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Morosidade que traz desconfiança, temor e prejuízo político. Meses após serem ameaçadas no e-mail institucional da Câmara Municipal de BH e da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, vereadoras e deputadas cobram mais agilidade das autoridades para colocar atrás das grades os responsáveis pelos crimes. Oficialmente, os órgãos públicos (leia mais abaixo) esclarecem que os fatos são de difícil apuração por serem oriundos de fóruns da dark web, a camada da internet que é acessada por navegadores especiais e serve de palco para discursos preconceituosos.
Ameaçada de morte e estupro em agosto, a deputada estadual Lohanna (PV) anda com escolta da Polícia Militar (PM) diariamente. Ela lamenta a demora das autoridades. “Aquela sensibilização da sociedade está anestesiada. Isso passou. As pessoas esqueceram que aquilo aconteceu. Isso virou uma arma para nos atacar. Somada às ameaças de morte, a gente tem que conviver com a extrema direita instrumentalizando as nossas escoltas para nos atacar. Estão me achincalhando, como se fosse um gasto público desnecessário”, diz.
O uso político das ameaças ganha força com a demora das autoridades. Um vídeo circulado em Divinópolis, na região Centro-Oeste do Estado, questiona a escolta da deputada Lohanna, justamente na cidade onde ela mantém sua base eleitoral. “Eu continuo recebendo ameaças. Só que a Polícia Civil pediu para parar de publicizar, porque mobiliza novas ameaças. Só que isso é meio que ‘o poste mijando no cachorro’. O que motiva novas ameaças é a omissão do Estado, que não resolve a situação. Mas, essa é uma discussão ideológica. Então, decidi acatar para ver se iria resolver”, lamenta a deputada estadual.
A vereadora de BH Cida Falabella (Psol), outra ameaçada em agosto, é mais uma a perceber o uso político da escolta parlamentar diante da demora das investigações. “É inaceitável e mais um sintoma da violência de gênero na política. Esse uso se equipara às próprias ameaças, na medida em que sua intenção é expulsar as mulheres da política. A morosidade das investigações é também lamentável. Dito isso, enfatizo a atuação exemplar da Guarda Municipal com vistas a garantir a nossa segurança”, afirma.
Outra parlamentar do Psol, a deputada estadual Bella Gonçalves diz que a violência política por conta das escoltas já motivou um processo judicial. “Nós recebemos, de atores da extrema direita, formas de ataque questionando a escolta no ano passado. Um desses atores, inclusive, responde a uma ação na Justiça que nós impetramos. É um processo que deve ser julgado em breve", explica a parlamentar.
Ameaçada junto com as correligionárias, a vereadora Iza Lourena (Psol) não percebe o uso político, mas critica a morosidade das apurações. "Infelizmente não temos informações de avanços nas investigações conduzidas pelas polícias Civil de Minas Gerais e Federal. Este ano não identificamos nenhuma nova ameaça, felizmente, mas seguimos com escolta da Guarda Municipal", diz.
Mais de 40 investigações
Vítima frequente de ameaças, a deputada estadual Andréia de Jesus (PT) afirma já ter feito dezenas de boletins de ocorrência para denunciar os crimes. Ela afirma que os casos começaram nas redes sociais, mas se espalharam também pelo e-mail institucional da Assembleia e diretamente no telefone celular dela. "Essas ameaças de morte, mais diretas, até hoje não tiveram avanço (nas investigações). Eu faço boletim de ocorrência sempre que recebo uma ameaça. Já são 42 inquéritos (em andamento ou já finalizados). Alguns desses já se tornaram processos, e a gente já fez umas 10 audiências para tentar um acordo, para que não seja um processo criminal", diz Andréia.
A parlamentar paga um advogado por conta própria só para lidar com esses processos e investigações. Ela afirma que continua recebendo ameaças. Uma delas aconteceu em janeiro, durante o recesso parlamentar da ALMG, que a ameaçava de "estupro corretivo". "Essa ocorrência também foi levada para a Polícia Federal, porque há um entendimento do Ministério Público de que esses casos são nacionais", afirma a petista.
Ameaças podem vir do exterior
O procurador geral de Justiça e chefe do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Jarbas Soares Júnior, afirmou, em entrevista exclusiva ao Café com Política da FM O TEMPO 91,7 em janeiro, que muitas das ameaças contra parlamentares mulheres vêm de criminosos que estão no exterior. “O Ministério Público tem um compromisso com a democracia, as ameaças normalmente são para mulheres de esquerda, de partidos de esquerda, então, nós já sabemos mais ou menos disso. Agora, muitas coisas estão fora do Brasil, localizadas fora do Brasil, e, portanto, as investigações estão acontecendo”, disse.
De acordo com ele, o trabalho do MP de Minas acontece principalmente por meio do Observatório da Democracia de Direitos de Liberdade. “Às claras, é fácil repelir, identificar (os crimes). As (ameaças) do submundo são de difícil detecção. Nos casos concretos, nós já temos investigações, temos uma força-tarefa, nós já avançamos muito nos alvos, e temos o cuidado muito também de não ficar divulgando, porque, principalmente os hackers, eles se tornam heróis dos grupos de internet. A partir da divulgação, eles teriam atingido o alvo”, afirma o procurador geral.
'Violência de gênero naturalizada'
A coordenadora do programa de diversidade e inclusão da Fundação Getúlio Vargas, Yasmin Curzi, destaca que esse tipo de crime reforça práticas de controle de gênero e tentam controlar a expressão de mulheres que ousam adotar posturas e ocupar espaços antes reservados aos homens. “A violência de gênero, a violência contra mulheres, ela é profundamente naturalizada na nossa sociedade, profundamente naturalizada também pelo poder de polícia do Estado juntando tudo, polícias, promotorias e judiciário”, avalia.
Situação que é agravada pela prática no ambiente virtual. “A gente soma dois problemas em um problema só, em um episódio só. Que é tanto a desconsideração da violência de gênero como violência, como a desconsideração da violência online como violência”, destaca a especialista.
Legislação
A primeira legislação estadual de combate à violência política contra a mulher é de Minas Gerais. Um dos destaques da produção legislativa de 2023, a Lei 24.466 nasceu a partir do Projeto de Lei (PL) 2.309/20, assinado pelas deputadas Ana Paula Siqueira (Rede), Andréia de Jesus (PT), Beatriz Cerqueira (PT) e Leninha (PT), as três últimas ameaçadas de morte no exercício do mandato.
O texto define como violência política contra a mulher qualquer ação, comportamento ou omissão, individual ou coletiva, com a finalidade de impedir ou restringir o exercício do direito político pelas mulheres. Também cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher, estabelecendo suas diretrizes e seus objetivos. As deputadas querem, agora, que a lei seja regulamentada pelo Poder Executivo.
Em visita ao Café com Política, da FM O TEMPO 91,7 em 21 de dezembro do ano passado, o deputado estadual Tadeu Martins Leite (MDB), presidente da ALMG, opinou sobre o tema. “Essa legislação foi uma demonstração clara de que o parlamento não aceitará esse tipo de coação. Quando você ameaça um deputado, uma deputada, você está ameaçando a democracia, está ameaçando a sociedade, no caso, mineira. Nós aprovamos essa legislação, fizemos uma força-tarefa com o Ministério Público, Polícia Civil, Polícia Militar e Assembleia", disse.
Outros lados
Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais informou que o inquérito sobre os casos "segue em tramitação". "Outras informações serão repassadas após a conclusão do procedimento investigatório, para não comprometer o andamento do feito", informou.
O Ministério Público Federal (MPF), por sua vez, esclareceu que a Polícia Federal tem um inquérito em aberto a pedido do MPF para apurar "a possível ocorrência do crime". "Esse inquérito ainda está em andamento e dentro do prazo regulamentar para a sua conclusão", informou.
Já o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) esclareceu que seu trabalho acontece em conjunto com a Polícia Civil. "Trata-se de uma investigação complexa, que envolve crimes praticados com técnicas para dificultar a identificação e organizados em ‘chans’ e fóruns da dark web. Portanto, demanda a utilização de técnicas e programas especializados, ordens judiciais e análise de grande quantidade de dados por profissionais capacitados. Isso implica na necessidade de tempo adequado para que a responsabilização penal seja bem sucedida e respeite a legalidade", pontuou. A promotoria lembrou que realizou uma operação em setembro para cumprir mandados contra um investigado pelas ameaças.
Questionada sobre o efetivo deslocado para atender as escoltas das parlamentares, a Polícia Militar apenas informou que "apoia a Assembleia toda vez que é acionada, dentro do seu papel constitucional".
A Câmara Municipal de BH esclarece que o presidente da Casa, vereador Gabriel (sem partido) "restringiu o acesso do público externo às audiências públicas e ao plenário, de forma a garantir a segurança das parlamentares", assim que soube das ameaças. A CMBH tem um termo de cooperação assinado com o MP "para a criação de um canal interinstitucional de denúncias".
Procuradas pela reportagem, a Polícia Federal (PF) e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) não se manifestaram até a publicação da matéria. (Colaborou Hermano Chiodi)
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Ameaçada de morte e estupro em agosto, a deputada estadual Lohanna (PV) anda com escolta da Polícia Militar (PM) diariamente. Ela lamenta a demora das autoridades. “Aquela sensibilização da sociedade está anestesiada. Isso passou. As pessoas esqueceram que aquilo aconteceu. Isso virou uma arma para nos atacar. Somada às ameaças de morte, a gente tem que conviver com a extrema direita instrumentalizando as nossas escoltas para nos atacar. Estão me achincalhando, como se fosse um gasto público desnecessário”, diz.
O uso político das ameaças ganha força com a demora das autoridades. Um vídeo circulado em Divinópolis, na região Centro-Oeste do Estado, questiona a escolta da deputada Lohanna, justamente na cidade onde ela mantém sua base eleitoral. “Eu continuo recebendo ameaças. Só que a Polícia Civil pediu para parar de publicizar, porque mobiliza novas ameaças. Só que isso é meio que ‘o poste mijando no cachorro’. O que motiva novas ameaças é a omissão do Estado, que não resolve a situação. Mas, essa é uma discussão ideológica. Então, decidi acatar para ver se iria resolver”, lamenta a deputada estadual.
A vereadora de BH Cida Falabella (Psol), outra ameaçada em agosto, é mais uma a perceber o uso político da escolta parlamentar diante da demora das investigações. “É inaceitável e mais um sintoma da violência de gênero na política. Esse uso se equipara às próprias ameaças, na medida em que sua intenção é expulsar as mulheres da política. A morosidade das investigações é também lamentável. Dito isso, enfatizo a atuação exemplar da Guarda Municipal com vistas a garantir a nossa segurança”, afirma.
Outra parlamentar do Psol, a deputada estadual Bella Gonçalves diz que a violência política por conta das escoltas já motivou um processo judicial. “Nós recebemos, de atores da extrema direita, formas de ataque questionando a escolta no ano passado. Um desses atores, inclusive, responde a uma ação na Justiça que nós impetramos. É um processo que deve ser julgado em breve", explica a parlamentar.
Ameaçada junto com as correligionárias, a vereadora Iza Lourena (Psol) não percebe o uso político, mas critica a morosidade das apurações. "Infelizmente não temos informações de avanços nas investigações conduzidas pelas polícias Civil de Minas Gerais e Federal. Este ano não identificamos nenhuma nova ameaça, felizmente, mas seguimos com escolta da Guarda Municipal", diz.
Mais de 40 investigações
Vítima frequente de ameaças, a deputada estadual Andréia de Jesus (PT) afirma já ter feito dezenas de boletins de ocorrência para denunciar os crimes. Ela afirma que os casos começaram nas redes sociais, mas se espalharam também pelo e-mail institucional da Assembleia e diretamente no telefone celular dela. "Essas ameaças de morte, mais diretas, até hoje não tiveram avanço (nas investigações). Eu faço boletim de ocorrência sempre que recebo uma ameaça. Já são 42 inquéritos (em andamento ou já finalizados). Alguns desses já se tornaram processos, e a gente já fez umas 10 audiências para tentar um acordo, para que não seja um processo criminal", diz Andréia.
A parlamentar paga um advogado por conta própria só para lidar com esses processos e investigações. Ela afirma que continua recebendo ameaças. Uma delas aconteceu em janeiro, durante o recesso parlamentar da ALMG, que a ameaçava de "estupro corretivo". "Essa ocorrência também foi levada para a Polícia Federal, porque há um entendimento do Ministério Público de que esses casos são nacionais", afirma a petista.
Ameaças podem vir do exterior
O procurador geral de Justiça e chefe do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Jarbas Soares Júnior, afirmou, em entrevista exclusiva ao Café com Política da FM O TEMPO 91,7 em janeiro, que muitas das ameaças contra parlamentares mulheres vêm de criminosos que estão no exterior. “O Ministério Público tem um compromisso com a democracia, as ameaças normalmente são para mulheres de esquerda, de partidos de esquerda, então, nós já sabemos mais ou menos disso. Agora, muitas coisas estão fora do Brasil, localizadas fora do Brasil, e, portanto, as investigações estão acontecendo”, disse.
De acordo com ele, o trabalho do MP de Minas acontece principalmente por meio do Observatório da Democracia de Direitos de Liberdade. “Às claras, é fácil repelir, identificar (os crimes). As (ameaças) do submundo são de difícil detecção. Nos casos concretos, nós já temos investigações, temos uma força-tarefa, nós já avançamos muito nos alvos, e temos o cuidado muito também de não ficar divulgando, porque, principalmente os hackers, eles se tornam heróis dos grupos de internet. A partir da divulgação, eles teriam atingido o alvo”, afirma o procurador geral.
'Violência de gênero naturalizada'
A coordenadora do programa de diversidade e inclusão da Fundação Getúlio Vargas, Yasmin Curzi, destaca que esse tipo de crime reforça práticas de controle de gênero e tentam controlar a expressão de mulheres que ousam adotar posturas e ocupar espaços antes reservados aos homens. “A violência de gênero, a violência contra mulheres, ela é profundamente naturalizada na nossa sociedade, profundamente naturalizada também pelo poder de polícia do Estado juntando tudo, polícias, promotorias e judiciário”, avalia.
Situação que é agravada pela prática no ambiente virtual. “A gente soma dois problemas em um problema só, em um episódio só. Que é tanto a desconsideração da violência de gênero como violência, como a desconsideração da violência online como violência”, destaca a especialista.
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A primeira legislação estadual de combate à violência política contra a mulher é de Minas Gerais. Um dos destaques da produção legislativa de 2023, a Lei 24.466 nasceu a partir do Projeto de Lei (PL) 2.309/20, assinado pelas deputadas Ana Paula Siqueira (Rede), Andréia de Jesus (PT), Beatriz Cerqueira (PT) e Leninha (PT), as três últimas ameaçadas de morte no exercício do mandato.
O texto define como violência política contra a mulher qualquer ação, comportamento ou omissão, individual ou coletiva, com a finalidade de impedir ou restringir o exercício do direito político pelas mulheres. Também cria o Programa de Enfrentamento ao Assédio e Violência Política contra a Mulher, estabelecendo suas diretrizes e seus objetivos. As deputadas querem, agora, que a lei seja regulamentada pelo Poder Executivo.
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Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais informou que o inquérito sobre os casos "segue em tramitação". "Outras informações serão repassadas após a conclusão do procedimento investigatório, para não comprometer o andamento do feito", informou.
O Ministério Público Federal (MPF), por sua vez, esclareceu que a Polícia Federal tem um inquérito em aberto a pedido do MPF para apurar "a possível ocorrência do crime". "Esse inquérito ainda está em andamento e dentro do prazo regulamentar para a sua conclusão", informou.
Já o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) esclareceu que seu trabalho acontece em conjunto com a Polícia Civil. "Trata-se de uma investigação complexa, que envolve crimes praticados com técnicas para dificultar a identificação e organizados em ‘chans’ e fóruns da dark web. Portanto, demanda a utilização de técnicas e programas especializados, ordens judiciais e análise de grande quantidade de dados por profissionais capacitados. Isso implica na necessidade de tempo adequado para que a responsabilização penal seja bem sucedida e respeite a legalidade", pontuou. A promotoria lembrou que realizou uma operação em setembro para cumprir mandados contra um investigado pelas ameaças.
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A Câmara Municipal de BH esclarece que o presidente da Casa, vereador Gabriel (sem partido) "restringiu o acesso do público externo às audiências públicas e ao plenário, de forma a garantir a segurança das parlamentares", assim que soube das ameaças. A CMBH tem um termo de cooperação assinado com o MP "para a criação de um canal interinstitucional de denúncias".
Procuradas pela reportagem, a Polícia Federal (PF) e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) não se manifestaram até a publicação da matéria. (Colaborou Hermano Chiodi)