A pandemia de Covid-19 está fazendo as pessoas beberem e fumarem mais. Um impacto nada surpreendente e até mesmo esperado, já que a quarentena e, consequentemente, o isolamento social trazem angústia e ansiedade, o que, para muita gente, se reflete em um consumo maior de álcool e cigarros.

Prova disso é que a venda de bebidas alcoólicas nesse período aumentou 38% nas distribuidoras, 27% nas lojas de conveniência e 26% nos serviços de entrega em domicílio. Os números foram apresentados pela subsecretária de Políticas Sobre Drogas da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, Soraya Romina dos Santos, em audiência na Assembleia na última segunda, 15/6.

Em excesso, a bebida traz prejuízos visíveis para quem bebe e para os outros. Além de reduzir a resistência física e mesmo os cuidados consigo mesmo, o álcool está diretamente ligado ao aumento da violência, o que pode ser uma bomba-relógio em famílias disfuncionais obrigadas a dividir o isolamento. Soraya Romina garantiu que, mesmo na pandemia, a subsecretaria tem orientado, acompanhado e monitorado, de forma sistemática, a Rede Complementar de Suporte Social na Atuação ao Dependente Químico. Mesmo as atividades de orientação psicossocial desenvolvidas pelo Centro de Referência Estadual em Álcool e Outras Drogas (Cread), podem ser acessadas por telefone.
 
Alívio para a solidão 


Para muita gente, porém, beber é um alívio para a solidão. Isolado em seu apartamento no Sion há 90 dias, o analista de sistemas E.N., 65 anos, só vai à rua para fazer compras em um mercadinho a poucos quarteirões de sua casa. Junto a biscoitos, salgadinhos e alguns produtos congelados, ele traz toda semana para casa uma garrafa de uísque, que consome nas noites em que lastima a falta de sua principal diversão no tempo livre: longos passeios de moto que ele não arrisca em tempos de quarentena. “E se eu cair? Além de não encontrar ajuda, vou acabar indo para um hospital e correr o risco de me contaminar”, lamenta.

As pessoas também procuram consolo para o isolamento no cigarro. Um estudo da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) com a UFMG aponta que 34,3% dos entrevistados que se declararam fumantes passaram a consumir mais cigarros por dia durante a pandemia – 22,8% aumentaram em dez, 6,4% em até cinco e 5,1% em 20 ou mais cigarros.  A pesquisa também mostrou que entre as mulheres o vício é maior —29,1% fumaram mais de dez cigarros ao dia, contra 17,3% dos homens.

A ansiedade e o nervosismo foram citados como motivo para fumar mais por 60%  das mulheres e 43% dos homens. “Estou comendo cigarros”, define um publicitário belo-horizontino, que está fumando três maços ou 60 cigarros por dia. “Trabalho em home office, cozinho alguns dias na semana e saio para comprar coisas essenciais, mas sinto uma falta enorme do papo ao vivo com os amigos e de fazer planos para o futuro, como viagens, que eu adoro e não tenho a menor ideia de quando poderei retomar”, diz.

Diabético e hipertenso, ele faz parte do grupo de risco para a Covid-19 e ser tabagista agrava ainda mais a situação. Um estudo inglês mostrou que fumantes têm um risco 45% maior de complicações pulmonares provocadas pela doença. O publicitário sabe disso e, segundo ele, isso só faz com que ele fume mais.

Tecnologia contra o vício

A tecnologia pode ajudar nesta hora. A partir dessa sexta-feira, até 26 de junho, será realizada a Semana  Estadual de Prevenção às Drogas, promovida pela Subsecretaria de Políticas sobre Drogas. “Por conta da pandemia, será desenvolvida em ambientes virtuais, a partir de diferentes estratégias de mobilização e comunicação remotas, tendo como público alvo os adolescentes e jovens”, explicou Soraya. Entre os dias 22 e 26, serão realizadas cinco lives, sempre às 16 horas, com a presença de lideranças jovens de diversas religiões e participação de grupos artísticos, além de chats específicos para a juventude.
 
Diante dos limites ditados pelo distanciamento social, os Alcóolicos Anônimos criaram uma reunião nacional diária online, sempre às 20 horas, que pode ser acessada pelo site www.aa.org.br. Há salas virtuais acontecendo em várias cidades do Brasil, abertas a todos que buscam apoio no tratamento da dependência do álcool.