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O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), diz que o poder Executivo estadual vai acatar, desde que cumprida a lei e o trato judicial de fevereiro deste ano, as alterações feitas pela Assembleia Legislativa no projeto de lei que regulamenta a utilização de R$ 11 bilhões dos R$ 37,68 bilhões pagos pela Vale por causa do rompimento da barragem de Brumadinho, em 2019. O texto está parado em uma das comissões temáticas do Parlamento e, se receber aval, estará pronto para votação em plenário.


As negociações para fazer o tema avançar, contudo, ficaram estagnadas após deputados e governo discutirem sobre o repasse proporcional de R$ 1,5 bilhão aos 853 municípios mineiros. Em entrevista exclusiva ao Estado de Minas, nesta segunda-feira (28/6), Zema afirmou que ele e sua gestão não deram “nenhuma palavra” para a Assembleia sobre o tema.

A versão se choca com o que o presidente do Legislativo, Agostinho Patrus (PV), afirmou também nesta segunda, em entrevista coletiva. O parlamentar apontou “decepção” decorrente do impasse nas tratativas e pediu que o governo envie um texto substitutivo prevendo a transferência de R$ 1,5 bilhão às prefeituras. Para ele, o Executivo descumpriu combinados já firmados.


“Eu e meu governo não demos nenhuma palavra para a Assembleia, e a Assembleia tem autonomia, tem soberania, para poder fazer o projeto, emendar o que nós enviamos, na hora que ela quiser. Então, está na mão da Assembleia, não está nas nossas mãos. Desde que a Assembleia faça isso dentro do acordo que foi feito em fevereiro e dentro dos limites da lei, vamos acatar tudo”, disse Zema, ao EM,

Segundo Agostinho Patrus, deputados e representantes do governo haviam acordado a distribuição da quantia por meio de depósitos feitos diretamente na conta dos municípios, proporcionalmente às populações. Ainda conforme a versão do deputado, o Palácio Tiradentes passou a desejar a assinatura de convênios para concretizar as trasferências.

Para sustentar que o Legislativo pode fazer alterações no projeto, o governador recorreu às articulações que resultaram na abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga supostas irregularidades na Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig).

“A Assembleia não depende de nós. A Assembleia é soberana. Teve acordo para abrir CPI. Por que ela não vota o acordo (da Vale)? Então, ela pode fazer isso a qualquer momento, do jeito que ela fez com a CPI. Que ela (a ALMG) avalie lá o regulamento dela, tem soberania, acho que está esquecendo. Ela pode votar a qualquer momento. Não depende do governo. A Assembleia é soberana”, asseverou.


Ao falar sobre o tema, Zema lembrou que a indenização é fruto de acordo entre o governo e a mineradora. O trato foi mediado por instituições como o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o Ministério Público estadual (MPMG) e a Defensoria Pública.

Acusações de parte a parte

Mais cedo, ao criticar o governo, Agostinho Patrus sustentou que a adoção do modelo de convênios oneraria os cofres públicos em R$ 310 milhões. Na visão do presidente do Legislativo, a estratégia pode burocratizar a chegada da verba às comunidades.

"Quando esse recurso sai de forma igual a todos os municípios, você deixa de ter o chamado apadrinhamento. A hora que você deixa de ter o convênio, da mesma forma. Você deixa de ter aqueles que vão se sentar ao lado do prefeito para assinar o convênio e dizer que foram parte disso. O que a Assembleia quer é fazer algo sem essa visão política".

Romeu Zema, por seu turno, embora concorde com o repasse de R$ 1,5 bilhão às prefeituras, refutou a tese de “burocratização”. Segundo ele, a ideia de enviar novo substitutivo é que pode dificultar o processo.


“Não queremos burocratizar nada, mandamos a lei que está lá prontinha. É só a Assembleia emendá-la. Me parece que quem está querendo burocratizar é a Assembleia, que está querendo que seja feito um novo substitutivo. Então, da nossa parte, isso já era para ter acontecido há muito tempo. E por que falar isso só agora, depois de quatro meses que o projeto foi enviado? Faz sentido?”, questionou.

As negociações entre deputados e o Palácio Tiradentes são conduzidas pela Secretaria de Governo. A pasta é liderada por Igor Eto.

Entenda

O texto sobre os R$ 11 bilhões da Vale está na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO). Os integrantes do comitê precisam aprovar o projeto e, assim, autorizar a votação em plenário, em turno único. Nessa etapa, os 77 deputados vão poder emitir opinião.

Na última segunda-feira (21), havia expectativa de análise da proposta na Comissão de Fiscalização. A reunião daquele dia, contudo, foi encerrada sem que o tema fosse deliberado. Ao comunicar a decisão, Agostinho Patrus reclamou de interlocutores do governo.


Os R$ 11 bilhões analisados pela Assembleia vão entrar nos cofres estaduais como crédito suplementar ao orçamento votado no fim do ano passado. Por isso, a destinação dos recursos precisa de análise prévia do Legislativo. O restante do dinheiro, cerca de R$ 26,7 bilhões, está reservado à reparação direta aos atingidos pelo estouro da barragem.

Com o montante sob análise dos deputados, a gestão de Zema pretende custear melhorias em estradas e pontes, além do Rodoanel da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Intervenções em hospitais regionais também estão nos planos.

Diante do impasse entre Executivo e Legislativo, o governo convocou, para a tarde desta segunda, entrevista coletiva com Igor Eto. Vão participar, também, Luísa Barreto, da pasta de Planejamento e Gestão, e Mateus Simões, da secretaria-geral.