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Um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) chegou a uma fórmula que ajuda a dimensionar essa dilatação religiosa. Em 2021, as 87,5 mil igrejas evangélicas com CNPJ representavam sete em cada dez estabelecimentos religiosos formalizados no país, enquanto católicas eram 11% do total. O restante se dividia entre outras religiões e espaços sem classificação precisa, em grande parte composto por associações comunitárias, beneficentes ou educacionais.
Um salto e tanto em relação a 1998, primeiro ano contemplado na pesquisa. Os locais de culto evangélicos somavam então 26,6 mil, ou 54,5% do todo.
O pentecostalismo e sua variante neopentecostal dominam o bolo religioso. São as pequenas igrejas, "aquelas de bairro", que puxam o crescimento, aponta a economista Fernanda De Negri, coautora do trabalho e diretora de Estudos e Políticas Setoriais, de Inovação, Regulação e Infraestrutura do Ipea.
Tratam-se de células independentes, com um ou poucos templos, de nomes como Ministério Jesus Te Ama e Igreja Pentecostal Rocha Inabalável Deus É Fiel.
As grandes marcas do segmento são fortes, claro. Só a Universal do Reino de Deus, que De Negri define como "uma empresa com diversas filiais", tem 6.800 estabelecimentos vinculados a um único CNPJ. A Quadrangular, outra gigante, possui quase 5.000.
Mensurar o agigantamento evangélico tem lá seus desafios. Comecemos pelo Censo, de onde vêm dados mais precisos sobre essa população. As informações mais recentes sobre a base religiosa nacional são do levantamento de 2010 -o IBGE ainda não divulgou esse recorte a partir do Censo 2022.
O que o Ipea fez foi usar dados da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho e Emprego. Levou-se em conta, portanto, pessoas jurídicas inscritas na categoria "atividades de organizações religiosas".
Como a Rais joga tudo no mesmo pacote, sem especificar a qual religião cada CNPJ corresponde, foi preciso apelar a um algoritmo que filtrasse os nomes dos estabelecimentos. Exemplo: para identificar igrejas evangélicas tradicionais, peneirou-se termos como "metodista" e "anglicana", e para pentecostais, combinações como "Assembleia de Deus" (o maior galho evangélico do país) e o próprio título "pentecostal".
De Negri reconhece alguns buracos metodológicos a se considerar aqui, já que muitas igrejas nanicas espalhadas pelo país operam sem qualquer adesão formal. Coloca-se algumas cadeiras numa garagem mesmo, improvisa-se um púlpito na frente, e pronto. Algo por aí.
Outra imprecisão metodológica ilustra bem as dificuldades crônicas em radiografar o corpo evangélico brasileiro. Formas antigas para categorizar as igrejas tradicionais, ligadas ao protestantismo clássico, não funcionam tão bem para o quadro contemporâneo.
Exemplo: batistas a princípio fariam parte desse grupo histórico. O que dizer, no entanto, de igrejas como a Batista Lagoinha (da família Valadão) ou Atitude (com Michelle Bolsonaro entre os fiéis), que esfumaçam as fronteiras com o pentecostalismo?
Desafio parecido é separar o que é pentecostal e o que é neopentecostal. Basta pensar nos templos sob guarda do pastor Silas Malafaia, comumente visto como líder do segundo bloco por quem é de fora do meio. A Assembleia de Deus Vitória em Cristo, todavia, entraria tradicionalmente na clivagem assembleiana, de DNA pentecostal.
O que dá para cravar com segurança é que os católicos foram os que menos cresceram de 1998 para cá. O número de locais subordinados ao Vaticano saltou 63% no período, enquanto a fração evangélica galopou 228,5%.
Na falta de dados frescos do Censo, projeções indicam que católicos são hoje metade do povo, e seus pares cristãos, próximos de um terço -eram menos de 10% até os anos 1990.
Uma série de motivos explica a vantagem nessa corrida religiosa, inclusive abordagens teológicas diversificadas que fazem mais sentido para o brasileiro médio do que aquelas da Igreja Católica, mais enrijecida pela hierarquia da Santa Sé.
Para a economista e colunista da Folha de S.Paulo Deborah Bizarria, isso inclui "uma maior facilidade de abertura de igrejas em comparação com as católicas". A dianteira se beneficiaria de "uma flexibilidade significativa para identificar áreas com crescimento populacional e maior potencial para atrair membros".
Não estamos falando apenas de geografia. "As igrejas evangélicas desfrutam de uma liberdade mais ampla para definir crenças e práticas, alinhando-se com a interpretação da Bíblia e a orientação de seus líderes", diz Bizarria. "O que não significa um 'vale tudo', mas há grande espaço para discordâncias em questões como batismo, santa ceia e questões comportamentais como consumo de bebida alcoólica."
Em compensação, afirma, as lideranças católicas "seguem uma doutrina mais uniforme, fundamentada na autoridade do papa e nos concílios ecumênicos".
Ela frequenta em São Paulo a presbiteriana Comunidade da Vila, em Pinheiros (zona oeste paulistana). O pastor Victor Fontana, diretor de ensino teológico ali, concorda que ampliar o segmento é "bem mais fácil que formar paróquia". Até um antigo bar ou oficina mecânica abrigam uma nova casa de oração.
Fontana faz um adendo: contabilizar templos não é o único medidor para a popularidade desse filão religioso. Um giro por São Paulo ajuda a observar o aumento de pontos comerciais "que carregam uma linguagem que o identifica como evangélico", diz. São nomes como El Shaddai (algo como Deus Todo Poderoso, em hebraico), que batiza de livraria cristã a salão de beleza.
Ele repara ainda que, embora o fenômeno seja mais paulatino longe das regiões centrais, o alargamento da via evangélica também vem atingindo bairros mais nobres. "Onde antes tinha uma cantina na Bela Vista ou um mercadinho em Perdizes, agora tem uma 'church' cheia de gente jovem."
Aqui cabe ressaltar uma transição social importante. Muitos filhos de famílias pioneiras no evangelicalismo "passaram a ter acesso a estudo universitário, seja por causa das cotas, seja por causa dos programas de assistência [como o Fies]", e conquistam rendas mais polpudas, diz.
"A expressão de fé que faz sentido para eles já não está mais tanto nas periferias." Crescei e multiplicai-vos, portanto, para todas as classes sociais.
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Um salto e tanto em relação a 1998, primeiro ano contemplado na pesquisa. Os locais de culto evangélicos somavam então 26,6 mil, ou 54,5% do todo.
O pentecostalismo e sua variante neopentecostal dominam o bolo religioso. São as pequenas igrejas, "aquelas de bairro", que puxam o crescimento, aponta a economista Fernanda De Negri, coautora do trabalho e diretora de Estudos e Políticas Setoriais, de Inovação, Regulação e Infraestrutura do Ipea.
Tratam-se de células independentes, com um ou poucos templos, de nomes como Ministério Jesus Te Ama e Igreja Pentecostal Rocha Inabalável Deus É Fiel.
As grandes marcas do segmento são fortes, claro. Só a Universal do Reino de Deus, que De Negri define como "uma empresa com diversas filiais", tem 6.800 estabelecimentos vinculados a um único CNPJ. A Quadrangular, outra gigante, possui quase 5.000.
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O que o Ipea fez foi usar dados da Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho e Emprego. Levou-se em conta, portanto, pessoas jurídicas inscritas na categoria "atividades de organizações religiosas".
Como a Rais joga tudo no mesmo pacote, sem especificar a qual religião cada CNPJ corresponde, foi preciso apelar a um algoritmo que filtrasse os nomes dos estabelecimentos. Exemplo: para identificar igrejas evangélicas tradicionais, peneirou-se termos como "metodista" e "anglicana", e para pentecostais, combinações como "Assembleia de Deus" (o maior galho evangélico do país) e o próprio título "pentecostal".
De Negri reconhece alguns buracos metodológicos a se considerar aqui, já que muitas igrejas nanicas espalhadas pelo país operam sem qualquer adesão formal. Coloca-se algumas cadeiras numa garagem mesmo, improvisa-se um púlpito na frente, e pronto. Algo por aí.
Outra imprecisão metodológica ilustra bem as dificuldades crônicas em radiografar o corpo evangélico brasileiro. Formas antigas para categorizar as igrejas tradicionais, ligadas ao protestantismo clássico, não funcionam tão bem para o quadro contemporâneo.
Exemplo: batistas a princípio fariam parte desse grupo histórico. O que dizer, no entanto, de igrejas como a Batista Lagoinha (da família Valadão) ou Atitude (com Michelle Bolsonaro entre os fiéis), que esfumaçam as fronteiras com o pentecostalismo?
Desafio parecido é separar o que é pentecostal e o que é neopentecostal. Basta pensar nos templos sob guarda do pastor Silas Malafaia, comumente visto como líder do segundo bloco por quem é de fora do meio. A Assembleia de Deus Vitória em Cristo, todavia, entraria tradicionalmente na clivagem assembleiana, de DNA pentecostal.
O que dá para cravar com segurança é que os católicos foram os que menos cresceram de 1998 para cá. O número de locais subordinados ao Vaticano saltou 63% no período, enquanto a fração evangélica galopou 228,5%.
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Uma série de motivos explica a vantagem nessa corrida religiosa, inclusive abordagens teológicas diversificadas que fazem mais sentido para o brasileiro médio do que aquelas da Igreja Católica, mais enrijecida pela hierarquia da Santa Sé.
Para a economista e colunista da Folha de S.Paulo Deborah Bizarria, isso inclui "uma maior facilidade de abertura de igrejas em comparação com as católicas". A dianteira se beneficiaria de "uma flexibilidade significativa para identificar áreas com crescimento populacional e maior potencial para atrair membros".
Não estamos falando apenas de geografia. "As igrejas evangélicas desfrutam de uma liberdade mais ampla para definir crenças e práticas, alinhando-se com a interpretação da Bíblia e a orientação de seus líderes", diz Bizarria. "O que não significa um 'vale tudo', mas há grande espaço para discordâncias em questões como batismo, santa ceia e questões comportamentais como consumo de bebida alcoólica."
Em compensação, afirma, as lideranças católicas "seguem uma doutrina mais uniforme, fundamentada na autoridade do papa e nos concílios ecumênicos".
Ela frequenta em São Paulo a presbiteriana Comunidade da Vila, em Pinheiros (zona oeste paulistana). O pastor Victor Fontana, diretor de ensino teológico ali, concorda que ampliar o segmento é "bem mais fácil que formar paróquia". Até um antigo bar ou oficina mecânica abrigam uma nova casa de oração.
Fontana faz um adendo: contabilizar templos não é o único medidor para a popularidade desse filão religioso. Um giro por São Paulo ajuda a observar o aumento de pontos comerciais "que carregam uma linguagem que o identifica como evangélico", diz. São nomes como El Shaddai (algo como Deus Todo Poderoso, em hebraico), que batiza de livraria cristã a salão de beleza.
Ele repara ainda que, embora o fenômeno seja mais paulatino longe das regiões centrais, o alargamento da via evangélica também vem atingindo bairros mais nobres. "Onde antes tinha uma cantina na Bela Vista ou um mercadinho em Perdizes, agora tem uma 'church' cheia de gente jovem."
Aqui cabe ressaltar uma transição social importante. Muitos filhos de famílias pioneiras no evangelicalismo "passaram a ter acesso a estudo universitário, seja por causa das cotas, seja por causa dos programas de assistência [como o Fies]", e conquistam rendas mais polpudas, diz.
"A expressão de fé que faz sentido para eles já não está mais tanto nas periferias." Crescei e multiplicai-vos, portanto, para todas as classes sociais.