'MÁFIA DO REBOQUE'

Um acidente de trânsito no Centro de Belo Horizonte virou motivo de indignação para uma servidora pública no início da tarde desta quinta-feira (1º/5), feriado do Dia do Trabalhador. Após ser vítima de uma batida violenta, ela teve o carro apreendido pela Polícia Militar (PM) mesmo depois de quitar, na hora, o atraso do pagamento do IPVA no sistema, um procedimento que, segundo a legislação mineira em vigor desde janeiro, deveria ter evitado o reboque.

O caso aconteceu na esquina das ruas Gonçalves Dias e Santa Catarina. A analista de sistemas Paula Pastor havia acabado de sofrer um acidente envolvendo outro motorista que não respeitou a sinalização e avançou em alta velocidade. “Estava subindo a Gonçalves Dias, quando o outro veículo veio muito rápido, bateu forte e ainda saiu arrastando meu carro”, relata. Ainda abalada com a colisão, ela foi surpreendida com a informação de que seu carro seria apreendido por causa de um débito pendente.

Ciente da nova Lei nº 25.070/2024, sancionada em dezembro do ano passado, Paula insistiu que tinha o direito de quitar o débito na hora. O decreto, de autoria do deputado estadual Ricardo Campos (PT), garante ao motorista a possibilidade de regularizar pendências como multas e taxas de licenciamento atrasadas durante a própria abordagem, por meio de pagamento eletrônico. Isso evitaria a remoção do veículo, desde que não houvesse outras irregularidades graves.

Segundo a servidora, os próprios policiais que atenderam a ocorrência indicaram o procedimento correto. “Me orientaram onde acessar o sistema, fiz o pagamento eletrônico, apresentei o recibo”, conta. Porém, a remoção do veículo foi mantida sob a alegação de um regimento interno da corporação. “Mas isso não pode se sobrepor à lei estadual”, pontua.

Ela contestou a decisão e chegou a acionar o próprio deputado autor da lei, que conversou com o comandante da operação. Ainda assim, nada foi revertido. A servidora relatou que a abordagem teve um tom intimidador. “Eu já estava fragilizada por um acidente, que não fui eu quem provocou. Foi uma circunstância de muita vulnerabilidade”, disse ela, que estava sozinha no momento do acidente.

O que mais causou indignação, segundo ela, foi o fato de todos os policiais envolvidos demonstrarem conhecimento sobre a legislação, mas ainda assim insistirem no reboque. Paula avalia que o episódio revela um problema maior, que vai além do seu caso pessoal. Para ela, a situação escancara um desrespeito sistemático à norma, refletindo o que o próprio deputado Ricardo Campos, autor da norma, vem denunciando como 'máfia do reboque', um esquema recorrente de remoção indevida de veículos.

Segundo o Detran-MG, os valores do reboque e da estadia no pátio variam de acordo com o tipo e peso do veículo. Carros de até 3.500kg pagam R$ 304,21 pela remoção e R$ 55,31 por dia de estadia. Motos pagam R$ 193,59 pelo reboque e R$ 33,19 por diária. Para veículos mais pesados, o valor do reboque sobe para R$ 403,76, e a diária, para R$ 66,37.

Paula afirma que o episódio, além de “injusto”, revela um problema mais amplo. “Existe uma legislação e, por acaso, era um cidadão que conhecia, cumpriu as obrigações que foram passadas no local, e mesmo assim, a ordem foi rebocar. Imagina quem está na roça, sem acesso à informação, e passa por isso. Eu só consegui reagir porque conheço a legislação e trabalho com comunicação. Isso foi revoltante", desabafa.