Com A bruxa (2015), o diretor Robert Eggers se lançou para o mundo. Mostrou que era possível fazer de um gênero considerado menor por parte da crítica – o cinema de horror – algo inquietante, intenso, fora dos sustos óbvios. Apresentou uma narrativa construída aos poucos, apostando nas metáforas e nas sensações.
 
Em O farol, que estreia nesta quinta-feira (2) no circuito nacional, a pretensão é a mesma, só que com uma história completamente diferente. O cineasta estreante de quatro anos atrás, amparado pela repercussão do filme anterior, pôde trabalhar com um elenco de peso.
Robert Pattinson e Willem Dafoe estão em cena praticamente o tempo inteiro. Interpretam dois faroleiros que chegam a uma ilha remota da Nova Inglaterra dos anos 1890. Sem data nem meios para ir embora, sucumbem à solidão e à loucura.
 
Desde maio, quando foi lançado no Festival de Cannes (eleito pela crítica o melhor filme da Quinzena dos Realizadores), O farol vem ganhando adeptos mundo afora. O longa tem DNA brasileiro – foi produzido pela RT Features, de Rodrigo Teixeira. Está indicado a cinco prêmios do Independent Spirit Awards (com Pattinson na categoria principal de ator e Dafoe de coadjuvante), o Oscar dos independentes.
 
Mais do que a história, o que chama a atenção em O farol são as referências cinematográficas. Eggers filma com os olhos do agora utilizando técnicas de outrora. Tela quase quadrada (em formato 1.19:1, típico da produção das décadas de 1920 e 1930), fotografia em preto e branco com muito contraste, enquadramentos que remontam a grandes diretores (Fritz Lang, Alfred Hitchcock estão entre os reverenciados), nada em O farol é gratuito.
 
SOLIDÃO O filme começa quando Thomas Wake (Dafoe) e Ephraim Winslow (Pattinson) desembarcam na pequena ilha em que deverão trabalhar nas próximas semanas. Enquanto uma dupla de faroleiros está chegando, outra vai embora – nenhum dos homens fala qualquer coisa. A partir desse início, seguem-se dias e noites de intensa solidão. Os dois personagens mal se falam, só vão descobrir os respectivos nomes depois de modorrentos dias de convívio. O mais velho gosta de beber e contar casos intermináveis; o mais novo prefere comer em silêncio, mantendo distância do álcool.
 
Os dois comem, dormem, fazem suas necessidades sempre muito próximos. A intensa convivência não demora a se tornar puro antagonismo, ainda mais porque Wake logo estabelece a hierarquia: Winslow tem vários afazeres, mas não deve, de maneira alguma, chegar até a luz do farol. Essa tarefa é unicamente dele. A impossibilidade de chegar até lá se torna uma obsessão para o jovem.
 
Eggers filma essa relação sempre de maneira muito próxima, com planos bem fechados nos rostos dos dois atores – as atuações de Pattinson e Dafoe são, de longe, o grande mérito do longa. À medida que a narrativa avança, o clima claustrofóbico (às vezes, perto do limite do suportável) se intensifica. Não se sabe mais o que é realidade ou delírio, se é dia ou noite. O barulho da buzina dos navios (sempre ao longe), onipresente, serve para marcar que aquele pesadelo parece sem fim.
 
Ainda que tenha forte impacto visual, O farol deixa o espectador num lugar nada confortável. É uma experiência difícil, quem estiver disposto a entrar nela deve ter consciência disso.