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Nos últimos anos, as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram a ganhar cada vez mais espaço na mídia e, consequentemente, entre a opinião pública. Hoje em dia, não são raras as vezes em que o tribunal é questionado por suas posições ou levado a decidir temas que, em um primeiro momento, parecem ser de competência do Poder Legislativo, ou até mesmo do Executivo.
Recentemente, os 11 ministros que compõem a Corte decidiram sobre dois temas que suscitaram alguns debates: a questão sobre a obrigatoriedade ou não da vacinação contra a Covid-19 e a reeleição da Mesa Diretora da Câmara e do Senado.
No primeiro caso, na avaliação do professor de Direitos Humanos e de Processo Legislativo na Fundação Getúlio Vargas (FGV), Michael Mohallem houve um embate entre Executivo federal, governadores e órgãos de saúde e, então, o tema foi levado ao Supremo. “Nesse caso, a gente tem um presidente que conhecidamente tem uma posição contrária à vacina e os órgãos de Estado, como a Anvisa, tem posições ambíguas. Então, o que fazem esses partidos minoritários e governadores? Levam a questão até o Supremo e conseguem resultados”, diz Mohallem.
Já o professor associado do Insper, Diego Werneck, pondera que a questão foi menos uma decisão e mais uma sinalização política do STF acerca do tema. “No fundo, é difícil saber o que o Supremo decidiu de fato. Ele está mandando uma sinalização. Diz que a vacinação pode ser obrigatória, mas não forçada. Na verdade, o que o tribunal diz é: é possível ter algum tipo de sanção se você não se vacinar, mas essa sanção tem que ser razoável, tem que respeitar a dignidade humana, tem que respeitar a liberdade. No fundo, o Tribunal não está resolvendo muitos conflitos. Esses conflitos vão aparecer lá na frente, quando essas medidas concretas forem discutidas", avalia Werneck.
Segundo ele, o Supremo se antecipou ao se posicionar sobre o tema: "Não era um problema jurídico que tinha sido colocado, mas ele queria minar um discurso político de que a vacinação seria obrigatória e isso violaria as liberdades individuais. Acho que o alvo da decisão é um alvo mais político do que jurídico", ressaltou Werneck.
Disputas no Congresso
No caso da reeleição para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado, que quase foi autorizada, mas acabou impedida por seis votos a cinco, o debate sobre a politização do Supremo ficou mais evidente. Ambos os professores concordam que, se tivesse passado a reeleição no Congresso, a decisão estaria ferindo a Constituição, que é clara ao dizer, em seu artigo 57, que o mandato dos presidentes de cada uma das Casas é de dois anos, sendo “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente”.
Na visão de Werneck, é inegável que havia interesses políticos envolvidos. “Evidente para todo mundo que foi um cálculo político que os ministros fizeram. Felizmente, essa decisão não prevaleceu. Os argumentos jurídicos eram ilusórios, nesse caso, era um passe de mágica que não prevaleceu, mas se tivesse prevalecido não teria como considerar que essa decisão não tenha sido política” afirmou o professor do Insper.
Nos últimos anos, foram diversos os temas em que a opinião pública levantou a hipótese de julgamento político do STF, seja em casos de corrupção, seja na decisão que reconheceu a união estável homoafetiva, ou até em assuntos que, a princípio, parecem ser exclusivamente do Legislativo, como é o caso do fim das doações de empresas para campanhas eleitorais.
Por que o STF tem decidido de forma política?
No entendimento de juristas, o tribunal sempre pôde decidir sobre um espectro muito amplo de temas por uma questão própria do sistema judiciário brasileiro, alguns inclusive que também são temas tangenciados pelos demais Poderes: é de competência do Supremo guardar os direitos garantidos pela Constituição que, no caso do Brasil, é bastante extensa e trata de temas bastante diversos.
“A nossa Constituição é muito extensa e, com isso, ela automaticamente dá um mandato e poder ao Supremo de se posicionar sobre aquilo. Porque o Supremo tem o papel de interpretar a Constituição e proteger os direitos. Se a Constituição, que ele tem que proteger e interpretar como papel principal, tem muitas coisas, naturalmente o Supremo vai ser provocado a falar sobre muitas coisas. Então, essa é uma questão de origem”, explica o professor Michael Mohallem.
Outra característica da Corte máxima do país é que são vários os agentes que podem motivar uma decisão do Supremo. Então, diferentemente, por exemplo, da Corte americana em que poucos órgãos podem provocar diretamente a instância máxima da Justiça, no Brasil, partidos políticos, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e diversas associações podem apresentar questões ao STF.
E tem havido um crescimento do número de ações também no tribunal, muitas delas de partidos políticos que, por vezes, tentam pautar o debate público por meio da Justiça ou tentam até reverter no STF, decisões tomadas no Congresso. “Um partido pequeno, com um, dois ou cinco deputados, consegue fazer pouco no Legislativo, porque dificilmente ele vai ter voto para ganhar, eu digo sozinho, é claro. Mas, para ganhar uma questão, ou pautar uma questão importante, se ele tiver um bom advogado, e conseguir levar essa questão rapidamente, ele pauta o tema no Supremo”, pontua.
A opinião é compartilhada pelo professor Diego Werneck. Ele pondera que, até final dos anos 90, a atuação junto ao Supremo era mais concentrada nos partidos de oposição e que hoje isso se ampliou. “Esse é um fenômeno que já existe desde os anos 90, só que nos concentramos em partidos da oposição. Então, o PT era o grande motor das ADIN’s (Ação Direta de Inconstitucionalidade) na década de 90. Hoje, de fato, é uma estratégia mais disseminada. Você tem, às vezes, até partidos da base aliada. Não que isso seja um fenômeno novo, mas a gente vê cada vez mais partidos da base aliada levando questões para o Supremo e isso mostra como esse instrumento foi normalizado”, complementa.
Mohallem também destaca que há temas que, muitas vezes, o Congresso opta por não discutir, pelo ônus político que isso causa, caso de decisões envolvendo mudanças nas regras eleitorais. Já Werneck acrescenta que, em outros casos, o tema não tem acordo no Congresso, que é majoritariamente conservador, como muitos dos debates sobre direitos LGBT, e por isso, o tema não é pautado, mas acaba motivando decisões do Supremo.
'Ativismo judicial'
Muito tem se falado sobre ativismo judicial do Supremo ou sobre a suposta politização da Justiça - ou, judicialização da política. Mas, qual a avaliação de juristas sobre esse debate que cresceu nos últimos anos no país, especialmente, nas redes sociais? Algumas dessas decisões acima citadas têm sido questionadas sobre serem ou não posições ativistas do Supremo. No entanto, não há uma definição precisa para o termo, que tem ganhado múltiplos sentidos, e, talvez por isso mesmo, tenha sido preterido pelos juristas.
Werneck explica que a expressão tem diferentes sentidos, a depender de quem usa e, por isso, evita sua utilização. “É um termo que não me parece ser particularmente útil para entender o que está acontecendo. Então, por exemplo, o que você está chamando de ativismo é um tribunal que decide de uma forma descolada do texto da Constituição? Esse é um sentido possível. Outras pessoas vão dizer que ativismo é qualquer decisão em que o tribunal anula decisões dos outros Poderes. E outras vão dizer que é um tribunal comprometido com causas sociais, com certas pautas sociais, com o tema da injustiça social ou pautas progressistas de costumes. Então a gente tem que tomar cuidado com porque ela significa um mundo de coisas Dependendo de quem fala e de quem escuta”.
Ele não descarta que haja componente política nas decisões do Supremo, embora opte por não utilizar o termo ativismo. Um deles pode ser a própria pauta de julgamentos que é discricionária, ou seja, definida sem que sejam conhecidos os critérios de quais temas serão ou não julgados. “A formação da pauta é discricionária e ela também pode ser política. O tribunal tem mecanismos complexos lá dentro e agora, com plenário virtual, tudo que a gente sabia sobre a pauta do Supremo está mudando porque o plenário virtual permite que os relatores sozinhos pautem temas. Antes você precisava que o presidente pautasse aquilo no plenário físico. Então, a dinâmica mudou, mas seja o presidente seja o relator, é uma decisão discricionária. A gente não sabe quais critérios os ministros usam para escolher o que vão julgar e quando vão julgar, o que abre total espaço para cálculos políticos”.
E volta a citar a discussão sobre a reeleição das Mesas como uma decisão em que o Supremo agiu de maneira políca. “Esse é o exemplo mais claro nos últimos anos de uma politização completa na pauta do tribunal. Por que esse tema foi levado agora, no final do ano? Para levar uma sinalização de viabilidade para candidaturas que precisam se organizar já a partir de agora para as eleições em fevereiro no Congresso”, afirma.
Já o professor Mohallen descarta uma posição ativista ou política do Supremo porque, segundo ele, o tribunal tem uma gama muito grande de assunto sobre os quais é chamado a decidir e se posicionar. Entretanto, avalia que pontualmente o tribunal pode fazer algum cálculo político, como é o caso, por exemplo, da definição da pauta de julgamentos, citado também por Werneck.
“Quais casos o Supremo vai julgar é uma decisão discricionária e tem um componente de escolha, mais especificamente do presidente do Supremo. Então, por exemplo, temas polêmicos como o habeas corpus do Lula em que argumenta-se pela suspeição do Moro. Há quem diga que já há uma maioria formada para declarar o Moro suspeito. Mas, por que esse caso não vai a votação? Então, você tem um presidente que é o (ministro Luiz) Fux que apoia a Lava Jato, é contra julgar esse caso, e está resistindo. Mas, você tem uma pressão do Gilmar (Mendes), do (Dia) Toffoli, da segunda turma. Então, quais casos julgar é uma decisão que tem uma componente política discricionária e, de fato, isso está na essência do Supremo”, concluiu.
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Recentemente, os 11 ministros que compõem a Corte decidiram sobre dois temas que suscitaram alguns debates: a questão sobre a obrigatoriedade ou não da vacinação contra a Covid-19 e a reeleição da Mesa Diretora da Câmara e do Senado.
No primeiro caso, na avaliação do professor de Direitos Humanos e de Processo Legislativo na Fundação Getúlio Vargas (FGV), Michael Mohallem houve um embate entre Executivo federal, governadores e órgãos de saúde e, então, o tema foi levado ao Supremo. “Nesse caso, a gente tem um presidente que conhecidamente tem uma posição contrária à vacina e os órgãos de Estado, como a Anvisa, tem posições ambíguas. Então, o que fazem esses partidos minoritários e governadores? Levam a questão até o Supremo e conseguem resultados”, diz Mohallem.
Já o professor associado do Insper, Diego Werneck, pondera que a questão foi menos uma decisão e mais uma sinalização política do STF acerca do tema. “No fundo, é difícil saber o que o Supremo decidiu de fato. Ele está mandando uma sinalização. Diz que a vacinação pode ser obrigatória, mas não forçada. Na verdade, o que o tribunal diz é: é possível ter algum tipo de sanção se você não se vacinar, mas essa sanção tem que ser razoável, tem que respeitar a dignidade humana, tem que respeitar a liberdade. No fundo, o Tribunal não está resolvendo muitos conflitos. Esses conflitos vão aparecer lá na frente, quando essas medidas concretas forem discutidas", avalia Werneck.
Segundo ele, o Supremo se antecipou ao se posicionar sobre o tema: "Não era um problema jurídico que tinha sido colocado, mas ele queria minar um discurso político de que a vacinação seria obrigatória e isso violaria as liberdades individuais. Acho que o alvo da decisão é um alvo mais político do que jurídico", ressaltou Werneck.
Disputas no Congresso
No caso da reeleição para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado, que quase foi autorizada, mas acabou impedida por seis votos a cinco, o debate sobre a politização do Supremo ficou mais evidente. Ambos os professores concordam que, se tivesse passado a reeleição no Congresso, a decisão estaria ferindo a Constituição, que é clara ao dizer, em seu artigo 57, que o mandato dos presidentes de cada uma das Casas é de dois anos, sendo “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subseqüente”.
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Por que o STF tem decidido de forma política?
No entendimento de juristas, o tribunal sempre pôde decidir sobre um espectro muito amplo de temas por uma questão própria do sistema judiciário brasileiro, alguns inclusive que também são temas tangenciados pelos demais Poderes: é de competência do Supremo guardar os direitos garantidos pela Constituição que, no caso do Brasil, é bastante extensa e trata de temas bastante diversos.
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A opinião é compartilhada pelo professor Diego Werneck. Ele pondera que, até final dos anos 90, a atuação junto ao Supremo era mais concentrada nos partidos de oposição e que hoje isso se ampliou. “Esse é um fenômeno que já existe desde os anos 90, só que nos concentramos em partidos da oposição. Então, o PT era o grande motor das ADIN’s (Ação Direta de Inconstitucionalidade) na década de 90. Hoje, de fato, é uma estratégia mais disseminada. Você tem, às vezes, até partidos da base aliada. Não que isso seja um fenômeno novo, mas a gente vê cada vez mais partidos da base aliada levando questões para o Supremo e isso mostra como esse instrumento foi normalizado”, complementa.
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Muito tem se falado sobre ativismo judicial do Supremo ou sobre a suposta politização da Justiça - ou, judicialização da política. Mas, qual a avaliação de juristas sobre esse debate que cresceu nos últimos anos no país, especialmente, nas redes sociais? Algumas dessas decisões acima citadas têm sido questionadas sobre serem ou não posições ativistas do Supremo. No entanto, não há uma definição precisa para o termo, que tem ganhado múltiplos sentidos, e, talvez por isso mesmo, tenha sido preterido pelos juristas.
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