Nem a condição de "superministro" de Paulo Guedes tem sido suficiente para convencer colegas da necessidade de privatizar estatais para enxugar a máquina pública e reduzir gastos. Empresas do topo da lista para serem vendidas ou fechadas estão até mesmo recebendo novos funcionários. As maiores resistências vêm dos ministérios de Ciência e Tecnologia, Agricultura, Minas e Energia e Infraestrutura.
O plano de privatizações é um dos pilares da política econômica de Guedes, que chamou o empresário Salim Mattar, dono da Localiza, para levar adiante a desestatização. A meta é obter neste ano receita de US$ 20 bilhões. Desse valor, o governo diz ter cumprido mais da metade, com US$ 11,4 bilhões em desestatizações e US$ 646 milhões em desinvestimentos. Boa parte é de concessões gestadas em governos anteriores.
O Tesouro injeta mais de R$ 18 bilhões ao ano para fechar as contas das estatais dependentes (incapazes de gerar receitas para bancar as despesas). Elas pagam, em média, salário mensal de R$ 13,4 mil, seis vezes mais que o rendimento médio do trabalhador com carteira assinada.
Mas a catequese para convencer os demais ministros a se desfazerem de suas empresas não está fazendo efeito. Um dos símbolos da dificuldade é a resistência do ministro Marcos Pontes, da Ciência e Tecnologia, em vender suas estatais, como os Correios. A EBC, empresa de comunicação que o próprio Jair Bolsonaro defendeu extinguir ou privatizar, agora teve os planos revistos pelo Palácio do Planalto.
A Empresa de Planejamento e Logística (EPL), que atua nas áreas de planejamento, estruturação e qualificação de projetos de infraestrutura de transportes, estava perto da extinção, mas está repondo vagas e contratando pessoal. Segundo a empresa, dos 143 cargos de que dispõe, sete estão em fase de contratação neste mês, "haja vista os desligamentos recentes". A EPL não comenta a intenção do governo de fechá-la.
A intenção da área econômica era também privatizar a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que apura estatísticas agropecuárias, faz a regulação dos preços mínimos com armazenagem de estoques e tem cerca de 4 mil funcionários. A avaliação é de que há outras formas mais eficientes para exercer essa política, e quem acaba ganhando com o desenho atual são os "atravessadores", que levam o estoque dos armazéns para centros consumidores.
O BNDES quer trabalhar nos planos de venda da empresa e participa de reuniões técnicas com o governo, mas auxiliares da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, consideram que a hipótese de privatizar "está afastada". A pasta só aprova a redução nos ativos subaproveitados ou com alto custo. O objetivo é "tirar gordura para ganhar musculatura", o que esbarra na estratégia de Guedes.
Apesar da dificuldade, Salim Mattar é otimista. "O processo de desestatização é irreversível. É questão de tempo."