A indústria mineira deve fechar 2021 com crescimento de cerca de 8%. Essa é a previsão do presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe. Para ele, a retração registrada no setor em abril foi pontual e causada, por exemplo, pelo desabastecimento de peças do segmento automobilístico. 
 
Em entrevista ao Hoje em Dia, Roscoe analisa que discutir a reforma tributária com o país em crise é uma temeridade e pode significar aumento da carga de tributos brasileira, que já é uma das mais altas do mundo. 


Como está o setor industrial em Minas?

Apesar da pequena retração registrada em abril, de 0,9%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa é muito positiva para 2021. 

Os dados do IBGE mostram também uma alta de 32,5% entre abril de 2020 e o mesmo período deste ano...


Estamos em um momento de recuperação que só não foi mais contundente em abril por conta da terceira onda da Covid-19, que impactou alguns setores importantes da nossa economia. Um outro ponto é a falta de peças, principalmente, no setor automobilístico, que apesar de estar vendendo muito bem, está com falta de carros para entregar. O principal problema foi o desabastecimento dos chips de microprocessadores, que impactou de maneira significativa a produção de veículos em Minas Gerais, o segmento que teve o maior decréscimo. Como é uma indústria relevante no Estado, gerou um impacto no número global. Se não fosse o repique da terceira onda e o desabastecimento da cadeia automobilística, o número seria muito mais positivo do que foi registrado em abril. 

Com a pandemia, a indústria foi considerada atividade essencial e não sofreu tanto quanto outros setores, como comércio e serviços. Mas a confiança do empresariado tem caído. A que isso se deve?

O setor considera a pandemia um grande obstáculo a ser vencido. Mas, mesmo diante do cenário do ano passado, que era de tragédia e de muita insegurança, o setor bateu as expectativas, com um pequeno recuo, mas nada muito grave em termos de expectativas que continuam muito positivas. A incerteza se dá, justamente, pela situação da pandemia, mas a economia como um todo vem reagindo muito bem. A economia brasileira está sobressaindo diante da economia internacional, quer dizer, o Brasil está entre as maiores economias em recuperação, perdendo apenas para China e Estados Unidos no desempenho durante a pandemia, ou seja, um desempenho que eu considero extraordinário. 

“Se não fosse o repique da terceira onda da pandemia e o desabastecimento da cadeia produtiva do setor

automobilístico, os números do setor industrial em Minas seriam muito mais positivos do que os vistos em abril” 

 

Commodities como o minério, com demanda enorme da China, estão impulsionando resultados? 

Não é só o minério de ferro, apesar de ser um setor muito relevante, com um impacto enorme na nossa economia. Nós dobramos o preço do minério de ferro do ano passado para este deve aumentar mais. O preço hoje já é maior do que o preço médio das nossas exportações deste ano porque os contratos são de longo prazo. O preço atual não está refletindo na nossa exportação porque essas vendas foram fechadas em contratos anteriores. Ainda temos uma expectativa de crescimento de preço na pauta de exportação do minério de ferro, mas não é só ele. Todo o setor industrial exportador está indo muito bem. A maior parte da balança comercial mineira é de produtos industrializados, e eles estão puxando para cima a economia e há uma expectativa de um crescimento acelerado em função desses fatores macroeconômicos que vêm dinamizando a economia. Um outro setor que vem crescendo muito é o da construção civil. Então, são vários setores importantes e relevantes, do ponto de vista de representatividade na nossa economia, com o desempenho muito acima da média. Temos uma expectativa muito grande na recuperação da economia, lembrando que a comparação é com 2020, um ano reprimido. Eu acredito que a indústria pode alcançar 7%, 8% de crescimento em Minas, não a economia mineira, mas a indústria mineira. 

“O Brasil está se alinhando à taxa de juros dos nossos concorrentes no mercado internacional. Antes, no país, era linha de crédito, agora é taxa de juros versus retorno de investimento, o que permite financiamento da Indústria 4.0”


Na recente comemoração do Dia da Indústria, um dos motes foi a inovação. Muito se comenta sobre a aplicação da Indústria 4.0 para aumentar competitividade e qualidade. Como está esse processo em Minas, atualmente?

A Fiemg montou um centro de Indústria 4.0 em Contagem, uma mini planta totalmente automatizada onde é feito o treinamento dos funcionários das empresas que estão instalando a Indústria 4.0. Também temos 10 minicentros, como esse, em todo o Estado. Os investimentos vêm acontecendo e a expectativa é que várias indústrias vão, de maneira gradual, instalando equipamentos que conversam entre si e conversam com a área de inteligência da empresa, o que caracteriza a Indústria 4.0, ou seja, uma automação da linha de produção ligada com, eventualmente, área comercial, área de fornecimento de suprimentos, ou seja, a empresa estará toda interligada, obtendo informações em tempo real do mercado e direcionando essas informações para o próprio sistema produtivo.

“A Fiemg defende que, se houver a reforma tributária, que ela tenha um limitador do percentual da carga para que, caso a arrecadação ultrapasse as alíquotas definidas, elas sejam recalibradas, ou seja, diluídas no ano subsequente”


Tudo isso é muito dispendioso. Como os empresários podem fazer para financiar essas mudanças?

A baixa taxa de juros tem permitido investimentos que antes eram inviáveis na economia brasileira. Os juros, em um patamar mais baixo, permitem investimentos que geram ganho de produtividade e que se pagam com uma taxa de juros mais racional. O Brasil está se alinhando taxa de juros dos nossos concorrentes no mercado internacional. Antes, no país, era linha de crédito, agora é taxa de juros versus retorno de investimento, o que permite investimentos na automação, na Indústria 4.0, por isso as indústrias estão dando esse salto de tecnologia.

Falando no cenário nacional, como o senhor analisa os debates da reforma tributária?

Apesar do setor produtivo ter demandado a reforma tributária há muito tempo, existe uma certa preocupação. Entendemos que o Estado está muito inchado, déficit nos governos federal, estadual e municipal, e quando há déficit em todas as esferas, a tendência é que eles queiram aumentar a arrecadação. Fazer uma reforma tributária em um momento de crise econômica é uma temeridade! Lembrando que o Brasil já tem uma carga tributária alta e o risco de ela aumentar é muito grande. O Ministério da Economia, na semana passada, já sinalizou que quer mudar o PIS/COFINS de cerca de 9% para 12%. Isso é muito ruim para o consumidor porque é ele que paga os tributos, no final das contas. A reforma tributária está no Congresso, mas o setor entende que primeiro deveria passar a reforma administrativa porque enxugaria o Estado ao longo dos próximos anos. Ela não teria impacto imediato, mas teria um grande impacto nos anos futuros e geraria uma menor demanda por parte do Estado e, dessa forma, seria viável manter a carga tributária atual.`

“Primeiro, é preciso redefinir o tamanho do Estado e aí, sim, alterar a carga tributária que paga esse Estado”

Qual tem sido a postura da Federação nesse cenário?

O que a Fiemg tem defendido é inverter, fazer a reforma administrativa, redefinir o tamanho do Estado e aí redefinir a carga tributária que paga esse Estado. É bom lembrar, mais uma vez, que quem paga o imposto são os consumidores, os impostos estão embutidos nos custos dos produtos, não é o empresário que paga. O empresário só paga o imposto na insegurança jurídica ou imposto de renda pessoa jurídica. Quando se fala em aumento de carga tributária quer dizer que vai tirar dinheiro do consumidor e passar para o Estado. Esse dinheiro que vai para o Estado retorna em quê para a sociedade? Temos uma educação com péssima qualidade, uma saúde sofrível, os serviços do Estado são péssimos. Toda vez que enviamos recursos para o Estado, eles são esterilizados da nossa economia e tiram a dinâmica de potencial de crescimento dessa economia, já que o setor privado é muito mais dinâmico e investe muito, enquanto o Estado não investe nada, ele gasta tudo, e o que faz a economia crescer é investimento. Quanto mais a fatia do Estado cresce, um Estado que não investe, menor fica o potencial de crescimento daquela economia, por isso, para toda a sociedade é muito negativo o aumento da carga tributária, e o Brasil é um país em desenvolvimento com carga tributária de país já desenvolvido. A Fiemg defende que se houver a reforma tributária, que ela tenha um limitador do percentual da carga tributária para que, caso a arrecadação ultrapasse as alíquotas a serem definidas, elas sejam recalibradas, ou seja, diluídas no ano subsequente para manter a carga tributária atual.