Morador da vila de Regência, balneário encravado na foz do rio Doce no município de Linhares (132 km de Vitória), Robson Barros da Rocha, 50, mudou os hábitos na última semana. É surfista, mas tem evitado até passar perto da praia. Gosta de estar bem informado, mas acompanhar o noticiário virou uma atividade indigesta desde que manchas de óleo começaram a atingir o litoral norte do Espírito Santo na última sexta-feira (8).
 
 
Pudera. Há quatro anos, Robson viu o mar de Regência ser invadido pelos rejeitos do rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG), e teve a sua vida virada de ponta-cabeça.
Nesta quarta-feira (13), ele viu o pesadelo voltar sob nova forma: a vila de Regência registrou os primeiros vestígios óleo nas praias, consumando o segundo desastre ambiental na região em quatro anos. 
 
"Se já não bastasse tudo que passei nos últimos anos, agora vem esse novo desastre ambiental. Não quero nem passar perto porque sei que vai me fazer muito mal", afirma Robson.
 
O sentimento é mesmo entre os demais moradores de Regência, balneário com cerca de 6.000 moradores conhecido por suas belezas naturais e ter algumas das melhores praias para a prática de surfe no Brasil.
 
Desde a chegada dos rejeitos da barragem da Samarco, empresa controlada pela Vale e a anglo-australiana BHP Billiton, Regência enfrenta uma debandada de turistas que costumavam lotar suas praias no verão.
 
Robson Barros, que tinha uma lanchonete e um camping, conseguiu manter seu negócio por apenas seis meses após a chegada dos rejeitos. Sem demanda, fechou as portas e acumula dívidas com contas de água e energia. Para reaver o prejuízo, trava uma batalha judicial com a Samarco.
 
Fábio Gama, 43, tem uma trajetória semelhante. Ele era dono de uma agência de ecoturismo em Regência, mas teve que fechar as portas do seu negócio há cerca de um ano por falta de clientes.
Desde então, Fábio está desempregado e trocou a moradia em Regência por uma casa na sede da cidade de Linhares. "A gente fica muito triste. Parece até que esse óleo veio para selar a nossa tragédia", afirma.
 
Na avaliação do secretário de Meio Ambiente de Linhares, Fabricio Borghi, a chegada do óleo nas praias representa um novo baque para a economia da cidade, que tem o turismo como uma de suas principais fontes de renda.
 
"Está todo mundo muito desgastado e apreensivo com a chegada desse óleo. É mais uma tragédia para a nossa cidade", lamenta.
 
Desde a chegada do óleo, que também afetou o litoral dos nove estados do nordeste, prefeitura e Exército têm atuado na limpeza das praias, mas encontram obstáculos como a grande extensão do litoral de Linhares, que tem cerca de 80 quilômetros e praias isoladas, além de fortes chuvas.
Outra preocupação são as tartarugas marinhas: nesta semana, o óleo chegou à praia Pontal do Ipiranga, onde funciona uma base do Projeto Tamar dedicado à proteção dos animais ameaçados de extinção. Até o momento, porém, não houve registro de tartarugas mortas ou oleadas na região.
 
Além de Linhares, há registro de óleo em outras duas cidades do litoral norte do Espírito Santo que também sofreram o impacto dos rejeitos da barragem de Mariana em 2015. De acordo com o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), foram atingidos pelas manchas 15 locais das cidades de Linhares, Conceição da Barra e São Mateus. Ao todo, foram recolhidos 473 quilos de óleo.
 
Um comitê com entes federais, estaduais e municipais foi criado há cerca de 30 dias para instituir um plano para remoção e armazenamento do óleo. Vistorias estão sendo realizadas e barreiras de contenção foram instaladas nos estuários dos principais rios do litoral.
 
Em São Mateus, a prefeitura ergueu um barramento com areia fechando a foz do rio Mariricu para proteger a vegetação e a fauna do estuário dos vestígios de óleo que chegaram à praia.
Desde a chegada das manchas, a maior parte dos pescadores, marisqueiros e catadores de caranguejo suspenderam as atividades. A pesca é uma das principais atividades das famílias da região, que atuam de forma artesanal e familiar.
 
A pescadora Eliane Balke, 53, diz que, com o fechamento da foz do rio, parte das embarcações não consegue mais acessar o mar para pescar. Ela diz temer pelo futuro das famílias que sobrevivem da pesca.
 
"Para nós, ainda mais depois de toda aquela lama de rejeitos, é muito complicado enfrentarmos mais uma situação dessas. Estamos vivendo, assim, como um filho sem pai", resume a pescadora.