Longa La quietud, do premiado cineasta Pablo Trapero, revela verdades incômodas da época da ditadura
O filme argentino La quietud, do premiado cineasta Pablo Trapero, surpreendeu o Festival de Veneza,ontem, com um conto erótico, que revela verdades incômodas da época da ditadura. Trapero, muito aplaudido na exibição do longa-metragem para a imprensa, retorna a Veneza fora de competição, mostrando a outra face de uma família rica e matriarcal, mas tão violenta como a apresentada há três anos em Veneza com o O clã, filme premiado com o Leão de Prata de direção.
“Como qualquer retrato de família, está sempre marcado pelo passado, e o passado neste filme é marcado por histórias muito dolorosas, não apenas pessoais, mas também das que vivemos na Argentina há muitos anos”, disse o diretor, em referência aos anos da ditadura militar.
A Argentina rica, dos latifundiários, com planícies e cavalos, está representada pela fazenda La Quietud e a relação entre duas belas irmãs, interpretadas por Berenice Bejo e Martina Gusman. Trapero entra na vida cômoda de uma família de classe alta, para revelar suas mentiras e segredos. “É difícil falar do presente sem falar do passado. La quietud é a reconstrução do passado no tempo presente”, diz Trapero, que utiliza cenas eróticas, de sexo e masturbação, para contar o lado mais sombrio, oculto, o que ninguém quer saber da própria história e de seu país.
CRÍTICAS O universo das mulheres é um dos mais abordados nos filmes exibidos em Veneza, apesar das críticas dirigidas ao festival por haver selecionado apenas um filme dirigido por uma mulher, entre os 21 da competição principal. “Foi um desafio adicional contar este universo como homem”, admitiu Trapero.
A ideia de contar a vida dessas “irmãs simbióticas”, que protagonizam uma cena de masturbação conjunta, é, na realidade, um pretexto para revelar as cumplicidades durante a ditadura e contar como algumas fortunas foram obtidas: tomando posse das propriedades dos desaparecidos, entre elas a fazenda La Quietud.
Como também acontece no filme, as duas atrizes contaram que estabeleceram uma boa relação, em parte por iniciativa de Trapero, que as considera muito parecidas. Bejo confessou ainda que participar do filme foi um desafio e a realização de um “sonho”: como filha de argentinos exilados na França, ela queria há muito tempo trabalhar em seu país de nascimento. “Atuar em espanhol não foi fácil, foi muito emocionante”, disse a atriz, que definiu o filme como uma “experiência pessoal incrível” e admitiu que, em alguns momentos, ficou à beira de uma crise. (AFP)