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Desenvolvida pela Associação Beneficente O Pequeno Nazareno e pelo Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (Ciespi/PUC-Rio) no âmbito do projeto Conhecer para Cuidar, a pesquisa tem o objetivo de subsidiar políticas públicas que atendam essa população.
Segundo o coordenador de projetos da associação, Manoel Torquato, a pesquisa mostra que 85% das crianças e adolescentes que vivem nas ruas são negros (soma de pretos e pardos), e este é um dado sempre importante, porque, de certa forma, explica a origem da situação de rua no Brasil. "Ela tem a ver com racismo estrutural”, afirma Torquato, que é também coordenador nacional da Rede Criança Não é de Rua. Nas instituições de acolhimento, o número é mais expressivo: 89% se autodeclararam pretos ou pardos.
O levantamento incluiu 17 cidades brasileiras com mais de 1 milhão de habitantes: São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Brasília, Fortaleza, Belo Horizonte, Manaus, Curitiba, Recife, Porto Alegre, Belém, Goiânia, Guarulhos, Campinas, São Luís, São Gonçalo e Maceió. Cerca de 600 pessoas foram entrevistadas.
Manoel Torquato ressalta que o racismo tem seus desdobramentos na desigualdade social observada até hoje. “Tanto que, se a gente comparar esses dados com os dados de homicídios, de encarceramento, de pobreza extrema, sempre vai encontrar uma maioria negra. Aqui, mais uma pesquisa vai apontar isso, agora com crianças e adolescentes em situação de rua.”
Para Torquato, todas as vulnerabilidades a que estão submetidos crianças e adolescentes são agravadas durante a pandemia. “Entre os que ficam permanentemente na rua, há a impossibilidade de cumprir a regra básica das organizações de saúde, que é o 'fique em casa'. Ficar em casa em isolamento social pressupõe você ter uma casa”, destaca Torquato, ao lembrar que há uma enorme ausência de oferta por parte do Poder Público de alternativas para esse isolamento social.
“Não se acionou a rede hoteleira, como muitos países fizeram, para acolher essas pessoas provisoriamente, não se abriram as escolas públicas para uso coletivo desses espaços pela população em situação de rua. Manteve-se, então, essa população ainda em maior vulnerabilidade”, afirma Torquato diz ainda que a principal estratégia no país para aplacar os efeitos econômicos da pandemia, o auxílio emergencial de R$ 600, não dispôs de metodologia que incluísse as especificidades da situação de rua. O acesso a esse benefício depende de a pessoa ter internet, um número de celular e o equipamento.
O levantamento mostra ainda que cerca de 60% dos que vivem nas ruas e de 70% dos que estão acolhidos frequentam a escola. Com o fechamento das escolas e a falta de uma alternativa a essa frequência escolar, essas crianças estão mais sujeitas a ir para as ruas do que antes.
Especialista em direitos da infância e juventude e membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe), o advogado Ariel de Castro Alves afirma que os dados mostram uma realidade que vem de muitos e muitos anos, principalmente nas grandes capitais e regiões metropolitanas. Segundo Alves, diante da pandemia, da crise social e econômica, a situação, que já gravíssima, deve se agravar mais.
“Grande parte das crianças vai para as ruas em razão do trabalho infantil para contribuir com seu sustento e o de sua família, o que certamente tende a se agravar com o aumento do desemprego, subemprego e falta de renda dos pais, mães e responsáveis. Dia 13 de julho próximo, o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] completa 30 anos, e o país precisa ter políticas públicas mais efetivas para a proteção de crianças e adolescentes em situações de rua”, destaca o advogado.
Ariel de Castro Alves ressalta que não há censos atualizados sobre essa população. “Ter dados e conhecer os problemas é o primeiro passo para tentar resolvê-los. Essa pesquisa precisa ser usada para os gestores públicos criarem programas e serviços voltados às abordagens de rua”, disse. Ele acrescenta que são necessários serviços e programas de enfrentamento ao trabalho infantil, vinculados àa educação em período integral, com bolsas de estudos e renda básica para as famílias.
Estado
Manoel Torquato enfatiza ainda a violências praticada nas ruas contra crianças e adolescentes. Perguntada se já tinha sofrido algum tipo de violência nas ruas, a maioria (88%) dos meninos e meninas que viviam nas ruas respondeu que sim. Entre os acolhidos nos serviços, o número foi mais expressivo: 97% disseram que já tinham sofrido violência.
Entre aqueles que estão em situação de rua, metade dos entrevistados apontou agentes de segurança pública como principais autores dos atos de violência sofridos. “Para nós, este é um dado importante porque, primeiro, indica o estado como principal violador. Esses agentes públicos de segurança representam o estado, são formados, capacitados pelo estado, isso indica uma negação do estado de direito.”
Para Torquato, além disso, esse dado da pesquisa aponta a questão de discriminação das pessoas em situação de rua pela política pública. “A política pública que chega a essa população chega através dos agentes de segurança e chega na forma de violência.”
Além da pobreza e da busca pela sobrevivência como principais motivos para crianças e adolescentes irem para as ruas, procuram-se as ruas como lugar de diversão e liberdade – segunda opção mais apontada pelos entrevistados. Segundo Torquato, o resultado se relaciona com o perfil majoritário do público identificado na pesquisa, que são adolescentes, e com a falta de opções de lazer e diversão para eles.
“Nessa fase da vida, de fato, nós buscamos constantemente esse lugar de diversão e liberdade. Como falta nas comunidades a perspectiva de programas mais arrojados de cultura, de esporte, de lazer, o espaço da rua acaba também virando esse lugar, onde os meninos e meninas podem ocupar as praças, os pontos turísticos da cidade, andar livremente para um lado e para o outro, vivenciando uma experiência de liberdade e diversão, muitas vezes perigosa, porque a rua não tem essa infraestrutura de segurança para todos”, diz Torquato.
Para ele, esse elemento revelado pela pesquisa dá conta de uma demanda de política pública ausente para as pessoas que estão em uma zona de vulnerabilidade e mostra que a implementação de políticas mais atrativas em áreas preventivas – como esporte, lazer, cultura e educação – poderiam contribuir para evitar a situação de rua em que vivem esses jovens.
O terceiro aspecto mais citado para a ida às ruas é o conflito familiar. No entanto, Torquato afirma que é preciso cuidado para não cair na armadilha de culpar as famílias e de acusar os lares de desestruturados. Torquato lembra que, no caso dos filhos de classe média, há conflitos, mas eles recebem justificativas como a de que estão na fase da puberdade e ou de que “adolescente é assim mesmo”.
“Há uma série de justificativas para essa classe social [classe média] receber e acolher essa perspectiva de conflito que vivem os adolescentes e seus pais. No campo da pobreza, isso vira motivo de ida pra rua. Então, a gente tem que ter um cuidado na hora de observar esse dado para não cair no senso comum de sempre jogar o problema para a relação familiar”, finalizou.
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Desenvolvida pela Associação Beneficente O Pequeno Nazareno e pelo Centro Internacional de Estudos e Pesquisas sobre a Infância da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (Ciespi/PUC-Rio) no âmbito do projeto Conhecer para Cuidar, a pesquisa tem o objetivo de subsidiar políticas públicas que atendam essa população.
Segundo o coordenador de projetos da associação, Manoel Torquato, a pesquisa mostra que 85% das crianças e adolescentes que vivem nas ruas são negros (soma de pretos e pardos), e este é um dado sempre importante, porque, de certa forma, explica a origem da situação de rua no Brasil. "Ela tem a ver com racismo estrutural”, afirma Torquato, que é também coordenador nacional da Rede Criança Não é de Rua. Nas instituições de acolhimento, o número é mais expressivo: 89% se autodeclararam pretos ou pardos.
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Manoel Torquato ressalta que o racismo tem seus desdobramentos na desigualdade social observada até hoje. “Tanto que, se a gente comparar esses dados com os dados de homicídios, de encarceramento, de pobreza extrema, sempre vai encontrar uma maioria negra. Aqui, mais uma pesquisa vai apontar isso, agora com crianças e adolescentes em situação de rua.”
Para Torquato, todas as vulnerabilidades a que estão submetidos crianças e adolescentes são agravadas durante a pandemia. “Entre os que ficam permanentemente na rua, há a impossibilidade de cumprir a regra básica das organizações de saúde, que é o 'fique em casa'. Ficar em casa em isolamento social pressupõe você ter uma casa”, destaca Torquato, ao lembrar que há uma enorme ausência de oferta por parte do Poder Público de alternativas para esse isolamento social.
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O levantamento mostra ainda que cerca de 60% dos que vivem nas ruas e de 70% dos que estão acolhidos frequentam a escola. Com o fechamento das escolas e a falta de uma alternativa a essa frequência escolar, essas crianças estão mais sujeitas a ir para as ruas do que antes.
Especialista em direitos da infância e juventude e membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe), o advogado Ariel de Castro Alves afirma que os dados mostram uma realidade que vem de muitos e muitos anos, principalmente nas grandes capitais e regiões metropolitanas. Segundo Alves, diante da pandemia, da crise social e econômica, a situação, que já gravíssima, deve se agravar mais.
“Grande parte das crianças vai para as ruas em razão do trabalho infantil para contribuir com seu sustento e o de sua família, o que certamente tende a se agravar com o aumento do desemprego, subemprego e falta de renda dos pais, mães e responsáveis. Dia 13 de julho próximo, o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] completa 30 anos, e o país precisa ter políticas públicas mais efetivas para a proteção de crianças e adolescentes em situações de rua”, destaca o advogado.
Ariel de Castro Alves ressalta que não há censos atualizados sobre essa população. “Ter dados e conhecer os problemas é o primeiro passo para tentar resolvê-los. Essa pesquisa precisa ser usada para os gestores públicos criarem programas e serviços voltados às abordagens de rua”, disse. Ele acrescenta que são necessários serviços e programas de enfrentamento ao trabalho infantil, vinculados àa educação em período integral, com bolsas de estudos e renda básica para as famílias.
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Manoel Torquato enfatiza ainda a violências praticada nas ruas contra crianças e adolescentes. Perguntada se já tinha sofrido algum tipo de violência nas ruas, a maioria (88%) dos meninos e meninas que viviam nas ruas respondeu que sim. Entre os acolhidos nos serviços, o número foi mais expressivo: 97% disseram que já tinham sofrido violência.
Entre aqueles que estão em situação de rua, metade dos entrevistados apontou agentes de segurança pública como principais autores dos atos de violência sofridos. “Para nós, este é um dado importante porque, primeiro, indica o estado como principal violador. Esses agentes públicos de segurança representam o estado, são formados, capacitados pelo estado, isso indica uma negação do estado de direito.”
Para Torquato, além disso, esse dado da pesquisa aponta a questão de discriminação das pessoas em situação de rua pela política pública. “A política pública que chega a essa população chega através dos agentes de segurança e chega na forma de violência.”
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