Amauri Meireles (*)

           

            Uma avalanche de notícias recentes, contraditórias, coloca em evidência uma situação extremamente perigosa. Reporta-se a certos fatos, não percebidos por grande parte da sociedade, nos quais ela própria está sendo usada como massa de manobra, para que interesses individuais se sobreponham ao coletivo.

            Vejam-se, por exemplo, os desdobramentos relativos ao “pacote” anticrime. Ficou em banho-maria no Congresso, conforme a estratégia do governo de priorizar a lei da reforma da Previdência. Se, por um lado, o resultado foi positivo, de outro, é de se admitir que esse vácuo deu fôlego aos opositores das medidas contra a corrupção, o crime organizado, os crimes praticados com grave violência à pessoa, elaboradas no Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). Seria a operacionalização do que o atual presidente prometeu, em sua campanha, ou seja, combater vigorosamente esses crimes.

            Entretanto, numa trama maquiavélica, estão colocando a grama para comer o boi. Desengavetaram o empoeirado projeto de Lei de abuso de autoridade, dando-lhe um falso protagonismo, com propósitos personalistas, cujo fim é ofuscar, desmerecer, desidratar o pacote à exaustão. Vale dizer, querem criminalizar condutas necessárias ao desempenho profissional, escanteando o exame de medidas tidas por eles, radicalmente, como exageradamente punitivistas. Ora, isso é muito bom! Nossa população já não aguenta mais assistir à elevação da espiral da violência criminal, em razão de medidas excessivamente benevolentes. E o órgão que tem de ser duro é o MJSP, que não tem, sob sua responsabilidade, a assistência social e, também, o ensino de civilidade e de cidadania. Em tese, ele é um órgão de cobrança. Sua clientela não são os marginalizados (os que estão à margem social), mas, sim, os marginais (os que estão à margem da lei).

            Devemos estar atentos, visto que estão tentando ludibriar a sociedade com afirmativas populistas, tipo “Justiça, Ministério Pública e Polícias querem ter superpoderes”. Alto lá! Isso é uma tremenda mentira, visto que esses órgãos jamais pleitearam complacência, condescendência, cheques em branco para cumprirem seus deveres. Querem, sim, garantias para o pleno exercício – que a sociedade clama e reclama – de colocar nas grades os marginais, principalmente os de colarinho-branco, que têm enorme capacidade de se locupletarem, notoriamente com enormes prejuízos materiais e morais para nosso país.

            Felizmente, ainda restam duas esperanças. A primeira é que várias autoridades brasileiras, autênticas (ao contrário de certas “autoridades” classistas), já se colocaram contra essa lei, que, furtivamente, pretende intimidar integrantes de órgãos vitais para o provimento da proteção social (através ações de defesa) e para a promoção do progresso nacional (através ações de desenvolvimento). Independentes, têm a clara percepção de que juízes, promotores e policiais são os profissionais que, corajosamente, enfrentam os embusteiros. A segunda é a possibilidade de o presidente vetar essa famigerada lei, grande anseio, no momento, das pessoas de bem de nosso Brasil.

            Possivelmente, a ideia de se discutir concreto contraveneno antes de se conhecer, de fato, efeitos de suposto veneno, deve ter partido de certos indivíduos comprometidos com o irregular, com o que há de ruim, indignos de estarem em estruturas que representam e lutam pelo povo. Adotam estratégia semelhante à usada na França, no século XIV, para excluírem as mulheres da sucessão do trono, usando erros de grafia, mentiras e omissões da história relativas à Lei Sálica.

            Enfim, a máscara começa a cair e mostra a cara da desfaçatez, que, insidiosamente, visa aos interesses escusos individuais. Porém, essa ação diversionária (desviar a atenção do “pacote” para embustes, do tipo “vamos repelir o abuso de autoridades”) já está sendo percebida pela população. Que está indo às ruas para manifestar-se contra essa excrescência!… Já tem consciência de que, no fundo, no fundo, o objetivo real de falazes opositores ao pacote é massacrar a Lava Jato, para livrar amigos, parentes e eles próprios das mãos dos únicos órgãos que podem colocá-los em lugar que merecem, no qual já deveriam estar: no xadrez.

                                                           (*) Coronel Reformado da PMMG

                                                           Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH