Amauri Meireles (*)

Há “ideólogos” que precisam compreender e entender a Doutrina de Defesa, para se manifestarem sobre ela!...

No dia 28 de novembro, foi lançada, pela Fundação Perseu Abramo, do Partido dos Trabalhadores, a cartilha “BRASIL SEGURO, FAMÍLIA PROTEGIDA - subsídios para o debate de segurança pública”.

De início, uma dúvida: o PT teria mudado a estratégia? Agora quer debater esse importante, inquietante, ante tema? Não mais quer “impor” políticas públicas, sob seu acentuado viés ideológico?

Ledo engano! Iniciando a leitura, constata-se que apenas mudou a capa, o título, o invólucro de presente, colocando, dissimuladamente, uma intitulação, um jogo de palavras pretensamente afetuosa, acolhedora, objetiva, mas, totalmente equivocada. É impossível ter um Brasil (ou qualquer outro país) Seguro! Todo esforço, mundialmente,visa a reduzir a Insegurança, isto é, não há como aumentar a Segurança. A realidade fática mostra que é impossível aumentar a segurança. Quanto à “Família protegida”, lembra-se, mais uma vez, que não se deve confundir Segurança e Proteção. Afinal, mesmo protegida, não significa que ela estará em segurança.

Assim, logo se constata que a ala radical do partido continua “dando as cartas”. É que, mesmo com muito mormaço (muito calor e pouca luz), muitos adereços, não consegue esconder a nada sublime obsessão, o objetivo nuclear da publicação: denegrir as Polícias Militares, as Forças Públicas Estaduais, visando ao seu enfraquecimento, para criar uma pretoriana guarda bolivariana. Explico!

Os mecanismos de proteção do Estado Democrático de Direito são as vária Defesas, realizadas por instrumentos de proteção, que são as Instituições. Porque elas compõem o tecido que reveste o organismo nacional, são alvo de ataques que buscam minar ou identificar eventuais vulnerabilidades, brechas por onde possam penetrar as ameaças ao Estado.

Significa dizer que quanto mais fracas, desacreditadas, mancomunadas, comprometidas, corrompidas, menos obstáculos para “dominar” o Estado, para imporuma ideologia, um projeto de poder que – divulgam – visa a “realizar a defesa de direitos, o combate à pobreza, a promoção da paz, reduzindo desigualdades, resguardando a dignidade humana, construindo sociedades mais justas e pacíficas”. É a velha história daconversa sem conteúdo relevante, tipo “reduzir desigualdades”, distribuindo pão com
mortadela durante o dia, na periferia, e comendo lagosta e bebendo bons vinhos, à noite, em restaurante privé. É o persistente engodo do socialismo penthouse, praticado pela militância blacktie – ala recalcitrante, barulhenta – que ainda consegue iludir uma vulnerável, manipulável, enganável, acrítica e – o mais alarmante – considerável massa de manobra.

De fato, o objetivo final é o locupletamento ilícito, a posse de dinheiro, de riqueza, a qualquer preço. Acorrupção generalizada, em vigor, prova isso. É a paradoxal hipocrisia do discurso igualitário e da prática elitista. Felizmente, enquanto essa situação mais se
evidencia, mais cresce a lista dos sensatos que estão abandonando esse barco furado. Não é a primeira vez que extremistas do PT tentam isso! E nem deve ser a última! No início de 2015, foi distribuído um caderno de teses (sete) produzidas por diferentes correntes do partido, visando a subsidiar os debates que ocorreriam durante o 5º Congresso Nacional do PT, em junho daquele ano, em Salvador-BA.

Chamou a atenção, em uma delas, textos tipo “Um partido para tempos de guerra”, “o PT defenderá a seguinte plataforma democrática e popular” (sic), integrada por 10 (dez) itens, sendo um deles “e) Reformas estruturais, com destaque para a desmilitarização das Polícias Militares”.

À época, escrevemos: “Lendo-se a primeira tese, encontram-se as palavras “guerra” (umas vinte vezes), “inimigo, ataque, defesa, estratégia, tática, aniquilar, luta, forças, mobilização, engajamento” e muitas outras, típicas do jargão militar. O próprio presidente do partido disse que “o PT está sob forte ataque... a ofensiva contra a legenda é uma campanha de cerco e aniquilamento”. Ao ser invocado o “exército do MST”, cujo chefe foi citado como “general”, assistimos a uma clara manifestação e a um forte estímulo ao caudilhismo tupiniquim. E querem desmilitarizar as PMs...”. Ora, por certo,na mente de qualquer leigo vem uma evidente inferência: “É preciso desmilitarizar o PT”.

Observa-se que a repercussão foi a pior possível, sem resultados práticos, com objetivas críticas internas, um mea-culpa, conforme anotado no Caderno de Resoluções e na Carta de Salvador, expedidos ao final do referido congresso. Embora a resolução 73 fale em desmilitarizar as PMs e criar uma polícia única, há admissão explícita que cometeram erros, que não avançaram em reformas estruturais, que falharam na comunicação com a sociedade e que precisavam se renovar internamente, reforçando mecanismos de ética, transparência e controle. Opa! Pelo visto, continuam precisando!...

Recentemente, essa vertente do partido (travestida de governo) apresentou a PEC/18 que, subliminarmente, pretendia assumir o controle das ações de segurança pública. Foi identificada como pífia, obtusa e pretensiosa.

O fato é que já aparelharam várias instituições, algumas com maior, outras com menor intensidade, mas as Forças Públicas Estaduais (denominadas polícias militares) continuam sendo sua “pedra no sapato”, atuando em obediência ao juramento de “dedicarse inteiramente ao serviço da Pátria”. Sempre se mantiveram coerentes, abominando extremismos de esquerda e de direita, visando a perpetuar sua referência como instituição independente, a serviço da nação brasileira, jamais se curvando a acenos políticopartidários ou governamentais que contenham contraposições e/ou contradições lógicas.

No afã de impor propostas de interesses político-partidários sectários, em detrimento de projetos – menos para consolidar demandas sociais, mais para atender interesses grupais – certos ideólogos e ativistas são intransigentes, intolerantes, inflexíveis e não se vexam em atropelar leis, ferir a ética, ignorar valores humanos esociais e corromper instituições e consciências. Por certo, Maquiavel está revirando-se em sua tumba!...

Em relação à proposta de criar a "Guarda Nacional Permanente de Caráter Civil", para atuar nas Operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), em substituição às Forças Armadas, entende-se que o Ministério da Defesa (MD) deve manifestar-se, repudiando essa inepta, disparatada proposta. Por que essa ojeriza, essa aversão à estrutura militar? Por que não reconhecer constitucionalmente a Força Nacional, com organização, estrutura e legislação específicas, dando-lhe o “status” de instituição permanente, incluindo-a no rol de forças públicas?

Certamente, o MD irá reiterar que o compromisso das Forças Públicas Federais (FFAA) e das Forças Públicas Estaduais (PMs e CBMs) é com a garantida da Ordem, atuando de forma tempestiva, na medida em que evolua, se acentue a Desordem. E que as operações de GLO são atividades realizadas, em razão da intensificação da desordem pública, para impedir que se transforme em desordem nacional, a partir do momento em que o estágio de Grave Perturbação da Ordem (que se sucede ao quadro de
Perturbação da Ordem, que se segue ao quadro de Grave Alteração da Ordem Pública, antecedido pela Alteração da Ordem Pública) se avizinhar.

Em casos de desordem pública, atuam os órgãos que realizam atividade policial (inclusive as PMs, que praticam a Polícia Ostensiva); em casos de desordem nacional, atuam as Forças Públicas: inicialmente, as estaduais, e, na sequência, as federais.
Força que pode ser vista sob dois aspectos: capacidade de o Estado impor sua vontade, para atender interesses coletivos, em desfavor de interesses individuais ou grupais; Força, instituição militar que operacionaliza essa capacidade.

Enfim, qualquer força pública que se queira criar deve ser disciplinada, medida, controlada, limitada, ou seja, deve ser militar. Força civil beira à incompatibilidade semântica. O caráter militar representa, sem dúvida, o controle da Força colocada à disposição e a serviço da sociedade a que tem o dever de servir. O traço definidor do caráter militar é a sua submissão a regulamento rígidos, à disciplina, à hierarquia, a uma escala de valores obrigatória, ao dever militar, formando uma filosofia peculiar de vida bastante diferente do “modus vivendi” civil. Essa “filosofia de vida” militar é o controle da Força e constitui o seu limite, a sua medida. Uma força não militar é uma força sem controle, que pode voltar-se contra a própria comunidade que a instituiu. Portanto, aí está a falácia da tese dos que postulam uma força civil: o caráter militar é uma garantia para sociedade contra o arbítrio e o despotismo de uma força semcontrole.

(*) Coronel Veterano da Polícia Militar de Minas Gerais

Foi Comandante da Região Metropolitana de Belo Horizonte