O governo de Portugal anunciou na segunda-feira, 3, mudanças na legislação sobre estrangeiros que querem morar no país a trabalho. As alterações têm o objetivo de dificultar a permanência legal de estrangeiros e atingem também os brasileiros, embora haja promessa de que nascidos nos nove países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) terão preferência na obtenção de vistos.

As regras para os demais tipos de vistos, para estudantes ou aposentados, por exemplo, continuam as mesmas.

A restrição na concessão de vistos de trabalho já era esperada e foi debatida durante a campanha eleitoral legislativa que resultou na eleição de Luís Montenegro para primeiro-ministro de Portugal, em março. Ele é líder de uma coalizão de centro-direita que começou a governar o país europeu há dois meses, após nove anos de governo de esquerda.

Restrições à entrada de estrangeiros são uma bandeira frequente da direita, e no caso de Portugal existe um problema concreto: o aumento significativo de estrangeiros que moram no país, mas não têm emprego e chegam até a viver em situação de vulnerabilidade, dependendo de auxílio do governo. Esse público foi atraído por uma regra instituída em 2017 e revogada nesta segunda-feira: o estrangeiro que estava em Portugal ilegalmente podia legalizar sua permanência bastando manifestar seu interesse em ficar no país e a disposição de procurar trabalho.

Outra regra, instituída em 2019 e também revogada agora, criou mais uma possibilidade de regularização: o estrangeiro ilegal que contribuísse por um ano com a Previdência Social poderia solicitar a permanência em Portugal, independentemente de outros fatores.

"Com estas alterações (de 2017 e 2019) admitiu-se, de forma clara, a possibilidade de qualquer cidadão estrangeiro permanecer em território nacional, ainda que tenha entrado de forma irregular no país", afirma a justificativa do decreto-lei proposto pelo governo e aprovado nesta segunda-feira pelo Conselho de Ministros.

"O impacto destas alterações fez-se sentir de imediato, uma vez que se verificou um crescimento exponencial dos pedidos de legalização por esta via que, infelizmente, são em larga medida um instrumento utilizado por redes de criminalidade ligadas ao tráfico de seres humanos e ao auxílio à imigração ilegal", segue o texto.


"Hoje é evidente que estas alterações contribuíram para um perverso efeito de chamada, dado que abriram caminho para determinados circuitos migratórios com promessas de entrada e regularização num Estado-Membro da União Europeia de migrantes em situação irregular, propiciando, muitas vezes, condições de vulnerabilidade."

Essas duas regras geraram um aumento significativo dos pedidos de visto: hoje, segundo o governo português, existem 400 mil processos de legalização aguardando análise.

Agora, estrangeiros que queiram morar em Portugal a trabalho devem primeiro pedir visto de trabalho ao consulado de Portugal em seu país de origem. Só depois de obter o visto é que eles poderão entrar legalmente em terras lusitanas.

Essa regra vale para os brasileiros também. Para quem já está em Portugal e tem visto, nada muda. As regras também não se alteram para quem está no país europeu e já deu entrada no pedido. Neste caso, o pior que pode acontecer é o pedido ser recusado e a pessoa ter que deixar o país, mas isso não decorre da mudança instituída nesta segunda-feira.

"O decreto é expresso: no item 2 do artigo 3º, (prevê) que não vai afetar essas pessoas. Todo mundo que deu entrada (no pedido de visto) até esta segunda-feira não terá qualquer tipo de impedimento na continuidade do seu processo", afirma Luiza Costa Russo, advogada e diretora de operações da Gioppo & Conti, consultoria especializada na obtenção de cidadania italiana ou portuguesa.

"Já os brasileiros que estão em Portugal e ainda não iniciaram o processo de legalização pela via do trabalho são afetados diretamente", alerta a advogada.

Pelas novas regras, a pessoa terá de sair do país e pedir o visto ao consulado português em seu país de origem, e só poderá entrar em Portugal após obter o documento.

"Os brasileiros que querem morar em Portugal (com visto de trabalho) e ainda não foram, podem fazer isso iniciando o procedimento num consulado", afirma Luiza. Obtido o visto, a pessoa pode ingressar legalmente no país europeu.

O benefício aos brasileiros e demais integrantes de países de língua portuguesa está na promessa de que os pedidos de visto apresentados aos consulados desses países vão tramitar mais rápido do que em outras nações. A língua em comum e a proximidade cultural também podem beneficiar essas nacionalidades, facilitando os vistos em detrimento dos demais países.

 

Estadão Conteúdo