Além de investigadores da Polícia Federal e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o tenente-coronel Mauro Cid reclamou, em áudios divulgados pela Veja na noite de quinta-feira (21), do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de que era ajudante de ordens e um dos mais próximos assessores. 

Em um dos áudios, Cid revela mágia com Bolsonaro. Segundo o ex-ajudante de ordens, ele foi o único que teve a carreira no Exército e a vida financeira prejudicada após o início das investigações relativas a epsiódios da gestão de Bolsonaro. 

“Quem mais se f**** fui eu. Quem mais perdeu coisa fui eu. Pensa todo mundo aí. Ninguém perdeu carreira, ninguém perdeu vida financeira como eu perdi. Todo mundo já era quatro estrelas, já tinha atingido o topo, né?”, disse Cid em um dos áudios enviados a um amigo por meio do Whatsapp.

Cid também diz ainda que Bolsonaro ficou milionário com a ajuda de apoiadores, por meio de pedidos de transferência via Pix para pagar multas impostas pela Justiça de São Paulo por falta de máscara durante a pandemia de Covid-19 – as multas acabaram anuladas pelo governador do Estado, Tarcísio de Freitas, aliado de Bolsonaro. A campanha de arrecadação teria rendido mais de R$ 17 milhões. 

“O presidente teve Pix de milhões, ficou milionário, né? Para político é até bom essas p***** porque eles até conseguem se eleger fácil. O único que teve pai, filha, esposa envolvido, o único que perdeu a carreira, o único que perdeu a vida financeira toda fui eu”, desabafou Cid.

O militar ainda reclamou sobre o fato de ser tratado como “traidor” por Bolsonaro, aliados políticos do ex-presidente e eleitores dele. Cid alegou que, se não assinasse um acordo de delação premiada, iria pegar “30, 40 anos de prisão porque eu estou em vacina, eu estou em joia”. 

Ele também afirmou que as investigações vão continuar avançando e todos que estão de certa forma envolvidos vão ser condenados. “Vai entrar todo mundo em tudo. Vai somar as penas lá, vai dar mais de 100 anos para todo mundo. A cama está toda armada. E vou dizer: os bagrinhos estão pegando 17 anos. Teoricamente, os mais altos vão pegar quantos?”. 

O tenente-coronel é figura central das investigações que miram Bolsonaro e seus aliados. Mauro Cid fechou acordo de delação premiada com a PF após ficar preso por 129 dias. Ele foi preso no âmbito da operação que apura a inserção de informações falsas de doses da Covid-19 em cartões de vacinas de familiares dele, de Bolsonaro, da filha do ex-presidente e de dois seguranças. 

Juiz auxiliar ouve Cid nesta sexta-feira

Em função dos áudios publicados por Veja, Mauro Cid deverá ser ouvido nesta sexta-feira (22) pelo juiz instrutor do gabinete de Alexandre de Moraes, relator do inquérito que investiga a suposta tentativa de golpe de Estado e que tem o militar como colaborador.

A PF já levanta a possibilidade de anulação do acordo de delação premiada do tenente-coronel. Desde que fechou o acordo, em setembro do ano passado, ele já prestou seis depoimentos.

Investigadores ressaltam que os depoimentos de Cid são apenas parte do conteúdo de provas contra os investigados. No relatório final do caso, apresentando à PGR e ao STF, a PF apresentou uma série de evidências, que corroboram as declarações de Cid e outras testemunhas. 

Entre elas estão cópias de trocas de mensagens dos investigados, documentos, arquivos de computadores e de celulares, vídeos e comprovantes de entrada e saídas dos locais onde os indiciados estiveram para tratar da suposta trama golpista.

Advogados dizem que áudios são mero ‘desabafo’

Advogados de Mauro Cid disseram que os áudios “não passam de desabafos”. Para a defesa, as declarações, enviadas a um amigo por meio de Whatsapp, “não comprometem a lisura, seriedade e correção” da delação firmada pelo militar com a PF, sob respaldo da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do STF.

“Os referidos áudios divulgados pela revista Veja, ao que parecem clandestinos, não passam de um desabafo em que relata o difícil momento e a angústia pessoal, familiar e profissional pelos quais está passando, advindos da investigação e dos efeitos que ela produz perante a sociedade, familiares e colegas de farda”, dizem os advogados no comunicado.

“Mauro César Babosa Cid em nenhum momento coloca em xeque a independência, funcionalidade e honestidade da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República ou do Supremo Tribunal Federal na condução dos inquéritos em que é investigado e colaborador, aliás, seus defensores não subscrevem o conteúdo de seus áudios”, prossegue a nota.

Por fim, o texto, assinado por todos os advogados de Cid, reforça que “de forma alguma, comprometem a lisura, seriedade e correção dos termos de sua colaboração premiada firmada perante a autoridade policial, na presença de seus defensores constituídos e devidamente homologada pelo Supremo Tribunal Federal nos estritos termos da legalidade”.

O “desabafo” ocorreu após Cid, Bolsonaro e outras 15 pessoas serem indiciadas no inquérito que apura suposto plano de tentativa de golpe de Estado que visava impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para manter o ex-presidente no poder. A trama incluiria a prisão de Alexandre de Moraes.