. Se fosse responsável, o governador inverteria a sua escala de prioridades.

A irresponsabilidade está se alastrando pelos governos que nem vírus. A crise virou palanque para todos os políticos. Medidas e ações vêm sendo propostas aos borbotões; são tantas que deixam tonto o cidadão. Há corrida para entregar benefícios com verbas públicas: auxílio em dinheiro, isenção de tarifas, moratórias, crédito barato. Vale tudo contra a epidemia.

Mas, por que agir com responsabilidade e planejar o futuro se a palava de ordem é gastar a rodo para “salvar vidas”? O novo consenso entre os políticos e seus assessores economistas é que a resposta à crise passa por torrar dinheiro público como se não houvesse amanhã. Depois a gente resolve como tapar o buraco.

O problema é que sempre existirá um amanhã. A irresponsabilidade e falta de planejamento de hoje será cobrada daqui a alguns meses na forma de arrocho indescritível, que poderá prolongar a recessão e condenar milhões à miséria. Mas, justificados pelo coronavírus, os governantes resolveram ligar o botão do foda-se.

O caminho que o Brasil está tomando pode diminuir o número de vítimas da Covid-19, sobretudo nas classes média e alta que se adaptam melhor às medidas de quarentena. Mas irá aumentar o número de mortes associadas à fome e à pobreza, que vão disparar se não houver mudança de rumos. E redução nas desigualdades.

O diabo é que a mídia e os políticos são influenciados pelos setores médios da sociedade. E esses não temem uma explosão da miséria no país. Pensam que isso não os ameaça tanto quanto a epidemia. Afinal, pobreza e fome não são contagiosas, convive-se com elas no Brasil há séculos.

A forma temerária com que o Congresso, Zema e outros vêm lidando com o coronavírus pode ser tão danosa como a teimosia de Bolsonaro em reconhecer a gravidade da “gripezinha”. A irresponsabilidade e o elitismo nivelam todos por baixo.