Investidores ainda podem se beneficiar do novo ciclo de alta nos preços das matérias-primas, que tem acelerado desde a metade de 2020.

Segundo analistas, apesar da valorização, as principais ações ligadas a commodities ainda estão baratas.


"Com a recuperação dos países e estímulos econômicos, há liquidez e demanda por produtos perto das máximas", diz André Querne, sócio da Rio Gestão.


Para acelerar a atividade, grandes economias implementaram medidas que podem ter efeito também a médio a longo prazo. Os Estados Unidos, com o juro baixo, grande liquidez e um pacote de infraestrutura à vista, são um dos grandes motores desse novo ciclo.


A rápida recuperação da China é outro propulsor nos preços das commodities, assim como o real desvalorizado. E, de acordo com o mercado, tais condições não devem mudar tão cedo.


"É difícil prever o futuro, mas o cenário externo não vai mudar a curto prazo. A menos que o Fed [banco central dos EUA] mude o discurso, o que não parece ser o caso", afirma Querne.

 

A recente realização nos preços tampouco assusta. Na quinta (13), os contratos de referência do minério de ferro na China chegaram a desabar até 9,5% após uma forte sequência de altas que levou os preços a máximas históricas.


Na sexta (14), os futuros de minério de ferro de referência na Bolsa de Dalian, para entrega em setembro, caíram 7,5%, para 1.173 yuans (US$ 182,22) por tonelada. O contrato caiu 4,4% na semana.


A forte desvalorização veio após representantes da indústria de ferro e aço na China chamarem a forte e rápida alta do minério de irracional e pedirem que a exploração seja ampliada e as regras dos mercados de negociação de contratos futuros sejam aprimoradas.

 

Além disso, a cidade de Tangshan, importante produtora de minério, alertou as usinas para manter a ordem do mercado. O governo local disse que investigaria comportamentos ilegais e suspenderia os negócios em usinas que teriam manipulado os preços de mercado, espalhando rumores ou armazenando produtos para fazer negócios favoráveis, já que o crescimento dos preços do aço ultrapassou o aumento dos custos.


Até as movimentações dos chineses preocupados com a disparada, os preços do minério de ferro e de aço renovavam recordes em meio a uma época de pico na demanda, preocupações com cortes de produção siderúrgica e temores com inflação que alimentaram compras especulativas.


"A Vale está trabalhando com um preço bem abaixo do que é o minério hoje, e, mesmo que a commodity caia 20%, o preço médio para a empresa é muito positivo. É uma ótima oportunidade de investimento", afirma Querne.


A mineradora é a grande aposta da Rio Gestão, que tem grande parte do portfólio alocado na companhia. Desde o começo do ano, ela salta 26,4%. O Ibovespa, principal índice acionário do país, sobe apenas 2,4%.


Com a valorização, a Vale voltou ao posto de companhia mais valiosa da América Latina, com capitalização de mercado de US$ 111 bilhões (R$ 584 bilhões), ultrapassando a argentina Mercado Livre US$ 66 bilhões (R$ 348 bilhões) .

 

"É óbvio que o minério terá uma desaceleração em 2022, fim de 2021, mas não tanto. Mesmo que haja realização nos preços das commodities, eles não voltam para um valor baixo. A Vale pode cair 10% em um mês, mas ainda é boa no médio e longo prazo", diz Querne.
Segundo ele, o baixo custo de produção da Vale e baixa dívida líquida da empresa, diante de seus múltiplos e dividendos, a deixam interessante para o investidor.


Para avaliar o preço de uma ação, investidores levam em conta diversos fatores intrínsecos a cada empresa e setor, como resultados, governança, concorrência e o cenário macroeconômico em uma análise fundamentalista, ou seja, dos fundamentos da empresa.


Um dos mecanismos mais usados é o múltiplo preço/lucro. Ele mostra quantos anos seriam necessários para o investimento em determinada ação se pagar pela distribuição anual de lucros da empresa, via dividendos, bônus ou juro sobre capital próprio.


No cálculo, divide-se o preço do papel pelo lucro projetado pelo mercado (P/L). Quanto menor o P/L, mais barato o papel.


"A gente, sim, tem dúvidas se os preços das commodities seguem batendo recorde, mas os preços das ações ainda não refletem isso. Os múltiplos estão baratos, a Bolsa está barata", afirma Jennie Li, estrategista da XP.

 

O setor de siderurgia tem um cenário parecido ao de mineração, impulsionado pela forte demanda. A XP recomenda compra para CSN, Gerdau e Metalúrgica Gerdau.


A corretora espera um aumento de 6% nas vendas de aço no Brasil neste ano em relação a 2020. O preço também deve subir, dado o dólar mais alto e a expectativa de recuperação do setor imobiliário.


"Comparando com seus pares (Usiminas e Gerdau), a CSN é de longe a mais beneficiada pela recente alta nos preços do minério de ferro, já que seu segmento de mineração representou mais de 70% do Ebitda (Lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da empresa em 2020", diz relatório da XP.


Em caso de realização no minério, por outro lado, a menos afetada seria Gerdau, já que a matéria-prima tem menos peso na sua receita do que na dos concorrentes.


FRIGORÍFICOS


A forte demanda com a recuperação das economias e o real desvalorizado também impulsionam o setor de carnes.


A Guide Investimentos recomenda compra para os papéis da JBS, que foi impactada em 2020 com o fechamento temporário de frigoríficos.
"A alta nas exportações para a China, forte demanda no Brasil e nos EUA e ainda a desvalorização do câmbio, impulsionaram a forte retomada de seus números", diz Luis Sales, analista da corretora, em relatório sobre a companhia.


Tanto a JBS como Minerva e Marfrig, que também dão recomendadas pela Guide, se beneficiam das fortes operações que têm no exterior, o que acaba compensando o aumento no custo de produção no Brasil, com a alta nos preços da arroba do boi e dos grãos, e a baixa demanda doméstica.

 

Com a força da operação americana, a Marfrig teve o seu melhor primeiro trimestre de todos em 2021. Com o avanço da vacinação contra a Covid-19 nos EUA, bares e restaurantes voltam a impulsionar a demanda.


A BRF, por outro lado, está mais exposta ao mercado brasileiro, tendo resultados piores.


Papel e celulose A demanda por papel e celulose também segue elevada, com preços em alta na China. No Brasil, as compras também se recuperam, dado o crescente uso de embalagens no ecommerce e no delivery de alimentos.


A XP projeta que os preços da celulose de fibra curta sigam em alta e terminem 2021 a US$ 530 por tonelada. Hoje, estão a US$ 452.


"O setor permanece com demanda forte e saudável devido a interrupção de fornecimento e consumo crescente da China", diz relatório da Guide, que recomenda a compra de Suzano e Klabin.


Como as commodities dependem da China, a saúde da segunda maior economia do mundo é um farol para investidores, sobretudo brasileiros.


Segundo a XP, 36% do valor de mercado do Ibovespa é baseado em empresas de commodites. No S&P 500, índice que reúne as principais empresas americanas, o peso é de 6%. No europeu Stoxx 600, 16%. No chinês CSI 300, 12%, e no japonês Nikkei 225, 8%.


"O Brasil é mais exposto a commodities, mas as incertezas macroeconômicas locais podem nos impedir de surfar essa onda", diz Jennie Li, estrategista da XP.


Como não há uma forte demanda interna, as empresas ficam ainda mais dependentes da exportação. O boom atual, porém, é diferente daquele do início dos anos 2000, já que a China não está mais no mesmo ritmo de crescimento.


"Resta saber até que ponto esse é um crescimento sustentável da economia asiática", afirma Ricardo Rocha, professor do Insper e sócio da Finted Tech School.


Para amenizar o risco de exposição a commodities, o investidor deve diversificar os papéis e os setores na carteira. Além disso, é necessário investir em outras empresas que não as de matérias-primas.


Uma boa opção para o investidor é a alocação em fundos de ações ou multimercados, que reduzem o risco por combinarem diversos ativos de modo a impulsionar ganhos. Ao analisar os materiais disponibilizados pelas gestoras, é possível encontrar fundos que tenham alocações em commodities, seguindo sempre o seu perfil de risco como investidor.