Cidade Do México  


Um plano rocambolesco envolvendo ex-soldados das forças especiais dos Estados Unidos, militares dissidentes do chavismo, uma agência de segurança com sede na Flórida e um contrato para ingressar na Venezuela e tirar Nicolás Maduro do poder. Esses ingredientes compõem o relato de um dos militares detidos na tentativa de incursão marítima desbaratada no domingo passado em La Guaira, o porto que atende Caracas. Segundo a versão governamental difundida nesta quarta-feira pelo próprio mandatário em uma entrevista coletiva, esse desembarque era o começo de uma missão que buscava tirar o sucessor de Hugo Chávez do país.

Nessa operação, batizada de Gedeón, pelo menos oito pessoas morreram e vários militares venezuelanos foram detidos, além dos dois cidadãos norte-americanos. O líder chavista mostrou o vídeo de um interrogatório feito pelas forças de segurança do regime em que um dos acusados, Luke Denman, ex-integrante das forças especializadas em operações táticas, afirma que seu objetivo era assumir o controle do aeroporto de Maiquetía e levar o presidente para os Estados Unidos. Maduro disse que ambos serão julgados na Venezuela e anunciou que solicitará a extradição de outro norte-americano, Jordan Goudreau, ex-boina verde que assumiu ter coordenado a operação.


“Havia três pequenos grupos. Ao todo eram entre 60 e 70 homens, 20 pessoas por grupo”, disse Denman na gravação. “Eu deveria garantir o controle do aeroporto para que pudéssemos fazer uma transferência segura de Maduro até o avião", acrescenta. Sua tarefa consistia em dominar as comunicações das torres de controle para que os aviões pudessem aterrissar em Maiquetía, que se encontra perto das praias de Macuto e Chuao, onde houve as tentativas de incursão.

A tese defendida pelo chavismo se baseia em um documento segundo o qual uma companhia de segurança norte-americana chamada Silvercorp, dirigida por Goudreau, assumia explicitamente o objetivo de derrubar Maduro. Nesse suposto contrato aparece o nome de Juan Guaidó, mas o líder da oposição sempre negou estar envolvido no plano, assim como os Governos dos Estados Unidos e da Colômbia, aos quais Caracas atribui a operação. Essas acusações não são novas. Há um mês, Clíver Alcalá, ex-general chavista dissidente que se radicou na Colômbia antes de se entregar às autoridades dos EUA, que por sua vez o implicaram numa investigação internacional contra o narcotráfico, acusou Guaidó de participar de uma conspiração para derrubar Maduro que, segundo sua versão, estaria sendo organizada na Colômbia.

Alcalá falou depois da apreensão de um arsenal de armas durante uma blitz de trânsito rotineira. "Pertenciam ao povo venezuelano no marco de um pacto ou de um convênio assinado pelo presidente Guaidó, o senhor J. J. Rendón, o senhor Vergara e assessores norte-americanos. Há muitos meses estamos trabalhando na formação de uma unidade [que dê] liberdade à Venezuela”, disse então, em referência ao consultor Juan José Rendón e a Sergio Vergara, dirigente do partido Vontade Popular. Também afirmou que o líder oposicionista Leopoldo López estava a par da operação, assim como Iván Simonovis, hoje colaborador de Guaidó e até o ano passado um dos presos políticos mais antigos da Venezuela.

Tanto a oposição como as autoridades norte-americanas e colombianas negam estar por trás do plano, embora todos continuem comprometidos com a saída de Maduro do poder, o começo de uma transição e a realização de eleições livres. Maduro disse que seu Governo levará o caso ao Tribunal Penal Internacional (TPI) de Haia e ao Conselho de Segurança das Nações Unidas.

“Vamos ao TPI, vamos ao Conselho de Segurança da ONU. Dei instrução direta ao chanceler e ao professor Samuel Moncada [embaixador de Caracas nas Nações Unidas] para que preparemos uma denúncia contundente”, acrescentou. Nesse tribunal, que julga crimes de guerra e contra a humanidade, já há uma ação movida por seu Governo contra Washington, mas também está registrada uma queixa, apresentada por cinco países latino-americanos, contra o próprio Maduro por “graves violações dos direitos humanos”. O dirigente bolivariano acusa diretamente Donald Trump e o presidente colombiano, Iván Duque, de terem apoiado a incursão marítima e de liderarem os esforços de acabar com o chavismo. Prometeu apresentar “um conjunto de relatórios, com vídeos e correspondentes contratos, sobre esta agressão dos Estados Unidos”.