AQUECIMENTO GLOBAL

O novo relatório da Climate Central, publicado hoje, revela que mais de 2 bilhões de pessoas no mundo  foram expostas a pelo menos 30 dias de calor extremo prejudicial à saúde, entre junho e agosto. Além disso, cerca de metade da população mundial enfrentou temperaturas incomuns. Esses períodos com temperaturas fora do normal foram atribuídos às mudanças climáticas potencializadas pelo homem.

"Temperaturas elevadas claramente influenciadas pelas mudanças climáticas comprometeram a saúde de bilhões ao redor do mundo nos últimos três meses," afirmou Andrew Pershing, vice-presidente de ciência da Climate Central, em nota. "Nenhuma região, país ou cidade está segura das ameaças fatais causadas pela queima de combustíveis fósseis."

De acordo com a pesquisa, todas as pessoas do mundo experimentaram pelo menos 17 dias de calor acima do tolerável. A publicação destacou uma série de eventos climáticos extremos, como incêndios florestais devastadores. O relatório documentou ainda inundações sem precedentes em diversas regiões. A Etiópia, por exemplo, sofreu os piores alagamentos de sua história moderna, resultando em 257 mortes. Em Lagos, na Nigéria, faleceram 170 pessoas em razão da força da água.

Na Ásia, Bangladesh viu mais de 5 milhões de pessoas afetadas por inundações repentinas devido a chuvas intensas. A Índia registrou a maior precipitação em junho em 88 anos, com Delhi e Mumbai enfrentando chuvas devastadoras. Cientistas confirmaram que essas chuvas letais foram intensificadas pelas mudanças climáticas induzidas pela ação antropogênica.

Segundo o relatório, grandes secas, agravadas pelo calor, afetaram a agricultura em várias regiões, resultando em problemas nas colheitas e na declaração de estado de emergência em alguns países. Na Itália, os danos causados pela escassez hídrica foram estimados em três bilhões de dólares. Além disso, a mudança climática contribuiu para o aumento das temperaturas oceânicas, que atingiram os níveis mais altos em pelo menos 400 anos, favorecendo a intensificação de furacões e tempestades.

O documento também evidenciou que, em 80 países, uma grande parcela da população vivenciou um impacto em pelo menos dois terços dos dias entre junho e agosto. Segundo os especialistas responsáveis pela publicação, as mudanças climáticas estão moldando o futuro do planeta, com eventos extremos se tornando cada vez mais frequentes e intensos. Para eles, uma ação climática urgente é mais evidente do que nunca, diante dos efeitos devastadores na vida cotidiana de bilhões de pessoas.

Método de avaliação

72 países passaram pelo verão mais quente desde, pelo menos, 1970, impulsionado de forma significativa pelas mudanças climáticas. Em 180 cidades do Hemisfério Norte houve pelo menos uma onda de calor extremo durante o período avaliado pelos pesquisadores. Essas ondas de calor são, em média, 21 vezes mais prováveis hoje devido à poluição por carbono, principalmente causada pela queima de carvão, petróleo e gás.

A Central do Clima utilizou o Índice de Desvio Climático (CSI na sigla em inglês) para determinar o grau de influência do aquecimento global causado pelas emissões humanas de gases de efeito estufa nas temperaturas de cada região. Marco Moraes, geólogo, pesquisador de mudanças climáticas e autor do livro Planeta Hostil, frisou que "o que os pesquisadores encontraram foi extremamente preocupante."

De acordo com o especialista, as regiões mais suscetíveis às altas temperaturas foram as áreas tropicais ou desérticas das Américas, África, Oriente Médio, Sudeste da Ásia e Oceania. "Mas chama atenção que vários estados americanos e países como Itália, Grécia, e Japão apresentaram CSI muito alto. No Brasil, a região amazônica foi a que apresentou CSI mais elevados. No entanto, nota-se que o estudo coletou mais dados relativos ao verão do hemisfério Norte, de modo que as demais regiões do Brasil devem ser mais bem estudadas. As ondas de calor registradas no sul do país em 2023 e no Centro-Oeste e Sudeste, em 2024, indicam que anomalias perigosas também devem ocorrer aqui."

Saúde em risco

O calor extremo também impactou gravemente a saúde pública. Durante a peregrinação anual do Hajj em Meca, temperaturas superiores a 50°C causaram centenas de mortes e milhares de casos de estresse térmico. Países como Paquistão, Japão e Índia relataram falecimentos relacionados ao calor.

Fabiana Fonseca, médica da família, em Brasília, frisa que o risco à saúde provocado pela exposição ao calor extremo é ainda maior para crianças pequenas, principalmente bebês, idosos, e pessoas com problemas crônicos. "O risco está relacionado principalmente à desidratação e à insolação, é importante beber muita água para repor essa perda de líquidos. Também é interessante não fazer atividade física nos períodos de calor intenso e evitar principalmente no horário de 10h às 16h."

Segundo a especialista, se a exposição for inevitável, é necessário usar protetor solar e boné, além de andar sempre com água. "Os riscos são muito grandes para o corpo todo, coração e rins sofrem bastante. A desidratação e esse calor extremo favorecem infecções e podem agravar aquelas que geram vômitos e diarreia."

Paulo Henrique Rodrigues Correia, clínico geral do Hospital Brasília, da rede Dasa, ressalta que os principais efeitos ocasionados pela exposição às altas temperaturas são dor de cabeça, fraqueza, tontura e náusea. "Quando a exposição se torna prolongada, há um risco de desenvolvimento de insolação, que pode ocasionar delírio, convulsões e coma."

Conforme o médico, anualmente, quase metade da população mundial e aproximadamente 1 bilhão de trabalhadores são expostos a calor intenso em algum momento. "Aproximadamente um terço dessa população sofre de algum efeito adverso na saúde. Ao iniciar os sintomas clássicos é importante buscar um ambiente fresco e se hidratar, se os sintomas persistirem, um médico deve ser consultado. Em caso de sintomas graves, mais comuns em idosos ou crianças, como sonolência importante e delírios a assistência médica de urgência deve ser procurada.".