Washington
A batalha em que se viu imersa desde junho do ano passado no restaurante Red Hen, localizado em uma pequena cidade rural da Virgínia, não estava no cardápio. Depois que a gerente local pediu à porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, que deixasse o estabelecimento por trabalhar para um Governo que não atendia aos "padrões básicos da humanidade", um exército de trumpistas enfurecidos partiu para o ataque: ameaças de morte, milhares de resenhas negativas no Yelp (aplicativo de avaliação de estabelecimentos comerciais), cartões-postais manchados de excrementos ou reservas para clientes que nunca apareciam faziam parte do panorama que Stephanie Wilkinson teve que enfrentar. Quase um ano após o episódio que mostrou a polarização política nos Estados Unidos – na época, especialmente, pela medida da separação de famílias sem documentos na fronteira –, Wilkinson publicou uma carta no The Washington Post para descrever o que enfrentou nesses meses. O texto, apesar dos ataques, revela algo de positivo.
A expulsão de Sanders do restaurante em Lexington abriu um debate sobre o direito das pessoas de comer no lugar que escolhem, versus o direito de os gerentes decidirem a quem servir. O debate na mídia levou o mesmo tempo para irromper que para desaparecer. No entanto, na pequena cidade o assunto ficou longe de resolvido. A gerente, de acordo com a carta publicada na terça-feira, 14, configurou os filtros de seu e-mail, restaurou suas configurações de privacidade no Instagram e bloqueou ligações em seu telefone. Mas uma dúvida ainda a angustiava: “Qual a possibilidade de que o cara que estava me enviando uma mensagem de texto de Minneapolis estivesse realmente vindo para a cidade para pôr fogo no nosso restaurante? Era impossível saber", afirma na carta.
Quando a mulher conseguiu afastar os inimigos de suas redes sociais, começaram a chegar cartas a sua casa. No começo, era um punhado que cabia na caixa de correio. Mas com o passar dos dias foram aumentando, até que o entregador de correspondência começou a deixar grandes sacolas plásticas cheias de correspondências e pacotes do lado de fora da porta. "Olá, intolerantes, psicopatas, socialistas e com desafios intelectuais! Seu suposto negócio está em perigo. Tenha a certeza de que isso não é uma ameaça, mas simplesmente uma advertência que prevê sua queda (...). A propósito, nós somos muitos mais do que vocês”, dizia uma das mensagens. No entanto, a responsável pelo Red Hen começou a se dar conta de um detalhe: “Para cada mensagem de ódio havia uma de gratidão”.
Ela diz que recebeu mais de 4.000 cartas. Enquanto alguns algumas a acusavam de não aceitar a derrota de Hillary Clinton em 2016, outras a parabenizavam por aquela ação perante um Governo que havia reduzido seus benefícios sociais. "Para cada desejo de que nosso negócio tivesse uma morte dolorosa, havia uma nota de um dólar, um generoso cheque ou um cartão-presente", diz Wilkinson na carta publicada pelo jornal norte-americano. Além disso, depois de ter fechado o local por dez dias após o episódio, os clientes chegaram aos montes. O restaurante e o vale de Shenandoah, no qual está localizado, receberam viajantes de todas as partes que ficaram sabendo de sua existência por causa da expulsão da porta-voz da Casa Branca.
Wilkinson enfatiza que as demonstrações de apoio não só favoreceram o restaurante, que está se saindo melhor do que nunca, como também a cidade da Virgínia. "Os apoiadores enviaram milhares de dólares em doações para nosso banco de alimentos ou o abrigo para vítimas de violência doméstica na região", diz ela. A ocupação no setor de hotelaria e as vendas no comércio aumentaram, assim como a renda das instituições beneficentes de Lexington. "É possível que nossos inimigos tivessem acreditado que "eles” eram mais do que “nós”, mas acontece que temos mais do que o suficiente para continuar cozinhando", conclui a gerente do Red Hen.