BELO HORIZONTE

Um pastor de Belo Horizonte que foi obrigado por uma igreja evangélica a realizar uma vasectomia receberá R$ 95 mil de indenização por danos morais, segundo decisão da Décima Primeira Turma do TRT-MG. O desembargador Antônio Gomes de Vasconcelos, relator do caso, também reconheceu o vínculo de emprego entre o pastor e a instituição religiosa.

De acordo com a decisão, a imposição da cirurgia viola direitos constitucionais, como o planejamento familiar e a liberdade individual. Testemunhas confirmaram que a vasectomia era exigida pela igreja para pastores solteiros antes do casamento. Uma delas relatou arrependimento pelo procedimento e afirmou que a cirurgia era obrigatória três meses antes do casamento, para não ser rebaixado de cargo. A igreja custeou o procedimento com R$ 700,00 pagos a um clínico geral.

O pastor declarou ter sido coagido a realizar a cirurgia antes dos 30 anos de idade, sob pena de punição por indisciplina. Ele alegou que a exigência da igreja representou intervenção em sua vida privada, caracterizando dano moral indenizável, com base no artigo 226, §7º, da Constituição Federal. 

O exame médico juntado aos autos, realizado em 26/8/2021, comprovou azoospermia, ausência de espermatozoides, confirmando a realização da vasectomia. Para o desembargador, o valor de R$ 95 mil é adequado e proporcional, considerando a gravidade da conduta, que caracteriza ingerência indevida na vida pessoal do pastor e violação de preceitos constitucionais sobre planejamento familiar e autodeterminação.

Vínculo de emprego reconhecido

Além da indenização, o TRT-MG manteve o reconhecimento do vínculo de emprego entre o pastor e a igreja. A instituição havia alegado que não existia relação empregatícia, pois a atuação do pastor teria caráter religioso e voluntário. No entanto, o relator apontou desvirtuamento da atividade religiosa, com subordinação, metas e controle da agenda, caracterizando relação de emprego nos termos da CLT.

O pastor foi admitido em 25/1/2005, com salário mensal de R$ 3.200, e pediu demissão em 18/9/2019. Testemunhas comprovaram que o autor seguia ordens da hierarquia da igreja, participava de reuniões diárias, angariava recursos, recolhia ofertas e depositava valores em banco, além de ter metas de arrecadação e pregações definidas. A subordinação não se limitava ao aspecto religioso, evidenciando ingerência na vida profissional e pessoal. 

O relator destacou que a exigência da vasectomia representou domínio sobre o corpo do pastor, privando-o da liberdade sobre sua vida pessoal e projetos futuros. “A atitude da reclamada implica ingerência indevida na vida privada do empregado, caracterizando ato ilícito e dano moral indenizável”, pontuou.

Atualmente, o andamento do processo está suspenso até que o TST e o STF julguem critérios referentes ao pagamento do adicional de transferência provisória, que era uma das demandas do ex-pastor.