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Com essa importante data em mente, e diante do cenário turbulento que temos enfrentado, a COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO MINAS GERAIS vem trazer o seu singelo contributo a tema tão caro em nosso dia a dia.
Vivemos tempos sombrios.
Nos estádios, torcedores se matam por futebol e o esporte que deveria ser de celebração e alegria, vira um palco de ofensas e agressões.
Na política, um país dividido ao meio e que muitas vezes demoniza quem pensa diferente. Entre “tralhas” e “minions” sobram acusações, falta empatia.
Na religião, falsos profetas se “esquecem” que Deus prega a união e preocupam-se mais em dizer qual o maior ou melhor culto, descreditando as crenças que não lhe afeiçoam.
No cenário internacional, guerras localizadas evidenciam a polarização entre governos, a busca incessante por poder e trazem à tona o fantasma de um terceiro conflito global que poderia representar o fim para todos nós.
Na internet e nas redes sociais alastra-se o comportamento irresponsável daqueles que divulgam fake news, discurso de ódio e fazem da pós verdade uma ferramenta de controle e dissimulação.
No dia a dia, noticiamos a violência sistemática contra as minorias: mulheres, negros, homossexuais, indígenas, portadores de deficiência, entre outros grupos, não recebem o igual tratamento e consideração que lhes seria inerente.
O que deu errado? O que está acontecendo? Falta muito ainda para evoluirmos enquanto indivíduos e enquanto sociedade. E muito do que falta, passa pela tolerância.
Vale recordar a definição de tolerância trazida pela UNESCO:
“A tolerância é o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a abertura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz.”
De igual forma, a Declaração Universal dos direitos humanos2 enuncia que “toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião” (art. 18), “de opinião e de expressão” (art. 19) e que a educação “deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étnicos ou religiosos” (art. 26).
A Carta da Tolerância da UNESCO chama ainda a atenção para o fato de que ser tolerante é reconhecer os direitos universais das pessoas, bem como as liberdades individuais. Dessa forma, a tolerância não pode ser invocada para justificar lesões a esses valores fundamentais.
Isso traz à tona o famoso “paradoxo da tolerância” desenvolvido por Karl Popper. Para o filósofo, aceitar livremente a intolerância em nome da preservação da liberdade é, na verdade, arriscar a própria tolerância, na medida em que grupos que não toleram a diferença se aproveitam do discurso da liberdade de expressão para atacar a dissidência. Segundo Karl Popper, a intolerância não teria espaço em uma sociedade livre.
Alguns grupos extremistas, tanto de direita quanto de esquerda, interpretam o paradoxo da tolerância como uma manifestação intolerante da sociedade. Entretanto, é necessário esclarecer que as democracias liberais têm como pressuposto o diálogo, o debate aberto, um sistema de leis que permita que os diferentes fluxos de informação que existem em uma sociedade possam coexistir. A intolerância a esses princípios, caros às democracias, autorizaria o uso da coação, ou, em outras palavras, não tolerar ataques aos princípios e valores fundamentais, como forma de salvaguardar a própria democracia. O paradoxo é, então, somente aparente, já que o princípio da tolerância exige que a intolerância não seja permitida.
A tolerância é, portanto, uma das bases em que se alicerçam as democracias modernas e o Estado Democrático de Direito. Não por acaso, regimes autoritários, ditaduras e o totalitarismo eram marcados pela imposição de uma visão única, dominante e pela perseguição ou aniquilamento dos divergentes. Cuidar da tolerância é, portanto, cuidar do Estado Democrático de Direito.
Jules Lemaitre afirma que “a tolerância é a caridade da inteligência”. Que possamos então, nos despir de nossos dogmas e convicções para aceitar a pluralidade do mundo e a complexidade das relações humanas. A modernidade é líquida e não mais sólida. Minha régua não é a única régua. Minha história não é a única história. Meus valores não são os únicos valores. Precisamos entender, reconhecer e aceitar o outro que não vive e que não pensa igual a mim. Afinal, somos tolerantes não apenas quando criamos o consenso, mas sobretudo, quando respeitamos verdadeiramente o dissenso.
Belo Horizonte, 16 de novembro de 2022.
COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO MINAS GERAIS
Presidente
Humberto Lucchesi de Carvalho
1º Vice-Presidente
Walter Lúcio Alves de Freitas
2º Vice-Presidente
Edilene Lobo
3º Vice-Presidente
Carla Viviane Resende
Secretário-Geral
Rafael Sacchetto Vieira Pinto
Membros:
Roberto Miglio Sena, João Victor de Souza Neves, Emílcio José Lacerda Vilaça, Mariângela Ferreira Willamowius, Ana Beatriz da Silva Gomes, Antônio Carlos Ferreira, Aloísio Vilaça Constantino, Guilherme Renault Diniz, Fernando José Starling Freitas, Marcos Guiotti Júnior, Sérgio Gazel Guimarães.
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Com essa importante data em mente, e diante do cenário turbulento que temos enfrentado, a COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO MINAS GERAIS vem trazer o seu singelo contributo a tema tão caro em nosso dia a dia.
Vivemos tempos sombrios.
Nos estádios, torcedores se matam por futebol e o esporte que deveria ser de celebração e alegria, vira um palco de ofensas e agressões.
Na política, um país dividido ao meio e que muitas vezes demoniza quem pensa diferente. Entre “tralhas” e “minions” sobram acusações, falta empatia.
Na religião, falsos profetas se “esquecem” que Deus prega a união e preocupam-se mais em dizer qual o maior ou melhor culto, descreditando as crenças que não lhe afeiçoam.
No cenário internacional, guerras localizadas evidenciam a polarização entre governos, a busca incessante por poder e trazem à tona o fantasma de um terceiro conflito global que poderia representar o fim para todos nós.
Na internet e nas redes sociais alastra-se o comportamento irresponsável daqueles que divulgam fake news, discurso de ódio e fazem da pós verdade uma ferramenta de controle e dissimulação.
No dia a dia, noticiamos a violência sistemática contra as minorias: mulheres, negros, homossexuais, indígenas, portadores de deficiência, entre outros grupos, não recebem o igual tratamento e consideração que lhes seria inerente.
O que deu errado? O que está acontecendo? Falta muito ainda para evoluirmos enquanto indivíduos e enquanto sociedade. E muito do que falta, passa pela tolerância.
Vale recordar a definição de tolerância trazida pela UNESCO:
“A tolerância é o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a abertura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz.”
De igual forma, a Declaração Universal dos direitos humanos2 enuncia que “toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião” (art. 18), “de opinião e de expressão” (art. 19) e que a educação “deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étnicos ou religiosos” (art. 26).
A Carta da Tolerância da UNESCO chama ainda a atenção para o fato de que ser tolerante é reconhecer os direitos universais das pessoas, bem como as liberdades individuais. Dessa forma, a tolerância não pode ser invocada para justificar lesões a esses valores fundamentais.
Isso traz à tona o famoso “paradoxo da tolerância” desenvolvido por Karl Popper. Para o filósofo, aceitar livremente a intolerância em nome da preservação da liberdade é, na verdade, arriscar a própria tolerância, na medida em que grupos que não toleram a diferença se aproveitam do discurso da liberdade de expressão para atacar a dissidência. Segundo Karl Popper, a intolerância não teria espaço em uma sociedade livre.
Alguns grupos extremistas, tanto de direita quanto de esquerda, interpretam o paradoxo da tolerância como uma manifestação intolerante da sociedade. Entretanto, é necessário esclarecer que as democracias liberais têm como pressuposto o diálogo, o debate aberto, um sistema de leis que permita que os diferentes fluxos de informação que existem em uma sociedade possam coexistir. A intolerância a esses princípios, caros às democracias, autorizaria o uso da coação, ou, em outras palavras, não tolerar ataques aos princípios e valores fundamentais, como forma de salvaguardar a própria democracia. O paradoxo é, então, somente aparente, já que o princípio da tolerância exige que a intolerância não seja permitida.
A tolerância é, portanto, uma das bases em que se alicerçam as democracias modernas e o Estado Democrático de Direito. Não por acaso, regimes autoritários, ditaduras e o totalitarismo eram marcados pela imposição de uma visão única, dominante e pela perseguição ou aniquilamento dos divergentes. Cuidar da tolerância é, portanto, cuidar do Estado Democrático de Direito.
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Belo Horizonte, 16 de novembro de 2022.
COMISSÃO DE DEFESA DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SEÇÃO MINAS GERAIS
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Humberto Lucchesi de Carvalho
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