REAJUSTE

Ter um telhado para chamar de seu hoje não é só ter onde morar, mas sim a possibilidade de gerar sua própria energia elétrica a partir do sol – que responde por 90% da geração por fontes alternativas no Brasil. O restante é dividido entre Centrais de Geração Hidráulica (6%); Usinas Termelétricas por combustão fóssil ou biomassa e, com apenas 1%, a geração eólica. 

Os dados são da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), que vem discutindo a revisão da Resolução Normativa 482/2012 com o olhar dos geradores. Há sete anos, a RN regularizou a geração de energia de fontes alternativas pelos consumidores e o repasse do excedente para as concessionárias de distribuição que compensam o produtor, permitindo zerar a conta de luz ou ter uma significativa economia. 


A revisão estava prevista para 2019, mas o texto apresentado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em Consulta Pública - prorrogada de 30 de novembro para 30 de dezembro - instituiu a cobrança do uso do fio com critérios que são rechaçados pelo mercado de geração distribuída. “O setor ainda é incipiente. Estamos com 0,2% de penetração entre os consumidores e, no mundo inteiro, o índice mínimo de penetração para os cenários propostos pela Aneel, é de 5%. É cedo para mexer em qualquer segmento de remuneração do fio”, afirma o presidente da ABGD, Carlos Evangelista. 


Ele afirma que o setor não é contra a cobrança do uso do fio mas recusa a forma incluída na revisão. “A remuneração deve ser proporcional à utilização da estrutura”, completa.


Hoje, para cada kilowatt excedente injetado na rede, a concessionária de distribuição devolve outro kilowatt ao produtor. Com a nova proposta, ele receberá de volta só cerca de 34% do que gerou. 


A Aneel vinha trabalhando com cinco cenários mas, em audiência pública, em Brasília, no último dia 7, escolheu um que remunera várias componentes do fio, diminuindo a vantagem econômica para os geradores independentes. “Não faz sentido pagar um valor pela transmissão se não usamos as linhas de transmissão. Nem por perdas se mitigamos as perdas do setor”, afirma Evangelista. 


Para os empresários, as mudanças quebram a segurança jurídica e podem trazer impactos muito negativos ao mercado de geração distribuída. A expectativa é que, durante o processo de consulta pública, as novas regras só passem a valer para os contratos iniciados em 2020, quando a revisão entra em vigor. “Se mudar de imediato atinge a todos. E pode reduzir a atratividade para os clientes instalarem fontes como a solar, que é mais acessível e mais rápida”, diz Ananias Gomes, diretor regional da ABGD no Nordeste.


De acordo com a assessoria de imprensa da Aneel, a proposta submetida à Consulta Pública busca evitar a transferência de custos para os consumidores que não possuem a geração em suas residências. “Em 2018, conforme cálculos da Aneel, o impacto para os demais consumidores do modelo vigente de geração distribuída foi de cerca de R$ 200 milhões e em 2019 a estimativa é de R$ 400 milhões. Caso não seja alterado o modelo de compensação, os impactos chegarão a R$ 1 bilhão em 2021, R$ 2 bilhões em 2023 e R$ 3 bilhões em 2025”, explica a Aneel. 


Segundo a Agência, a geração distribuída hoje possui cerca de 1,74 GW, ou próximo de 1% da capacidade total de produção de energia elétrica no Brasil.


Energia solar emplaca em Pernambuco


Para Pernambuco, as mudanças podem afetar um mercado que está cada vez mais aquecido. O estado tem 2.497 instalações de energia solar, fonte que é líder absoluta com quase 100% do total de 2.499 unidades instaladas – apenas uma é eólica e outra é Central de Geração Hidráulica. Com estes números, o estado ocupa o décimo lugar no país em instalações de fontes alternativas de energia. 


O diretor regional da ABGD, Ananias Gomes, diz que só em 2019 foram 1.500 novas instalações da solar. “Pernambuco ressurgiu para a energia solar como fator competitivo, para controle do custo de energia, especialmente nas residências que representam 70% das unidades geradoras”, afirma. A conclusão é da pesquisa interna da sua empresa, a Insole, que estrutura e financia projetos solares. Segundo a pesquisa, a classe C lidera a produção de energia solar em casas e, as mulheres são as responsáveis pela decisão. 


Os motivos são claros: os sistemas de energia solar ficaram 60% mais baratos nos últimos cinco anos e, com o valor da conta de luz da concessionária, agora dá para pagar a parcela do financiamento da instalação e ainda sobra. “Há um ganho financeiro imediato e os custos podem ser diluídos em até 60 meses. Isso incentiva a compra de novos bens elétricos e o reinvestimento nos painéis solares para poder consumir mais energia”, observa Ananias Gomes.


Na pesquisa, os consumidores revelam que todo ano compram eletrodomésticos e o preferido é o ar- -condicionado. Com a economia, trocam bens como TVs e geladeiras, por outros de consumo mais eficiente.


Mas, segundo Gomes, este cenário pode mudar se a revisão da RN/482 reduzir o custo-benefício para os geradores residenciais. O pay back, que equivale ao tempo de retorno do investimento inicial, pode duplicar, passando de três a quatro anos para seis ou oito anos. “A cobrança do fio vai pesar muito nos pequenos porque vai ter impacto nos financiamentos”, conclui.