“Hoje acordei com saudades daquele menino / Que ao nascer diamantina chamou Juscelino”. Os versos da canção Filho Único, Irmão de Todos, de Moacyr Franco, vêm à mente no dia em que se comemoram os 118 anos de nascimento de Juscelino Kubitschek, o “presidente bossa-nova” cujas realizações, historiadores como Heloísa Starling e Lilia Schwarcz afirmam ter contribuído para criar uma ponte entre o velho e o novo Brasil.

Passados 44 anos de sua morte, JK continua recebendo homenagens que buscam preservar sua memória e discutir sua trajetória política. Em Brasília, a capital federal que Juscelino idealizou ao assumir a presidência da República, em 1956, e que inaugurou apenas quatro anos depois, a Secretaria de Turismo destinou todo o mês de setembro para celebrar o legado do ex-presidente e promover o turismo cívico.

Esta manhã (12), uma carreata de carros antigos percorreu alguns dos principais pontos turísticos da cidade, saindo do Catetinho – a primeira residência oficial de JK durante a construção da nova capital, projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, e hoje transformado em um pequeno museu – até chegar ao Memorial JK, onde estão conservados e expostos documentos, fotografias, itens de campanhas, livros e objetos pessoais do político, além da faixa presidencial que Juscelino usou.

O ex-presidente também foi homenageado ontem (11), no Senado, com o lançamento do segundo volume da coletânea de seus discursos. Apresentada durante uma cerimônia nas redes sociais que teve a participação de várias autoridades e convidados, o livro pode ser baixado gratuitamente no site da livraria do Senado. 

Bateias


Mineiro de Diamantina, Juscelino formou-se em medicina, mas logo trocou os bisturis pela política. Começou chefiando o gabinete de Benedito Valadares, nomeado interventor federal de Minas Gerais por Getúlio Vargas, em 1933. No ano seguinte, JK foi eleito deputado federal, mas teve o mandato cassado em novembro de 1937, quando Vargas fechou o Congresso Nacional com o apoio das Forças Armadas.

Em 1940, Benedito Valadares o nomeou prefeito de Belo Horizonte. Conciliando a administração da capital mineira com a atividade médica, Juscelino se notabilizou por realizar diversas obras que transformaram Belo Horizonte, passando à história como o “prefeito furacão”. Além de importantes obras de infraestrutura, sua gestão foi marcada pelo início da construção do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico da Pampulha, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Ainda assim, era quase um desconhecido no restante do país.

Após a deposição de Vargas, em 1945, Juscelino foi eleito deputado constituinte – permanecendo no cargo mesmo após a promulgação da Constituição de 1946. Em 1950, foi eleito governador de Minas Gerais e voltou a convidar Niemeyer para projetar várias obras públicas.

O auge da carreira política de Juscelino se deu em 1955, quando foi eleito presidente da República. Em sua música de campanha, apresentava-se como homem “trabalhador”, “patriota”, vindo das “bateias”, ou seja, de antigas regiões de exploração do ouro em Minas Gerais, que salvaria o Brasil. “Queremos demonstrar ao mundo inteiro e a todos que nos querem dominar que o Brasil pertence aos brasileiros”, dizia o jingle do candidato eleito com o slogan "50 anos de progresso em 5 anos de governo".

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Juscelino Kubitschek com a cartola na mão na inauguração de Brasília - Gervásio Baptista/Arquivo Pessoal


Mudança de capital


Ainda durante a campanha, ao fazer um comício em Jataí (GO), em abril de 1955, Juscelino foi questionado por um cidadão, Antônio Soares Neto, se cumpriria a Constituição Federal caso fosse eleito, transferindo a capital do Rio de Janeiro para a região central do país. “Confesso que, até aquela altura, eu não havia pensado nesse assunto”, declararia JK, anos mais tarde, ao ser entrevistado.

Pego de surpresa, o desenvolvimentista JK não se fez de rogado. “Acabo de prometer que cumprirei, na íntegra, a Constituição, e não vejo razão para ignorar esse dispositivo. Durante o meu quinquênio, farei a mudança da sede do governo e construirei a nova capital!”, teria respondido o então candidato. Nascia assim, a obra máxima da moderna arquitetura brasileira, inaugurada apenas cinco anos depois, e desde 1972 considerada Patrimônio Cultura da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

JK deixou a presidência em janeiro de 1961, sendo sucedido por Jânio Quadros. Mais tarde, seus anos a frente do governo seriam identificados com o que se chamou de “anos dourados”, embora não livres de polêmicas e denúncias. Eleito senador por Goiás nas eleições extraordinárias de junho de 1961, Juscelino apoiou o regime militar, ao qual passou a se opor ao ter seu mandato e seus direitos políticos cassados por dez anos, em junho de 1964.

“Julgo do meu dever dirigir, desta tribuna, algumas palavras à Nação brasileira. Faço-o agora para que, se o ato de violência vier a consumar-se, não me veja eu privado do dever de denunciar o atentado que, na minha pessoa, vão sofrer as instituições”, discursou JK pouco antes de perder o cargo e deixar o país. “Sinto uma perfeita correlação entre a minha ação presidencial e a iníqua perseguição que me estão movendo.”

Exílio


Após dois anos exilado na Europa, JK tentou regressou ao Brasil no fim de 1965. Temendo ser preso, voltou a deixar o país, ao qual só regressou definitivamente em março de 1967. Ocupou alguns cargos públicos até que, em 1976, passou e dedicar-se exclusivamente à administração de sua fazenda em Luziânia (GO). Em 22 de agosto daquele ano, o carro em que ele e seu motorista viajava se chocou contra um caminhão na Via Dutra, próximo a Resende (RJ). A morte de JK causou comoção nacional.

Em 2013, a Comissão da Verdade da Câmara Municipal de São Paulo concluiu que sua morte não tinha sido um acidente, mas sim consequência de um atentado. Um ano depois, no entanto, a Comissão Nacional da Verdade concluiu que a colisão foi acidental.