Terreno fértil para a produção de cachaças e cafés especiais, o Brasil vem se destacando também na fabricação de vinhos finos. A façanha, resultado do empenho de seis estados, incluindo Minas, tem relação direta com uma tecnologia desenvolvida em solo mineiro e que altera o ciclo das vinhas. O próximo passo é elaborar uma marca coletiva, uma identidade, e partir para a denominação de origem.
Coordenador do Programa Estadual de Pesquisa em Vitivinicultura da Epamig, Murillo de Albuquerque Regina explica que o cultivo de uvas de alta qualidade só foi possível com a inversão do ciclo da fruta, ou seja, em vez de a colheita ser realizada no verão, quando as chuvas são intensas e interferem no sabor e no aroma, colhe-seno inverno.
“Dias ensolarados, noites frias e solo seco criam condição fisiológica ideal para que a planta amadureça com qualidade. As frutas concentram açúcar e álcool e consequentemente possibilitam a produção de vinhos de qualidade, com boa estrutura e capacidade de envelhecimento”, detalha.
Vinhos finos são aqueles produzidos com uvas europeias; os comuns são oriundos da América do Norte
Duas vezes
Atualmente, mais de 20 empresas brasileiras – dentre mineiras, paulistas, cariocas, capixabas e goianas – empregam a técnica desenvolvida pelo engenheiro agrônomo, que viveu 12 anos na França. Na prática, o trabalho consiste em realizar uma primeira poda em agosto, quando ramos frutíferos são produzidos, mas abortados, e uma segunda em janeiro, época em que a maturação é reiniciada com colheita prevista para junho e julho.
O método cria condições favoráveis para a produção de vinhos considerados finos, que poderiam concorrer em igualdade com os melhores rótulos engarrafados no mundo, a exemplo dos franceses.
Prova disso são prêmios já conquistados em concursos nacionais e até estrangeiros por vinícolas que utilizam a técnica. Das quatro premiadas, duas localizam-se em Minas – Maria Maria, de Três Pontas, e Primeira Estrada, de Três Corações.
200 hectares é a área plantada no Brasil e que utiliza o método da epamig para produzir uvas de melhor qualidade e, portanto, vinhos finos
Pequena escala
Ainda fabricados em pequena escala e distribuídos somente no mercado nacional, os vinhos custam entre R$ 150 e R$ 200.
A expectativa para os próximos anos é a de aumento de produção e de criação de um selo que possa unificar e, atestar a qualidade dos “vinhos de inverno”, como vêm sendo chamados. “Acredito que daqui a cinco anos teremos mais marcas chegando ao mercado e que o volume de produção aumente. Em pouco tempo teremos constituído um polo de referência na produção de vinhos finos de qualidade”, diz Murillo, fundador e presidente da Associação dos Produtores de Vinhos de Inverno (Aprovin).
A Epamig também desenvolve pesquisas, todas com apoio da iniciativa privada, para traçar o perfil das variedades de uva plantadas. A ideia é normatizar a produção.
Rótulos engarrafados em Caldas faturam prêmio internacional
Elaborados com uvas plantas no interior paulista e engarrafados com tecnologia da Epamig, em Caldas, no Sul de Minas, três rótulos da Casa Verrone, vinícola já premiada em outras ocasiões, levaram, no início deste mês, medalhas de ouro e grande ouro na edição brasileira do Concurso Mundial de Bruxelas.
Os brancos Casa Verrone Sauvignon Blanc (2017) e Casa Verrone Chardonnay Speciale (2016) conquistaram medalhas de ouro. Já o tinto Casa Verrone Syrah Speciale (2016) faturou a medalha grande ouro – um dos prêmios mais importantes da competição. A premiação, realizada em Pernambuco, utiliza critérios da Organização Internacional da Vinha e do Vinho e do Concours Mondial de Bruxelles The United Nations of Fine Wines.
10 vinícolas sediadas em Minas e que utilizam a técnica da dupla poda já possuem rótulos disponíveis no mercado nacional
Localizada em São José do Rio Pardo, no interior de São Paulo, onde mantém 12 hectares de sete qualidades de uvas – chardonanay, sauvignon blanc, pinot noir, syrah, viognier, cabernet sauvignon e cabernet franc –, a vinícola engarrafa os rótulos no Campo Experimental da Epamig de Caldas, no Sul de Minas, onde se beneficia da técnica da dupla poda.
Proprietário da empresa, Márcio Verrone diz que o próximo passo é tornar-se independente para engarrafar, expandir o alcance em território nacional e aumentar a coleção de prêmios. Há nove anos, a Casa Verrone plantou as primeiras videiras e, há oito, engarrafou o primeiro rótulo.
"Quando tínhamos três meses de empresa, conquistamos o prêmio de melhor nacional em uma premiação realizada no Rio de Janeiro. Foi um passo muito importante para colocar nossa cara no mercado. Agora, queremos ter independência para engarrafar sozinhos e expandir mercado”, afirma.
Este ano, a vinícola se inscreveu no Decanter World Wine Awards, maior e mais importante concurso internacional de vinhos, na Inglaterra. O vencedor será conhecido em junho.
Rótulos de outras três vinícolas – uma paulistana e duas mineiras –, que usam a tecnologia da dupla poda, também já foram premiados em concursos do segmento.