Amauri Meireles (*)
A clássica peça “Quem tem medo de Virgínia Woolf”, que versava sobre medos, frustrações, ficções, relações interpessoais, foi encenada em 1962.
“Quem tem medo da PEC do Lewandowski” é escrito no momento em que há, em nosso país, um clima de desconfiança, de descrédito, de incertezas em relação à maioria de políticos, de governantes, de instituições, gerando “insegurança estrutural”.
Antes mesmo de ser difundida, ela já está fazendo pessoas sofrerem por antecipação. Vou contrariá-las, pressupondo que o ministro age de boa fé.
A inclusão do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) na Constituição, copiando o Sistema Único de Saúde (SUS), é medida bem positiva. Antes de contestar o propósito, convém conhecer a estrutura e o funcionamento desse órgão, porque servirão de base para o SUSP. Ruim é o nome, Sistema Único de Segurança Pública, porque segurança é um fim que se atinge com mecanismos de proteção, que são a defesa da inteiração social (isso, inteiração) e da salvaguarda social. Melhor seria Sistema Nacional de Salvaguarda Social.
Quanto à hipótese de que o governo federal quer aumentar sua autoridade na “segurança pública”, coordenar e controlar não são sinônimos de comandar. Nos princípios organizativos do SUS: “... cada esfera de governo é autônoma e soberana nas suas decisões e atividades, respeitando os princípios gerais e a participação da sociedade”. E o calcanhar de Aquiles, na segurança, sempre foi a falta de coordenação e de controle.
Têm razão, em parte, os que criticam o fato de o governo pretender fixar diretrizes a serem obedecidas rigorosamente. Diretriz, no caso, deve ser entendida como orientação, sugestão e não no sentido de ordem, regra de observância imperativa, visto que nosso país é um conjunto de realidades culturais distintas.
Outro item é que o sistema prisional passaria a ser coordenado pelo governo federal. Uma redundância, visto que a “segurança pública” (a salvaguarda social) seria coordenada pela União.
Já a proposta de atribuir à Polícia Federal (PF) a investigação de organizações criminosas é outra redundância, visto que, com outra redação, isso já está previsto na CF/88, Art. 144 e incisos. Essa atribuição exige, a cada dia, maior efetivo e pessoal qualificado para a trabalho de Polícia 4.0. A identificação e o desmantelamento dos eixos de suprimento de ORCRIM é um dos trabalhos de melhores resultados na área da salvaguarda social. Porém, a PF está, digamos, manietada, pois destina efetivos para realizar trabalhos de Polícia Ostensiva, em geral, impedindo-a de realizar, em maior escala, o que faz com ótimos resultados: a investigação.
Esta proposta nos remete a uma outra que será apresentada: a Polícia Rodoviária Federal passará a se chamar Polícia Ostensiva Federal. Mais um erro conceitual, visto que a Polícia Rodoviária Federal já é uma polícia ostensiva, que faz policiamento rodoviário, de forma brilhante! Melhor, a exemplo da Polícia Penal, reconhecer constitucionalmente a Força Nacional de Segurança Pública, a polícia portuária e a polícia aeroportuária como instituições autônomas de Polícia Ostensiva, realizando o policiamento geral, o portuário e o aeroportuário, respectivamente.
Nada a opor à fusão do Fundo Nacional de Segurança com o Fundo Nacional Penitenciário, visto que a execução penal administrativa já integra o SUSP.
O grande erro: assim como a violência não é problema só da Polícia, também não o é somente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que insiste em apresentar propostas para a causalidade. Quem tem medo de atacar as causas e os efeitos?
(*) Coronel Veterano da Polícia Militar de Minas Gerais