Marte tem visita: o robô explorador Perseverance, da Nasa, pousou na superfície do planeta vermelho no dia 18 do último mês. O nome da missão, que em português significa "perseverança", sempre esteve presente na vida de um dos seus principais engenheiros, o mineiro Ivair Gontijo. Do interior de Minas à Nasa, o físico contou um pouco da sua trajetória até a agência americana e da sua participação na construção do robô que agora desbrava o planeta vermelho ao Hoje em Dia.
 

Natural de Moema, uma cidade de 7 mil habitantes no interior de Minas Gerais, e filho de uma família numerosa e simples, ele estudou a vida toda em escola pública. "Sempre gostei muito de estudar, desde criança. Nessa época, ainda não tinha planos de trabalhar na Nasa. Acho que ninguém tinha dito para a gente que poderíamos ter sonhos assim". lembra.


Com muita dedicação, o garoto do interior virou cientista. Depois de se formar em um colégio agrícola aos 18 anos, conseguiu passar no vestibular e obteve o diploma de graduação e mestrado em Física pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Na carreira acadêmica, conquistou o título de doutor em Optoeletrônica no Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade de Glasgow, na Escócia, e dois pós-docs: um na Universidade Heriot-Watt, em Edimburgo, e outro na UCLA, a Universidade da Califórnia, em Los Angeles.

Ivair construiu uma carreira dedicada às pesquisas científicas no Brasil e no Mundo, ingressando na Nasa em 2006. Hoje, trabalha na base de Jet Propulsion Laboratory (JPL), um dos principais laboratórios da agência americana em Los Angeles, nos Estados Unidos.

"Meu caminho até a Nasa foi longo, tão longo que deu até um livro. Eu conto toda a minha trajetória em A caminho de Marte: A incrível jornada de um cientista brasileiro até a NASA, que foi campeão do prêmio Jabuti de livro de Ciências em 2019. Além da minha história, falo também de como projetar, construir, lançar e operar um veículo em outros planetas", conta.


O cientista ainda incentiva as pessoas a não desistirem dos seus sonhos. Segundo ele, para conquistá-los pode levar  tempo, e é preciso muito foco e trabalho: "Quando a gente é jovem, tem foco, paciência e trabalha muito, quase tudo é possível. Se até eu consegui o meu, conquistar seus próprios sonhos está ao alcance da maioria das pessoas. Mas a gente tem que tentar de tudo, e ajudar a sorte para que as coisas aconteçam. Coisas boas sempre acontecem na nossa vida se tentamos de tudo e insistimos", aconselha.

Entrada na Nasa

Quando entrou para a Nasa, Ivair trabalhou com lasers, sua área de especialidade. Mas, uma semana depois, descobriram que ele tinha experiência em fabricação de equipamentos com micro-onda, e foi atribuída a ele a liderança da construção dos componentes que são o coração do radar que controlou o pouso do Curiosity em Marte em 2012. O brasileiro liderou o grupo que construiu os transmissores e receptores do robô.

Reprodução/Arquivo Pessoal / N/A
Ivair ao lado do rover Curiosity
O curioso é que a cópia desse radar foi usada novamente, agora no pouso do Perseverance, onde ele não estava ligado ao pouso, e sim, a um dos instrumentos.

Perseverance 

O Perseverance é o maior robô já enviado para o espaço e foi lançado em julho de 2020. O pouso foi no último dia 18, e ele tem a missão de percorrer a cratera de Jezero por dois anos em busca de vestígios microbiológicos de vida no passado.

Reprodução/NASA 

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Robô Perseverance enviado a Marte

 

Participação no robô

Ivair conta que trabalhou por cinco anos em um instrumento de medição óptica a laser para analisar a composição das amostras que forem coletadas no planeta vermelho chamado SuperCam: “Parte desse instrumento vai no mastro do veículo, como se fosse a cabeça dele. Ele contém um laser de alta potência e faz medidas das rochas e dos minerais marcianos, disparando pulsos de laser nessas rochas para analisar quais elementos químicos compõem as mesmas, e como elas se combinam para formar minerais”, explica.

A pandemia da Covid-19 e o lançamento

O engenheiro conta que pandemia de Covid-19 influenciou muito no projeto. “Ninguém esperava que a gente fosse terminar no meio de uma pandemia. Então, desde março do ano passado, a maioria de nós está trabalhando de casa, e a gente só vai ao laboratório quando é essencial”, explica. Mais de mil pessoas trabalharam no projeto e ninguém foi contaminado, apesar dos encontros que ocorriam mensalmente.

Ivair ainda conta que para “testar a perseverança” de todos, além da pandemia, no dia 30 de julho, 20 minutos antes do lançamento do Perseverance, ocorreu um terremoto na Califórnia de 4,5 de magnitude: “As telas do meu computador começaram a pular pela mesa. Mas apesar disso, tudo correu bem”, comemora.


Expectativas por busca de vida marciana e expedições em Marte

O cientista acredita ser improvável a descoberta de vida em Marte. “Se a gente achar vida em Marte, ou se descobrir que houve no passado, provavelmente será vida bacteriana, ou colônias de bactérias. Então é isso que vamos estar procurando”, diz.

Mesmo assim, ele acredita que seja uma descoberta muito profunda. “Descobrir se vida se formou em outro planeta que não seja a Terra quer dizer que existe vida para todo lado no universo”, afirma.

 

(*) Estagiária, sob supervisão de Renato Fonseca