POLÍTICA EXTERNA

BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu, nesta quinta-feira (8), expulsar a embaixadora da Nicarágua no Brasil, Fulvia Patricia Castro Matu. A decisão foi tomada um dia após ser divulgado que o presidente nicaraguense, Daniel Ortega, mandou o embaixador brasileiro, Breno Souza da Costa, deixar o país da América Central. 

Ortega tomou a decisão após a ausência do representante brasileiro às comemorações dos 45 anos da Revolução Sandinista, celebrado em 19 de julho. O presidente nicaraguense é um ex-guerrilheiro do movimento de esquerda sandinista, que surgiu nos anos 1970. 

O Itamaraty informou que o embaixador não foi ao evento por causa do congelamento das relações diplomáticas entre Brasil e Nicarágua. O governo Lula decidiu congelar as relações por um período de um ano em retaliação à prisão de padres e bispos no país.

 O ditador da Nicarágua enviou o comunicado da expulsão do embaixador brasileiro na noite da última quarta-feira (7). O Itamaraty confirmou a informação e disse que Breno da Costa deixará a Nicarágua ainda nesta quinta-feira. Fulvia Matu será informada de sua expulsão também nesta quinta.

Lula, que foi aliado de Ortega por décadas, decidiu recorrer ao princípio da reciprocidade – algo trivial na diplomacia – após se reunir nesta quinta-feira com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.

Fulvia Matus assumiu a Embaixada da Nicarágua no Brasil em maio deste ano, após o governo brasileiro conceder agrément à diplomata. O gesto significa uma autorização para o representante do país estrangeiro assumir a função.

Daniel Ortega está no poder há 17 anos

Ortega está há 17 anos no poder. Foi reeleito para o quarto mandato em 2021, em pleito que teve a lisura questionado por diversos países. Ortega já havido governado a Nicarágua nos anos 1980, após seu partido, a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), derrubar em 1979 o ditador Anastasio Somoza, no episódio que ficou conhecido como Revolução Sandinista. Os sandinistas governaram Nicarágua até 1990, quando foram derrotados em eleição.

A relação entre Lula e Noriega vem se deteriorando após o petista contrariar seu ex-aliado em diversas ocasiões, durante o seu mandato. Em junho de 2023, o Brasil subscreveu uma resolução da Organização dos Estados Americanos (OEA) que pedia democracia na Nicarágua.

Também em 2023, Lula fez um discurso em Brasília no Foro de São Paulo, aliança de partidos de esquerda da América Latina. O presidente brasileiro mandou diversos recados a Ortega. "Aliado não é aquele que está toda hora agradando e alisando. Muitas vezes o verdadeiro amigo é aquele que diz que você está errado", afirmou Lula na ocasião.

Lula tentou interceder por libertação de bispo católico

O episódio que mais incomodou o presidente da Nicarágua foi a tentativa de Lula em interceder pela liberação de um bispo católico. Lula atendeu a um pedido feito pelo Papa Francisco. 

O ditador nicaraguense ignorou o colega brasileiro e nem sequer respondeu a um pedido de telefonema para tratar do assunto. Após mais de 500 dias detidos, o bispo Rolando José Álvarez foi expulso do país centro-americano em janeiro.

Em entrevista a correspondentes estrangeiros, em julho, em Brasília, Lula falou do descontentamento com o líder sandinista. "O dado concreto é que o Daniel Ortega não atendeu o telefonema e não quis falar comigo. Então, nunca mais eu falei com ele, nunca mais. Ou seja, eu acho que é uma bobagem", disse Lula.

"Quer dizer, o cara que fez uma revolução como o Daniel Ortega fez. Uma revolução. Eu participei do primeiro aniversário daquela revolução. Era um bando de meninas e meninas armados com metralhadoras que derrotaram o Somoza. Mas você faz uma revolução para quê? Faz uma revolução por que você quer o poder ou você faz uma revolução por que você quer melhorar a vida do povo do seu país? É isso que está em jogo". completou o petista.

 Outros bispos e padres foram sequestrados pelo regime da Nicarágua. Nos últimos dias, ao menos 12 sacerdotes foram detidos em uma nova onda de prisões contra religiosos da Igreja Católica na Nicarágua, segundo o Coletivo Nicarágua Nunca Más, ONG de direitos humanos, que atua exilada na Costa Rica.

Daniel Ortega e sua esposa, a vice-presidente Rosario Murillo, alegam que a Igreja apoiou os protestos de 2018 contra o governo, os quais deixaram mais de 300 mortos, segundo a ONU, e que Manágua considera uma tentativa de golpe de Estado patrocinada por Washington.