Cria da televisão, onde ingressou aos 4 anos, Bruna Marquezine faz sua estreia como protagonista de cinema em Vou Nadar Até Você, que estreou na competição do 47º Festival de Gramado. No filme dirigido por Klaus Mitteldorf, a atriz de 24 anos interpreta Ophelia, fotógrafa de Santos que decide ir ao encontro do pai (interpretado pelo alemão Peter Ketnath) que a abandonou ainda criança, ao descobrir que este vive em Ubatuba, também no litoral paulista.

A personagem faz o percurso entre Santos e Ubatuba a nado e a pé, pedindo carona, dormindo em hotéis baratos, e recorrendo à ajuda de inúmeros desconhecidos ao longo do caminho - um deles é o misterioso Smutter (Fernando Alves Pinto), que mantém estranha relação com o pai da moça.

As circunstâncias da viagem de Ophelia rumo às suas raízes biológicas inspira algumas sequências de nus. "Isso nunca foi uma preocupação para mim. Até porque o foco era a minha arte", disse a atriz.


UOL - Você já disse nas redes sociais que fazer cinema era um antigo desejo. Por que essa estreia demorou tanto?
Bruna Marquezine -
 Fiz muita televisão, emendava um projeto no outro. Admiro atores que conseguem conciliar dois projetos ao mesmo tempo. Mas tenho dificuldade em conciliar até mesmo um projeto com minha vida pessoal [risos]. Até o momento em que a Ophelia surgiu para mim, nada tinha me encantado antes, nenhuma história, equipe ou projeto. Ela surgiu em um momento em que eu tive tempo para me dedicar completamente a ela.

Já havia recebido convites para fazer cinema como protagonista?
A verdade é que não.

Acha que os diretores e produtores sentiam-se intimidados pela figura da Bruna Marquezine?
Não quero pesar muito nessa crítica, mas acho que no mundo das artes as pessoas às vezes se colocam em caixas. Muitas pessoas podem ter me visto como atriz de televisão, apenas. E não entendo muito bem isso, porque não vejo a TV com menos méritos.

 

Bruna Marquezine em cena do filme Vou Nadar Até Você - Renan Hackradt Rego/Divulgação
 
Bruna Marquezine em cena do filme Vou Nadar Até Você
Imagem: Renan Hackradt Rego/Divulgação


O que você gosta na Ophelia?
Gosto da história, por ela ser um personagem único, a ideia de ela ter um universo que não é realista, mas que faz com que as pessoas se identifiquem. Admiro muito a força e a determinação da personagem, e ao mesmo tempo a sutileza e delicadeza. A Ophelia é uma menina simples, mas com sentimentos muito complexos, com força potente.

É uma personagem com poucos diálogos e muita presença física. Foi de alguma forma um desafio?
Como na vida, às vezes, o excesso de palavras atrapalha. Às vezes, ajuda, é até necessária. Não sinto falta de mais diálogos nesse filme, eles são muito sutis, mas contam a história bem. Exprimem uma forma de autoconhecimento, de reflexão, o que também aconteceu comigo. A gente a entendia como uma pessoa que tinha dificuldades de se relacionar com o mundo. Não tinha facilidade de verbalizar, mas tinha uma sensibilidade muito grande.

Esse filme representa uma nova frente de trabalho para você?
Assim espero. Fui muito feliz fazendo cinema. Quero fazer muito mais. É um formato que me agrada muito. Fiz muita novela, que é um formato mais desgastante e pouco satisfatório, artisticamente falando. Porque é muito tempo no ar, envolve um volume muito grande de cenas, muita história para contar. É muito prazeroso, artisticamente, fazer uma obra em que se conhece todo o arco da personagem. Isso te permite aprofundar nela.

 

Que tipo de espectadora de cinema você é?
Gosto de dramas. Amo filmes que contam históricas verídicas. E amo filmes artísticos, mas contemplativos, experiências estéticas e visuais. Gosto de filmes que de alguma forma contem histórias, represente grupos e pessoas de alguma forma. O cinema tem esse papel de levantar bandeiras, discussões, dar voz a casos, e também ser entretenimento. Não gosto de entretenimento pelo entretenimento mas, às vezes, esse tipo de conteúdo é necessário para fugir do dia a dia.

Você se identifica muito com figuras feministas. Espera um dia poder fazer um filme sobre alguma delas?
Claro. É natural que eu tenha desejo de fazer filmes que estão de acordo com o meu discurso, com os meus valores. Ficarei imensamente feliz de fazer o que amo e podendo abordar uma assunto que me interessa e me representa. A palavra feminismo quase virou um problema, tem uma conotação quase negativa quando, na verdade, significa igualdade. Adoraria fazer um filme inclusive que pudesse abordar isso e recuperar o significado real da palavra, que é muito mais leve, apesar da importância.

Que outros temas te interessam?
Gostaria de fazer um filme sobre refugiados, que é uma causa que me impactou há alguns anos. Hoje sou embaixadora de uma organização que os apoia [a ONG IKMR]. Não existe mundo melhor do que uma arte com causas que me movem e me interessam.