LEVANTAMENTO

O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), conhecido como prévia do Produto Interno Bruto (PIB), surpreendeu o mercado ao apresentar alta em junho, mas analistas avaliam que a tendência é de desaceleração ao longo do ano e em 2023. O IBC-Br cresceu 0,69% em junho, na comparação com maio. Com esse resultado, registrou aumento de 0,57% no segundo trimestre do ano, indicando desaceleração em relação ao avanço de 1,1% no trimestre anterior.


As estimativas do mercado para o indicador eram de 0,38% e o dado de junho acabou revertendo as quedas nos dois meses anteriores — de 0,26% em maio e de 0,64% em abril.


De acordo com analistas, os números acima do esperado do setor de serviços — que cresceu 0,7% em relação ao mês anterior — ajudaram no resultado positivo de junho no IBC-Br e devem contribuir para o crescimento do PIB do segundo trimestre.


Além disso, os estímulos do governo no início do ano, como o Auxílio Brasil de R$ 400, a antecipação do 13º dos aposentados, o saque emergencial do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o reajuste dos servidores estaduais, deram impulso à atividade econômica no primeiro semestre e forçaram o mercado a fazer uma série de revisões para o crescimento da economia neste ano.

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Impacto dos juros


O consenso entre analistas ouvidos pelo Correio, contudo, é de que o cenário é de desaceleração, porque o impacto atrasado da política monetária restritiva do Banco Central — que costuma demorar entre seis e nove meses — começa a ser sentido a partir deste segundo semestre e vai se estender até 2023. Não à toa, a mediana das previsões para o desempenho do PIB deste ano, atualmente em 2%, recua para 0,41%, em 2023. Mas há quem não descarte queda do PIB no ano que vem, como a SulAmérica Investimentos, que calcula 2,2% de alta da atividade em 2022, mas recuo de 0,7% em 2023.


As pressões inflacionárias persistentes, principalmente nos alimentos, e o desarranjo fiscal devem contribuir para que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) continue acima do teto das metas deste ano e do próximo, dificultando o trabalho do Banco Central. O processo de alta da taxa básica de juros (Selic), iniciado em março de 2021, quando os juros básicos estavam no piso histórico de 2% anuais, ainda não foi interrompido pelo BC. Atualmente, a Selic se encontra em 13,75%, o que ajuda a frear o consumo da população e os investimentos do setor produtivo. E a previsão do mercado é de que a Selic continuará em dois dígitos até o fim de 2023, quando fechará o ano em 11%.


"Há vários vetores que estão estimulando a atividade econômica deste ano, como os estímulos do governo e o avanço da vacinação, que permitiu a reabertura. Eles fizeram o mercado revisar para cima as previsões para o PIB. Mas, em 2023, a nossa previsão de queda de 0,7% ocorre devido à ausência de vetores de crescimento", explicou Natalie Victal, a nova economista-chefe da SulAmérica Investimentos. Segundo a analista, o impulso fiscal continua sendo importante para explicar parte das surpresas das estimativas do mercado para o PIB deste ano.


Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset, também reconhece que o cenário de desaceleração da economia já está em curso, apesar dos estímulos do governo para tentar turbinar a economia em ano eleitoral com o pacote de R$ 41,2 bilhões de benefícios que começaram a serem pagos na semana passada. "Estamos observando que a economia está perdendo um pouco de tração e o pacote deve ajudar a segurar o consumo. Mas com todos esses reveses no cenário interno e externo, daqui para a frente, a política monetária restritiva não deve deixar o PIB crescer acima de 2% neste ano", alertou.


Cenário difícil


Marina Garrido, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), destacou que o processo de desaceleração da atividade está em curso e, apesar dos novos estímulos fiscais, o PIB poderá ser negativo no quarto trimestre deste ano. "A política monetária restritiva começa a ter efeito agora na economia e é provável que, ao contrário dos serviços, a indústria e o comércio encerrem o ano com queda", alertou. Apesar desse cenário pouco animador, a especialista do Ibre considerou positivo o IBC-Br de junho. "Mesmo com a desaceleração, o indicador veio acima do esperado e mostrou crescimento sobre uma base maior", explicou. Pelas estimativas do Ibre, o PIB do segundo trimestre, que será divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1º de setembro, deverá registrar alta de 0,8%.


Ajuda dos estímulos


O pacote R$ 41,2 bilhões em benefícios criado por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) Kamikaze, como era chamada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, também chamada de PEC das Bondades, ou Eleitoreira, deve ajudar na revisão das previsões mais pessimistas para o Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre e até mesmo evitar uma queda como algumas estimativas apontavam.


Pelos cálculos da economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Natalie Victal, o novo valor do Auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família, de R$ 600, que começou a ser pago para as famílias mais vulneráveis na semana passada, poderá ter um impacto positivo de 0,2 a 0,4 ponto percentual no Produto Interno Bruto (PIB) de julho a setembro.


"O aumento do benefício de R$ 400 para R$ 600, para as 18,1 milhões de famílias já atendidas, resulta numa injeção de R$ 3,6 bilhões por mês. Somado a isso, a inclusão dos novos beneficiários resultará em expansão total de R$ 4,9 bilhões por mês, ou 1,9% da massa salarial. Trata-se de um estímulo fiscal que tende a ter impacto direto nas vendas do varejo, e em outros setores da economia via efeito secundário", destacou a analista no relatório semanal da SulAmérica divulgado ontem.


Segundo o levantamento, o efeito desse estímulo é diferente nas regiões do país e é maior nas regiões mais pobres e que têm mais beneficiários do programa, como Nordeste e Norte.


Em entrevista ao Correio, Natalie Victal disse que revisou de 0,3% para 0,5% a estimativa de crescimento do PIB do terceiro trimestre deste ano, incluindo na conta 0,2 ponto percentual de impacto do novo valor do benefício. No entanto, ela ainda não descarta recuo do PIB no último trimestre do ano. "Por enquanto, estamos prevendo queda de 0,5%. Mas, como o impacto dos estímulos fiscais ainda é uma grande incógnita, não descartamos uma taxa estável no último trimestre e até mesmo revisar para cima nossa previsão de alta de 2,2% no PIB deste ano", afirmou.


Riscos


No relatório, a economista ainda fez um alerta sobre os riscos da manutenção desse programa nos moldes atuais, como tem sinalizado o governo: "significa um um grande desafio para a sustentabilidade fiscal". "E esse desafio precisará ser endereçado no próximo mandato presidencial. Afinal, a deterioração fiscal permanente compromete a estabilidade econômica, com efeitos deletérios como aumento da inflação e comprometimento de perspectivas de crescimento", destacou o texto da economista.