A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) classificou de "grave episódio" a informação divulgada pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre relatórios da Lava Jato feitos a partir da interceptação telefônica do escritório de advocacia representante do petista.

Na quinta-feira (6) a Folha de S.Paulo mostrou que a principal aposta da defesa de Lula no STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar anular a condenação dele no caso do tríplex de Guarujá (SP) se baseia no relato de que a Lava Jato produziu relatórios que detalharam ao menos 14 horas de conversas entre os advogados, em uma afronta à legislação.

A OAB disse, em nota, que acompanha esse "grave episódio que indica que diálogos entre os advogados e seu cliente, além de ilegalmente interceptados, teriam dado origem a relatórios" usados no processo.

"O sigilo das conversas entre defensor e seu cliente é protegido por lei e sua violação por qualquer meio é ilegal, além de significar um ataque ao direito de defesa e às prerrogativas dos advogados", afirmou a entidade. 

A ação de Lula no STF foi ingressada no ano passado, tem como ponto central um relato do advogado Pedro Henrique Viana Martinez.
 
O defensor não faz mais parte da equipe contratada pelo petista, mas diz ter visto na 13ª Vara Federal de Curitiba os relatórios produzidos a partir das interceptações telefônicas do ramal-tronco do escritório Teixeira Martins & Advogados, responsável pela defesa técnica de Lula.
 
Era na 13ª Vara que atuava o então juiz e hoje ministro Sergio Moro (Justiça).

Segundo Martinez, cerca de 14 horas foram captadas diretamente do ramal-tronco do escritório Teixeira Martins & Advogados. O advogado descreveu em um documento aquilo que encontrou.

"Cada ligação era separadamente identificada, sendo possível visualizar número de origem e destino da chamada, bem como a sua duração. Com um clique, era possível ouvir cada áudio interceptado", disse.

"As listas contavam, ainda, com uma última coluna. Em tal coluna estavam inseridos comentários de análise realizada por agentes da Polícia Federal. Destaca-se que nem todas as chamadas continham comentários inseridos, ao contrário, a maioria delas apresentava esse campo em branco", completou.

Martinez disse que as ligações geradas por meio do ramal-tronco do escritório traziam ao lado comentários a respeito do conteúdo do áudio. "Ou seja, com certeza tais chamadas telefônicas foram analisadas por agentes da Polícia Federal."

Entre os exemplos registrados em relatórios estavam conversas entre os advogados Cristiano Zanin e Roberto Teixeira e também com Nilo Batista a respeito de estratégias jurídicas a serem adotadas.
 
O monitoramento telefônico do escritório estava vigente na época em que Lula foi levado em condução coercitiva para prestar depoimento, por ordem de Moro, em 4 de março de 2016.

À época, a decisão de Moro de grampear os advogados de Lula foi questionada pelo ministro Teori Zavascki, do STF, morto em janeiro de 2017. Moro respondeu que houve equívoco dos procuradores da Lava Jato, que teriam identificado a linha telefônica como sendo da empresa de palestras do ex-presidente.

A defesa de Lula usa dois comunicados da empresa de telefonia responsável pelas linhas como prova de que Moro foi informado se tratar de um escritório de advocacia -apesar de ele ter alegado equívoco com a avaliação de que pertenciam à empresa de palestras do petista.

O material da gravação de conversas entre advogados foi parar no STF porque, entre os diálogos, havia também conversas de Lula com a então presidente Dilma. Depois do impeachment da petista, o material voltou para as mãos de Moro, na primeira instância da Justiça.
 
Apesar de admitir erro e pedir desculpas ao ministro Teori, Moro não destruiu os áudios das conversas entre os advogados e ainda deu acesso do material a outras pessoas que faziam parte do processo.
 
O material com grampo considerado ilegal, o que incluiria as horas de conversas entre os defensores do ex-presidente, só foi inutilizado em março de 2018, após decisão do juiz João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).

Moro também determinou interceptação telefônica no celular do advogado Roberto Teixeira, sócio da banca Teixeira, Martins & Advogados e compadre de Lula. Nesta ocasião, porém, a justificativa foi a de que Roberto Teixeira era suspeito de crime no caso do sítio de Atibaia. O advogado foi condenado neste caso a 2 anos de prisão por lavagem de dinheiro.

A OAB afirmou que em 2016, quando foi revelada a interceptação das conversas, o seu conselho federal solicitou ao ministro Teori Zavascki, então relator da Lava Jato no Supremo, que "decretasse sigilo e posterior destruição das conversas tanto do celular do advogado Roberto Teixeira quanto do telefone do escritório".

No ano seguinte, a OAB pediu para "ingressar, como terceiro interessado, no processo no qual a banca Teixeira, Martins & Advogados pedia que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região determinasse a destruição do material gravado em grampo feito no escritório".