Paul Manafort recebe pena muito menor que a pedida pela promotoria por fraude fiscal e bancária, em um dos dois processos abertos contra ele como resultado da conspiração russa

Washington

Paul Manafort, de 69 anos, um obscuro consultor político que ficou rico esticando os limites legais da indústria lobista de Washington, mentiroso contumaz de vida extravagante e ex-chefe da campanha eleitoral de Donald Trump, foi condenado na quinta-feira a 47 meses da prisão por fraude fiscal e bancária. Uma sentença muito abaixo da pena de 19 a 24 anos que a promotoria pedia. Figura de destaque dos círculos republicanos durante décadas, na prisão desde junho de 2018, Manafort se apresentou no tribunal em Washington pouco antes das 16h locais (14h de Brasília), em uma cadeira de rodas e vestido com um agasalho verde de presidiário. Antes de escutar sua sentença, às 19h locais, apelou por compaixão, mas não mostrou remorso nem pediu perdão por seus atos. “Minha vida profissional e pessoal está arruinada. Peço-lhe que tenha compaixão”, disse ele ao juiz. “Dizer que me sinto humilhado e envergonhado seria pouco.”

Das 34 pessoas e três empresas acusadas por Mueller em sua investigação, Manafort era o que podia ser condenado à maior pena. Mas, como esclareceu o veterano juiz T.S. Ellis III na própria sala, o réu “não está perante o tribunal por nada que tenha a ver com uma conspiração com o Governo russo”. Manafort é considerado um dano colateral da investigação de Mueller.

A condenação de quinta-feira se refere a um dos dois processos abertos contra Manafort. Quanto ao outro, um juiz federal de Washington deve anunciar a sentença na próxima semana, depois que o consultor se declarou culpado de dois crimes de conspiração. No primeiro processo, a defesa alegava que a pena de até 24 anos de prisão pedida pela promotoria era desproporcional, e solicitava clemência, dada a idade avançada do réu e seus problemas de saúde (gota), agravados por nove meses de confinamento isolado. Em agosto, o júri o declarou culpado de 8 das 18 acusações contra ele. Um membro discordante do júri impediu a condenação pelas outras dez acusações.

Durante o julgamento realizado no ano passado, os promotores apresentaram provas de que Manafort ocultou ilegalmente seu trabalho como lobista a serviço de políticos da Ucrânia alinhados com a Rússia, e mostraram como ele ocultou os pagamentos recebidos por esses trabalhos, avaliados em dezenas de milhões de dólares, em cerca de 30 contas bancárias em paraísos fiscais. Depois da queda de seu patrão, o presidente ucraniano Victor Yanukovich, e para continuar mantendo seu pomposo estilo de vida − que incluía uma letra “M” feita com flores no jardim de uma de suas seis casas e um casaco de pele de avestruz de 15.000 dólares (58.000 reais) adornado com a mesma inicial −, pediu empréstimos a bancos mentindo sobre sua situação financeira. Manafort afirma que seus crimes, pelos quais está “sinceramente arrependido”, segundo sua defesa, normalmente seriam punidos com uma pena em dinheiro, mas não com anos de prisão.

O trabalho de lobista de Manafort, com uma trajetória de 35 anos de atuação em campanhas eleitorais − incluídas as de quatro presidentes norte-americanos −, assim como a serviço de polêmicos líderes internacionais, ajudou a limpar a reputação de Yanukovich e a levá-lo à presidência da Ucrânia em 2010 como um improvável reformista democrático. Para seu trabalho de consultoria na região, Manafort contava com um sócio local, Konstantin Kilimnik, a quem o FBI atribui vínculos (que ele nega) com a espionagem russa.

Quando o escândalo sobre seu esquema de contas ilegais veio à tona, em agosto de 2016, Manafort foi despedido da campanha de Trump, na qual trabalhara durante cinco meses. Em setembro do ano passado, Manafort se declarou culpado e concordou em colaborar com a investigação de Mueller, acreditando que isso levaria à redução de sua sentença. Os promotores esperavam que a cooperação fosse relevante para a investigação da conspiração russa.

Sua colaboração, porém, acabou sendo pouco frutífera, a julgar pelo fato de que os promotores romperam o acordo em novembro, alegando que Manafort havia mentido reiteradamente para eles. Não revelaram quais informações obtiveram com a colaboração de Manafort. Mas esperavam que esclarecesse suas relações com Kilimnik. Em janeiro, vazou a informação de que os investigadores consideravam que Manafort tinha transferido para Kilimnik dados de pesquisas da campanha eleitoral. Não ficou claro para que Kilimnik iria querer esses dados nem se foram usados pelo Governo russo em sua operação para interferir nas eleições norte-americanas.