(FOLHAPRESS) - A maioria do Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central vê espaço para início de "processo parcimonioso" de corte de juros em agosto se a inflação continuar caindo, conforme ata publicada nesta terça-feira (27).

O colegiado, no entanto, alerta que a redução da taxa básica (Selic) exige confiança e que uma flexibilização prematura pode reacelerar a inflação do país.

Na sinalização de quais serão os próximos passos, houve divergência no colegiado do BC. Para um grupo minoritário mais cauteloso, ainda há dúvida sobre o impacto do aperto monetário implementado. Esses membros avaliam que é necessário observar uma melhora na percepção das expectativas de inflação mais longas e acumular mais evidências de queda de preços.

Na última quarta-feira (21), o Copom manteve, em decisão unânime, a Selic no patamar de 13,75% ao ano e deixou seus próximos passos condicionados aos dados, em comunicado classificado por analistas como mais conservador.

A decisão foi recebida negativamente pela equipe econômica, que interpretou o comunicado como um boicote ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em meio à cobrança de corte de juros para estimular a atividade econômica.

Já a ata desta terça foi vista de forma mais positiva pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda). Segundo ele, há um consenso em relação à trajetória da Selic. "Ficou claro que nós estamos no caminho certo", disse.

Para o titular da pasta econômica, a sinalização feita pelo BC em reconhecimento aos efeitos dos juros elevados e aos esforços fiscais do governo "é o mais importante".

Na ata desta terça, o Copom afirma que o Brasil encontra-se em um segundo estágio no processo de desinflação, em que a velocidade da queda de preços é menor e que os núcleos de inflação (medida que busca minimizar a influência de itens de maior volatilidade) se reduzem também de forma mais lenta.

O BC pondera que, embora as expectativas de inflação tenham apresentado "algum recuo", elas continuam distantes em relação às metas definidas pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), "em parte em função do questionamento sobre uma possível alteração das metas de inflação futuras".

O colegiado, formado por Haddad, pela ministra do Planejamento (Simone Tebet) e pelo presidente do BC (Roberto Campos Neto), se reúne nesta quinta-feira (29) em um encontro que pode mudar os rumos da política monetária no país.

Atualmente, as metas são 3,25% neste ano e 3% em 2024 e 2025, com intervalos de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.

O Copom voltou a dizer que o comportamento das expectativas é um aspecto fundamental na dinâmica da inflação, visto que serve de guia para a definição de reajustes de preços e salários.

"Com a elevação de expectativas, há uma maior pressão para elevação de preços no período corrente e o processo inflacionário é alimentado por essas expectativas", diz.

Quanto ao fiscal, o colegiado do BC vê uma redução significativa da incerteza após a apresentação e a tramitação do arcabouço fiscal. No entanto, diz que permanecem desafios para o cumprimento das metas estipuladas para o resultado primário.

Neste trecho, a autoridade monetária faz um aceno ao governo ao citar que a discussão dos membros do comitê enfatizou "o comprometimento e a apresentação de medidas para a consecução de tais resultados".

O Copom, porém, repetiu o alerta de que a conjuntura demanda "cautela e parcimônia" e requer "paciência e serenidade" na condução da política de juros.

"O Comitê unanimemente avalia que flexibilizações do grau de aperto monetário exigem confiança na trajetória do processo de desinflação, uma vez que flexibilizações prematuras podem ensejar reacelerações do processo inflacionário e, consequentemente, levar a uma reversão do próprio processo de relaxamento monetário", diz o BC no documento.

A ata reafirma que os próximos movimentos dependerão da evolução da dinâmica dos preços, das expectativas de inflação, do indicador que mede a diferença entre o crescimento potencial da economia e o efetivo (chamado de hiato do produto) e do balanço de riscos.

Na análise da atividade econômica no Brasil, a autoridade monetária diz que o conjunto de indicadores recentes sugere um cenário de desaceleração gradual. Antevê que, passado o maior crescimento da agropecuária no primeiro trimestre, em função da sazonalidade da safra, o processo de moderação do crescimento em setores como indústria e serviços se aprofundará ao longo dos trimestres seguintes.

"O mercado de trabalho, que surpreendeu positivamente ao longo de 2022, tem apresentado certa resiliência, com aumento líquido nos postos de trabalho e relativa estabilidade na taxa de desemprego. Observou-se, entretanto, redução na taxa de participação", afirma.

No último encontro, o comitê decidiu ainda elevar a estimativa de taxa de juros real neutra -aquela que não contrai nem estimula a economia- de 4% para 4,5% ao ano.

Entre os fatores que justificam esse aumento, os membros citam uma possível elevação das taxas de juros neutras nas principais economias, a resiliência na atividade brasileira coincidente a um processo lento de desinflação.

Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisa macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs, diz em relatório que a ata do Copom trouxe uma perspectiva menos "hawkish" (menos dura).

Para ele, o Copom adotou um viés dependente de dados mais neutro. Somado ao fato de que a maioria dos conselheiros vê a possibilidade de um ponto de inflexão na reunião de agosto, isso sinalizou que, se o ambiente de inflação e o balanço de os riscos continuarem melhorando e a decisão sobre metas de inflação nesta semana não abalar o mercado, haverá uma redução nos juros. Ele prevê um corte de 0,25 ponto percentual.

Mauricio Oreng, superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander, escreveu um relatório intitulado "Afiando a faca" -em referência ao esperado corte da próxima reunião. Ele destaca que a ata deixa transparecer divergências entre os membros do Copom.

O banco revisou a projeção para a Selic ao fim de 2023, de 12,5% para 12,25%. "Seguimos antevendo um processo lento de flexibilização [...], o que significa que a economia brasileira ainda pode ter que conviver com juros de dois dígitos ao longo de todo o próximo ano", escreve.

O Itaú também alterou seus números após entender que a ata trouxe uma significativa mudança de tom em relação ao comunicado da semana passada. "O texto indica que a maioria do comitê já vê condições, com inflação mais baixa e menor desvio de expectativas em relação à meta, que lhe dariam confiança para iniciar, com parcimônia, um ciclo de flexibilização na próxima reunião", afirma em relatório o economista-chefe Mario Mesquita.

Agora, em vez de três cortes a partir de setembro (levando a taxa básica para 12,5% ao fim do ano), os analistas do banco preveem quatro cortes, levando a Selic para 12,25% ao fim do ano.