Após uma análise preliminar das contas do Estado, a equipe de transição do governador eleito Romeu Zema (Novo) diz ter identificado que os gastos com pessoal cresceram 11% ao ano durante o mandato de Fernando Pimentel (PT). Os aumentos teriam ocorrido mesmo durante o agravamento da crise que levou ao parcelamento de salários dos servidores e ao atraso nos repasses aos municípios. Enquanto isso, a receita de Minas não conseguiu acompanhar nem metade desse ritmo, sufocada pelas despesas com a Previdência.
Segundo a equipe de transição de Zema, a arrecadação total do Estado cresceu apenas 7,2% por ano durante o governo petista — os dados são de janeiro de 2014 até outubro deste ano. Enquanto isso, o pagamento de servidores inativos aumentou 14,2%, o dobro do crescimento da receita.
“Nos surpreendeu que o governo, mesmo em crise, tenha continuado aumentando os gastos de forma irresponsável. Porque, estando em déficit, você não pode insistir em aumentar o volume de despesas de forma arbitrária”, disse o vereador Mateus Simões, coordenador da equipe de transição.
O principal responsável apontado por esse inchaço nas contas públicas é a Previdência, que consome 31% do orçamento anual de Minas, valor oito vezes superior ao investimento em saúde, por exemplo, na casa de 4% ao ano. “Vamos rever esse valor com certeza, porque não é possível investir apenas 4% em saúde. As alternativas e soluções para a Previdência ainda serão apresentadas, mas podemos adiantar que não é possível manter esses valores, prejudicando atendimentos básicos à população para pagar as contas”, avalia Simões.
Além disso, a equipe de transição do novo governo identificou que apenas 35% das obras do Estado foram concluídas até o momento. Ou seja, o novo governador deverá herdar um cenário com ao menos 65% de obras paralisadas por falta de verba.
As análises da equipe de transição têm sido feitas mesmo sem o acesso ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) e ao Sistema Informatizado de Atos de Pessoal (Siasp) –negado pelo governo Pimentel à equipe de Zema.
Para começar o ajuste do Estado, Zema pretende cortar até 90% dos cargos de recrutamento amplo —o que eliminaria até 3,5 mil vagas das atuais 3.963 contratações existentes nesse sistema. Além disso, o governador eleito também promete reduzir, inicialmente, as 21 secretarias para 9.
O balanço financeiro completo do Estado só será apresentado pela equipe de transição no início de dezembro. A Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) foi procurada para comentar os dados da equipe de transição, mas não retornou à reportagem. (L.S.)
Anunciados os secretários da Fazenda e do Planejamento
O governador eleito Romeu Zema anunciou ontem os dois primeiros secretários do futuro governo. Na Fazenda, o responsável será o contador Gustavo Barbosa, de 53 anos, e na secretaria de Planejamento e Gestão quem assumirá é o engenheiro Otto Alexandre Levy Reis, também de 53 anos.
Mineiro de Uberaba, no Triângulo Mineiro, Barbosa foi secretário de Finanças e Planejamento do Estado do Rio de Janeiro durante um dos piores momentos da grave crise que o Estado atravessa. Assumiu em julho de 2016 e pediu exoneração do cargo em janeiro deste ano para trabalhar na iniciativa privada.
Em 2017, presidiu o Fundo de Previdência do Estado do Rio de Janeiro. À época, o Rioprevidência foi alvo de uma ação do Tribunal de Contas da União (TCU) devido a operações supostamente indevidas, que deixaram um débito de R$ 10,5 bilhões nas contas do fundo. Barbosa não foi responsabilizado pelo caso.
À frente da Secretaria de Planejamento e Gestão, Levy Reis, graduado em Engenharia Metalúrgica pela UFMG, tem experiência na iniciativa privada, tendo sido executivo na área de vendas e marketing da Magnesita Refratários, gigante da área da mineração. Será primeira experiência dele no setor público.(L.S.)
Grupo francês compra Zema Petróleo por R$ 500 milhões
A rede de distribuição de combustíveis do governador eleito de Minas Gerais, Romeu Zema, foi vendida ao grupo francês Total, em uma transação avaliada em R$ 500 milhões. O anúncio da venda foi feito ontem e, segundo a assessoria do Grupo Zema no Brasil, o negócio faz parte da estratégia da empresa em “focar a atuação em seus demais segmentos de negócios, entre eles o varejo”.
A Zema Petróleo é constituída por rede de 280 postos de serviço, além de instalações para armazenamento de etanol. A maioria dos investimentos do grupo está em Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.
O Grupo Zema atua em diversas frentes, como varejo de móveis, eletrodomésticos e vestuários, concessionárias de veículos e empréstimos financeiros. em 2017, faturou R$ 4,4 bilhões. Somente a Zema Petróleo fechou 2017 com R$ 2,5 bilhões de arrecadação, quase a metade do faturamento total do grupo. (L.S.)
Caos nas finanças do Estado será desafio para o governo
Com rombo estimado em pelo menos R$ 11,4 bilhões para 2018, o déficit da Previdência de R$ 8 bilhões no primeiro semestre e dívida de R$ 10 bilhões com as prefeituras em repasses atrasados, as contas de Minas não fecham e mostram-se o maior desafio para o próximo governo.
A folha de pagamento do funcionalismo é um gargalo. Especialistas ouvidos pelo Hoje em Dia não escondem que o trabalho para equacionar o caixa será hercúleo, mas apontam algumas possíveis saídas para a crise. Muitas, impopulares. Entre elas, a exoneração de servidores efetivos.
A possibilidade, descartada pelo governador eleito Romeu Zema, foi aventada pelo presidente do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), Cláudio Terrão, em entrevista ao Hoje em Dia, e estaria calcada na Constituição.
Outro caminho apontado é o aumento da contribuição previdenciária dos funcionários como forma de diminuir o rombo, proposta que chegou a tramitar na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), mas que foi retirada da pauta.
Segundo levantamento feito pela Secretaria de Estado da Fazenda (SEF-MG) a pedido do Hoje em Dia, nos últimos oito anos (de 2010 a 2018), o número de servidores ativos diminuiu 8,6% em Minas (passando de 365 mil para 334 mil), enquanto, no mesmo período, os inativos cresceram impressionantes 41,3%, saltando de 156 mil para 221 mil.
E o buraco tende a ficar maior. Pesquisa divulgada neste ano pelo IBGE mostra que Minas tem mais de 290 mil pessoas acima de 60 anos. Segundo projeção, o Estado terá a maior população idosa do Brasil até 2060. A expectativa é a de que, dentro de quatro décadas, um em cada três mineiros tenha mais de 65 anos.
Para o especialista em Finanças Públicas Fabrício Augusto de Oliveira, para diminuir o gasto com pessoal é necessário fazer uma limpeza geral, começando pelos cargos comissionados, que, segundo a Secretaria de Planejamento do Estado, somam 3.981 pessoas.
“O recrutamento amplo tem que ser o primeiro a ser limpo. Os outros têm uma certa proteção legal, mas, se o rombo aumentar, é possível que sejam realizados cortes de concursados também”, diz.
O especialista refere-se ao artigo 169, parágrafo 4º da Constituição Federal, que permite a demissão dos efetivos caso o Estado passe por dificuldades financeiras que o implique na Lei de Responsabilidade fiscal.
A medida é válida apenas em último caso. Os comissionados, por exemplo, devem ser cortados antes. E mais: o texto da Constituição estabelece que fica “vedada a criação de cargo, emprego ou função com atribuições iguais ou assemelhadas pelo prazo de quatro anos”.
Além dos entraves burocráticos, o remédio amargo respinga na imagem do gestor que adotar essa decisão. “Essas medidas são difíceis de passar porque mexem com os interesses de um grupo muito grande. Mas quando a vaca estiver indo para o brejo não vai ter saída popular. Só impopular mesmo”, pondera Oliveira.
No Norte de Minas, a prefeita de Bocaiúva, Marisa Alves (MDB), tentou exonerar cerca de 250 funcionários que foram empossados no apagar das luzes de 2015, antes de ela assumir. Na época, a prefeita alegou que os gastos com o pessoal recém-contratado não caberiam no orçamento, e abriu procedimento administrativo para apurar irregularidades nos trâmites do processo. O Ministério Público (MP) interveio e os efetivos voltaram ao trabalho.
“O MP entendeu que os funcionários não deveriam ser penalizados e impediu a exoneração. Para que as contas fechassem, precisei acabar com secretarias, demitir guardas que cuidavam de escolas e tirar a gratificação dos comissionados”, pontua. (T.M.)
Aumento da contribuição do servidor público é alternativa
Uma medida impopular, mas também possível, é o aumento da contribuição do servidor público, que hoje é de 11%. Projeto nesse sentido chegou a ser protocolado pelo deputado Alencar da Silveira Júnior (PDT) no último dia 6. Nele, o parlamentar propunha elevar a contribuição para quem ganha mais de R$ 10,5 mil, o teto do governador.
Após uma semana de críticas do funcionalismo, o parlamentar decidiu tirar o texto de tramitação. Isso, no mesmo dia que o Sindicato dos Servidores da Justiça de Primeira Instância (Serjusmig) conseguiu mandado de segurança para suspender o trâmite da matéria.
No projeto, Alencar propõe que haja um aumento progressivo de 2 pontos percentuais na contribuição a cada R$ 3 mil que exceda os R$ 10,5 mil. O incremento na alíquota seria limitado a 21%.
A presidente do Serjusmig, Sandra Silvestrini, afirma que o projeto é uma tentativa de confiscar o salário do trabalhador. “O Imposto de Renda já consome muito do salário. Se o projeto passar, vamos contribuir com 50% da renda”, critica.
Além disso, ela ressalta que nenhum cálculo atuarial foi realizado. “Não sabemos quanto esse projeto vai economizar no caixa do governo ou se ele vai economizar”, diz.
Alencar, por outro lado, afirma que o projeto foi mal interpretado pelos servidores. “Quem ganha mais tem que pagar mais. Isso valeria para funcionários da Assembleia, que ganham R$ 30 mil, por exemplo. E, numa segunda etapa, queremos diminuir de 11% para 5% a contribuição de quem ganha até R$ 3 mil”, explica.
Na avaliação do pesquisador da Fundação João Pinheiro (FJP), Reinaldo Carvalho de Morais, mesmo quando a receita patina, fica difícil cortar as despesas. O motivo é que a maior parte dos gastos dos estados é engessada.
“Folha salarial, por exemplo, responde por grande parte dos orçamentos e é praticamente fixa. Os gestores costumam cortar as obras públicas, mas isso afeta o desenvolvimento das cidades e o emprego”, afirma. (T.M.)