Aliados políticos e servidores da Ministério da Saúde descartam a saída imediata do ministro Luiz Henrique Mandetta da pasta e pressionam para que ele não aceite as indicações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre as diretrizes no combate ao coronavírus.


Em meio às declarações do presidente sobre a dimensão da pandemia, auxiliares próximos de Mandetta afirmaram à reportagem que, por ora, ele não sai do cargo. E se pedir demissão, a equipe de assessores tem dito nos bastidores que também deixa o governo.


Além do apoio interno, os secretários estaduais de Saúde endossaram cartas de apoio público ao ministro reforçando seu papel central no combate à pandemia.


A possibilidade de saída passou a ser aventada após Bolsonaro, em pronunciamento nacional nesta terça (24), fazer críticas ao que chama de clima de "histeria", comparar a doença a uma "gripezinha" e defender o fim do "confinamento em massa".


Nesta quarta (25), Bolsonaro defendeu uma espécie de isolamento parcial, somente para o grupo de risco, ao contrário do discurso de Mandetta até agora.


Diante deste cenário, o diretor-presidente substituto da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, voltou a ser ventilado no Planalto como um possível nome para o cargo.


O jornal Folha de S.Paulo publicou semana passada que Torres adotou uma postura moderada frente ao avanço do coronavírus e se tornou um contraponto ouvido pelo presidente às posições de Madetta.


Torres esteve ao lado do presidente no dia 15 quando Bolsonaro ignorou orientações do Ministério da Saúde e participou dos protestos pró-governo sem demonstrar preocupação com o risco de transmissão do vírus da Covid-19.


Outro nome que passou a circular na crise foi do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que até o mês passada comandava o Ministério da Cidadania.


Terra tem adotado forte defesa do presidente nas redes sociais e defendido o isolamento vertical –só para grupos de riscos e pessoas com mais de 60 anos. O ex-ministro é constantemente citado pelos filhos do presidente nas redes sociais.


As declarações de Bolsonaro em rede nacional geraram incômodo em membros do ministério. Atualmente, medidas de distanciamento social têm sido recomendadas pela pasta –que deu aval em portaria a ações de home-office e revezamento de turno dos próprios servidores para reduzir a transmissão.


Em contrapartida, há uma avaliação de que as críticas a paralisação, embora fora do tom, não estão totalmente distantes de declarações recentes do ministro. Na terça (24), Mandetta expressou preocupação ao que chama de lockdown feito sem organização.


"Esse travamento absoluto do país para a saúde é péssimo. Eu continuo precisando de pré-natal. Tem médico fechando consultório. Daqui a pouco, eu estou lá cuidando de um vírus e cadê o meu pré-natal? Cadê o cara que está fazendo a quimioterapia? Cadê o pessoal que está precisando fazer o diagnóstico? Cadê as clínicas de ultrassom?", afirmou ao deixar o Palácio do Planalto. 
"Acho que os governadores já estão vendo que, em alguns casos, aceleraram, passaram do ponto."


Ao mesmo tempo em que faz críticas a uma paralisação exagerada, o ministro tem mantido as orientações para que a população adote medidas de distanciamento nesse período e evite aglomerações.


Também já chegou a citar possibilidade de colapso no sistema de saúde devido ao novo coronavírus –o que gerou críticas de Bolsonaro.


Familiares e pessoas próximas a Mandetta têm falado abertamente para o ministro não ceder às pressões do presidente Jair Bolsonaro e manter as recomendações técnicas que a pasta tem adotado no combate ao Covid-19.


"Mandetta, eu o conheço há mais de 40 anos. Permita-me um conselho de quem tem seu sangue nas veias: a dignidade de um homem está acima de cargos. Não fuja do juramento que fez na sua formatura. Fique com a ciência. Se isto lhe custar o ministério, paciência. Sangue não vira água!", afirmou o deputado Fábio Trad (PSD-MS).


Trad é primo do ministro. Seu irmão, o senador Nelsinho Trad (PSD-MS), foi um dos membros da comitiva do presidente Jair Bolsonaro (Sem partido) a testar positivo para o coronavírus no início da crise.


A cúpula do DEM, partido de Mandetta, mandou mensagem de apoio ao ministro, afastado das questões partidárias desde que a crise do Covid-19 se iniciou.


Mandetta também recebeu apoio de entidades de saúde e da classe médica, inclusive de alas que apoiaram Bolsonaro nas eleições.


Em nota divulgada após o pronunciamento de Bolsonaro, a Associação Médica Brasileira afirmou que a pasta tem atuado de "forma precisa e responsável" e que o "respeito com o qual o ministério vem tratando os médicos e demais profissionais de saúde, bem como o empenho para resolver questões relevantes à classe encoraja ainda mais a categoria para avançar na linha de frente e cumprir seu papel."


A associação também evitou comentar de forma direta as declarações do presidente, mas disse que "constitui erro capital, nas crises, sustentar opiniões ou posições que perderam a validade em decorrência da evolução dos fatos".