Com inflação crescente, alta na taxa básica de juros e dólar acima de R$ 5, a pressão no bolso do trabalhador está cada vez maior. Em julho deste ano, o número de brasileiros inadimplentes era de 62,2 milhões, com uma média de R$ 3,9 mil em dívidas por pessoa. A média de cada dívida é de R$ 1,1 mil. Forçada a rever seus hábitos de consumo, para evitar ficar inadimplente, a população se entrega ao cartão de crédito. Apesar de permitir o parcelamento de compras, o que possibilita compras grandes e pagamentos fora do planejamento, como quando ocorre um imprevisto, por exemplo, o meio de compra é um dos principais vilões quando o assunto é planejamento financeiro.

À época do estudo Mapa da Inadimplência, produzido pelo Serasa, contudo, a taxa básica de juros (Selic) estava em 4,25% e não havia alta nas alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que incide em empréstimos, compras internacionais no cartão e quando ocorre o parcelamento de faturas, por exemplo. O cenário agora é outro, a inflação está nas alturas e não há sinal de trégua. Para contê-la, o Banco Central elevou a taxa Selic para 5,25% — e ela deverá subir mais. Com o encarecimento do custo de vida e o aumento do desemprego, a tendência é uma alta no endividamento.

O comerciante Marcelo Lopes, 47 anos, recorreu ao cartão de crédito. Ele explica que os gastos imprevistos são a principal causa do parcelamento de compras. “Fica difícil quando tem um vazamento em casa, ou algo do tipo. Sempre vem nas piores horas e, como muitas vezes, não tenho dinheiro para pagar o serviço à vista, eu acabo parcelando mesmo”, conta.

Lopes revela que, desde que a pandemia começou, as vendas de sua loja de roupas em Taguatinga caíram. Por isso, ele foi forçado a se organizar para conseguir chegar ao final do mês com o orçamento em dia, sem pendências. “O dinheiro tem que ser muito bem contado, porque se tiver imprevisto, a coisa aperta”, afirma.

No caso da advogada Tainá Neves, 36 anos, moradora de Brasília, a inflação tem sido a responsável pela opção por parcelar as compras no cartão de crédito. “Está tudo caro, né? Mercado, gás, luz, água. Antes, minha renda dava conta, agora, com essa crise, está ficando difícil”, explica.

Tainá diz que até tenta evitar as compras parceladas, mas que não vê alternativas quando precisa comprar produtos mais caros, como eletrônicos e eletrodomésticos. “Eu sei que vai ficar mais caro, mas, às vezes, preciso muito do produto e não tenho dinheiro para comprar à vista”, lamenta. Como muitos brasileiros, ela agora tem dificuldades para pagar as parcelas no fim do mês. “Parece que eu estou em um ciclo sem fim, tenho que pegar empréstimo para pagar parcela e, assim, a dívida continua aumentando”.

Quando o consumidor não consegue fazer o pagamento do cartão de crédito integralmente e opta pelo parcelamento ou pagamento mínimo, as taxas podem se tornar uma bola de neve. Por isso, a recomendação dos especialistas é que, quando for possível, o melhor é poupar dinheiro para comprar determinado produto posteriormente, pagando à vista. É o que recomenda o economista Igor Peixoto.

“O pagamento à vista é mais vantajoso do que o parcelado porque o parcelado incorre em juros e o pagamento à vista geralmente é acompanhado de um desconto do produto, aumentando seu poder de compra. Caso você não tenha o dinheiro à vista, é recomendado que você poupe para conseguir comprar à vista futuramente e com o desconto”, aconselha.

Adriano Severo, educador financeiro e analista de investimentos, alerta para a importância de ponderar o risco de determinadas compras. “A pessoa tem que ter ciência do quão segura ela está na profissão ou emprego, porque isso influencia nas decisões de compra que ela vai ter. Então, se ela está em um emprego instável, não pode fazer compras com muitas parcelas. Se é servidor público, já fica melhor, tem estabilidade”, diz.

Hábitos


O especialista afirma que, se o consumidor não puder evitar usar o cartão, o ideal é optar por um parcelamento menor. É importante lembrar, no entanto, que o cartão de crédito, quando usado com responsabilidade, pode ser um aliado. “Se a pessoa tem controle, pode usar, mas para a maioria ele acaba sendo um vilão porque a pessoa acumula valores alto na fatura e não consegue pagar ou porque tem juros, taxas. Então, a regra é sempre tentar desconto nas compras, tentar pagar à vista”, ressalta.

Ele pontua, ainda, que, com a inflação alta, essa é uma oportunidade para repensar os hábitos financeiros. “É importante fazer pesquisas por produtos similares. Para quem conseguir, o ideal é construir uma reserva de emergência. E não precisa guardar um valor fixo todo mês, qualquer dinheiro que ela tenha guardado já pode fazer diferença e ajudar a pagar as contas. O importante é ir guardando, independentemente do valor”, explica.

No caso daqueles que já estão inadimplentes e com o nome sujo, Severo indica que uma boa saída é falar com o banco para renegociar as dívidas e procurar feirões de negociação, para tentar condições melhores para pagar a dívida. Hoje, é possível consultar o score pela internet e descobrir se há dívidas pendentes — o que possibilita a renegociação com condições favoráveis aos consumidores.