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O Bolsa Família, uma das principais bandeiras do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), é considerado por muitos especialistas um dos programas de transferência de renda mais bem-sucedidos do mundo. Em breve, deixará de existir e dará lugar ao Auxílio Brasil, novo benefício do governo Jair Bolsonaro (sem partido), que pretende dar uma turbinada nas parcelas e ampliar a base de beneficiados.
O novo programa, que já teve outros nomes, como Renda Brasil e Renda Cidadã, no ano passado, vinha sendo elaborado para desvincular a política social da imagem dos governos petistas. Após o lançamento, no entanto, analistas veem problemas no desenho do Auxílio Brasil, que ainda não tem recursos garantidos na Medida Provisória enviada ao Congresso Nacional nesta última semana. Um dos motivos é a falta de espaço no Orçamento, que, para ser ampliado, depende da aprovação da polêmica Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe o parcelamento de precatórios — dívidas judiciais da União.
O Bolsa Família teve sua origem em programas de transferência de renda do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Logo, foi resultado da fusão de quatro benefícios sociais existentes até então: o Bolsa Escola, o Auxílio-Alimentação, o Cartão-alimentação e o Vale-gás. Em 2003, esses programas foram unidos, por meio do Cadastro Único, que foi a base de dados para os cadastros do auxílio emergencial.
O objetivo do Bolsa Família sempre foi dar auxílio àqueles em situação de extrema pobreza. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em 2019, nos primeiros 15 anos do programa, a iniciativa foi responsável pela redução da pobreza em 15% e da extrema pobreza em 25%. O número de beneficiários passou de 6 milhões de famílias, em 2004, para 13,3 milhões de famílias, em 2017, quando 3,4 milhões de pessoas deixaram a situação de pobreza extrema, e outras 3,2 milhões superaram a pobreza.
Hoje, o programa tem mais de 14 milhões de beneficiários e uma extensa lista de espera. Wanda Engel, secretária de Estado de Assistência Social do governo FHC e figura importante na implementação dos programas sociais na época, explica que, no Brasil dos anos 1990, a assistência era voltada para as consequências da pobreza, como a fome. Era necessário, portanto, dar condições para que os beneficiários pudessem ter uma melhoria de vida, atacando a causa do problema: a renda.
“Veio a concepção de que a pobreza pode ser superada, então, começam programas de transferência de renda da transferência condicionada”, conta. “Ninguém aprende a pescar com fome. Para aprender a pescar, precisa de condições mínimas de garantia de vida, condições básicas. Essas condições são dadas por esses programas. Mas não pode ser só isso, precisa ter frequência na escola, programa de capacitação, saúde”, afirma. Ela aponta que o grande desafio dos auxílios dados à população de baixa renda é garantir a sustentabilidade após a saída da linha da pobreza, evitando que os beneficiários voltem ao ponto de partida. “Isso necessariamente passa pela educação, por toda uma oferta de serviços. A gente precisaria de uma política 2.0, dando conta da extrema pobreza e garantindo a saída com sustentabilidade”, sugere.
Entraves
Para Wanda Engel, a ideia do governo federal de aumentar o número de beneficiários do Bolsa Família no novo programa é boa, mas alerta que, se o programa estiver sujeito ao teto de gastos —emenda constitucional que limita ao aumento de despesas à inflação do ano anterior —, há grandes chances de entraves. “Era preciso um aumento da cobertura, e esse aumento talvez nem atenda a quantidade necessária de famílias. Mas, com o teto de gastos, quanto mais você aumenta a bolsa, menos beneficiados. E vice-versa. É uma relação inversamente proporcional. Agora, o valor pago estava totalmente defasado. Deveria estar em cerca de R$ 415. Qualquer coisa menos do que isso não atenderia às necessidades básicas de uma família”, completa.
José Luis Oreiro, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), destaca a necessidade de auxiliar aqueles que estão abaixo da linha da pobreza. “São pessoas que desempenham atividades não remuneradas ou com baixíssima remuneração e não têm perspectiva de sair dessa situação de pobreza. Isso nos leva à conclusão de que, em um país civilizado, é possível destinar uma parte dos recursos da sociedade para retirá-los da miséria absoluta”, pontua.
Nesse sentido, aponta o professor, o Brasil foi um pioneiro, ao colocar o foco dos benefícios naqueles que estavam em situação de miséria, possibilitando, através das contrapartidas — como a frequência escolar que as gerações seguintes tivessem mais oportunidades. Com os valores sendo revertidos em consumo pelas famílias, o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) é uma consequência natural. “O programa (Bolsa Família) retira muita gente da miséria, gera aumento do PIB e retorna em arrecadação de impostos. É um programa extremamente bem-sucedido, tanto na redução de pobreza quanto no estímulo ao consumo”, comenta Oreiro.
Felipe Queiroz, economista e pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), explica que há um efeito multiplicador dos programas de transferência de renda. “Quando você tem uma política de distribuição de renda, há uma propensão maior de consumo, os recursos retornam ao Estado por meio da economia, que começa a circular, e o efeito multiplicador é total. Esse tipo de política é totalmente positiva e contribui para o desenvolvimento econômico do país”, esclarece. Ele acredita, no entanto, que o Auxílio Brasil, não traz novidades e corre o risco de ser descontinuado por falta de recursos a médio prazo e de, a partir de 2023, ser interrompido por falta de espaço orçamentário.
Medida eleitoreira
O economista Otto Nogami, professor do Insper, também demonstra preocupação com o fato de o programa não ter recursos para ser mantido posteriormente. Ele destaca que, no caso da PEC do parcelamento dos precatórios — que o governo deseja aprovar no Congresso —, haverá recursos a curto prazo para pagar um Bolsa Família mais robusto. Contudo, a situação das contas públicas exige uma atenção maior de longo prazo, com cortes de gastos, exatamente o contrário do que o Executivo está tentando fazer às vésperas das eleições de 2022.
“Essa iniciativa é eleitoral, o governo não teria condições de se aventurar numa coisa dessas hoje”, afirma. O economista opina, ainda, que o novo programa social deveria ter foco em melhorar a vida dos beneficiários como um todo, fornecendo condições para que as famílias possam se sustentar e deixar de ser dependentes do governo. “É preciso um programa de geração de renda, mas o governo só pensa no benefício e pronto. Ele está dando um impulso para aumentar o consumo das famílias, o que infla o PIB, em uma tentativa de criar atalhos para o crescimento econômico”, conclui.
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O novo programa, que já teve outros nomes, como Renda Brasil e Renda Cidadã, no ano passado, vinha sendo elaborado para desvincular a política social da imagem dos governos petistas. Após o lançamento, no entanto, analistas veem problemas no desenho do Auxílio Brasil, que ainda não tem recursos garantidos na Medida Provisória enviada ao Congresso Nacional nesta última semana. Um dos motivos é a falta de espaço no Orçamento, que, para ser ampliado, depende da aprovação da polêmica Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe o parcelamento de precatórios — dívidas judiciais da União.
O Bolsa Família teve sua origem em programas de transferência de renda do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Logo, foi resultado da fusão de quatro benefícios sociais existentes até então: o Bolsa Escola, o Auxílio-Alimentação, o Cartão-alimentação e o Vale-gás. Em 2003, esses programas foram unidos, por meio do Cadastro Único, que foi a base de dados para os cadastros do auxílio emergencial.
O objetivo do Bolsa Família sempre foi dar auxílio àqueles em situação de extrema pobreza. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em 2019, nos primeiros 15 anos do programa, a iniciativa foi responsável pela redução da pobreza em 15% e da extrema pobreza em 25%. O número de beneficiários passou de 6 milhões de famílias, em 2004, para 13,3 milhões de famílias, em 2017, quando 3,4 milhões de pessoas deixaram a situação de pobreza extrema, e outras 3,2 milhões superaram a pobreza.
Hoje, o programa tem mais de 14 milhões de beneficiários e uma extensa lista de espera. Wanda Engel, secretária de Estado de Assistência Social do governo FHC e figura importante na implementação dos programas sociais na época, explica que, no Brasil dos anos 1990, a assistência era voltada para as consequências da pobreza, como a fome. Era necessário, portanto, dar condições para que os beneficiários pudessem ter uma melhoria de vida, atacando a causa do problema: a renda.
“Veio a concepção de que a pobreza pode ser superada, então, começam programas de transferência de renda da transferência condicionada”, conta. “Ninguém aprende a pescar com fome. Para aprender a pescar, precisa de condições mínimas de garantia de vida, condições básicas. Essas condições são dadas por esses programas. Mas não pode ser só isso, precisa ter frequência na escola, programa de capacitação, saúde”, afirma. Ela aponta que o grande desafio dos auxílios dados à população de baixa renda é garantir a sustentabilidade após a saída da linha da pobreza, evitando que os beneficiários voltem ao ponto de partida. “Isso necessariamente passa pela educação, por toda uma oferta de serviços. A gente precisaria de uma política 2.0, dando conta da extrema pobreza e garantindo a saída com sustentabilidade”, sugere.
Entraves
Para Wanda Engel, a ideia do governo federal de aumentar o número de beneficiários do Bolsa Família no novo programa é boa, mas alerta que, se o programa estiver sujeito ao teto de gastos —emenda constitucional que limita ao aumento de despesas à inflação do ano anterior —, há grandes chances de entraves. “Era preciso um aumento da cobertura, e esse aumento talvez nem atenda a quantidade necessária de famílias. Mas, com o teto de gastos, quanto mais você aumenta a bolsa, menos beneficiados. E vice-versa. É uma relação inversamente proporcional. Agora, o valor pago estava totalmente defasado. Deveria estar em cerca de R$ 415. Qualquer coisa menos do que isso não atenderia às necessidades básicas de uma família”, completa.
José Luis Oreiro, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), destaca a necessidade de auxiliar aqueles que estão abaixo da linha da pobreza. “São pessoas que desempenham atividades não remuneradas ou com baixíssima remuneração e não têm perspectiva de sair dessa situação de pobreza. Isso nos leva à conclusão de que, em um país civilizado, é possível destinar uma parte dos recursos da sociedade para retirá-los da miséria absoluta”, pontua.
Nesse sentido, aponta o professor, o Brasil foi um pioneiro, ao colocar o foco dos benefícios naqueles que estavam em situação de miséria, possibilitando, através das contrapartidas — como a frequência escolar que as gerações seguintes tivessem mais oportunidades. Com os valores sendo revertidos em consumo pelas famílias, o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) é uma consequência natural. “O programa (Bolsa Família) retira muita gente da miséria, gera aumento do PIB e retorna em arrecadação de impostos. É um programa extremamente bem-sucedido, tanto na redução de pobreza quanto no estímulo ao consumo”, comenta Oreiro.
Felipe Queiroz, economista e pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), explica que há um efeito multiplicador dos programas de transferência de renda. “Quando você tem uma política de distribuição de renda, há uma propensão maior de consumo, os recursos retornam ao Estado por meio da economia, que começa a circular, e o efeito multiplicador é total. Esse tipo de política é totalmente positiva e contribui para o desenvolvimento econômico do país”, esclarece. Ele acredita, no entanto, que o Auxílio Brasil, não traz novidades e corre o risco de ser descontinuado por falta de recursos a médio prazo e de, a partir de 2023, ser interrompido por falta de espaço orçamentário.
Medida eleitoreira
O economista Otto Nogami, professor do Insper, também demonstra preocupação com o fato de o programa não ter recursos para ser mantido posteriormente. Ele destaca que, no caso da PEC do parcelamento dos precatórios — que o governo deseja aprovar no Congresso —, haverá recursos a curto prazo para pagar um Bolsa Família mais robusto. Contudo, a situação das contas públicas exige uma atenção maior de longo prazo, com cortes de gastos, exatamente o contrário do que o Executivo está tentando fazer às vésperas das eleições de 2022.
“Essa iniciativa é eleitoral, o governo não teria condições de se aventurar numa coisa dessas hoje”, afirma. O economista opina, ainda, que o novo programa social deveria ter foco em melhorar a vida dos beneficiários como um todo, fornecendo condições para que as famílias possam se sustentar e deixar de ser dependentes do governo. “É preciso um programa de geração de renda, mas o governo só pensa no benefício e pronto. Ele está dando um impulso para aumentar o consumo das famílias, o que infla o PIB, em uma tentativa de criar atalhos para o crescimento econômico”, conclui.