Câmara de BH

O Ministério Público Eleitoral (MPE) emitiu, nessa segunda-feira (25/11), parecer favorável à cassação do mandato do vereador de Belo Horizonte Lucas Ganem (Podemos). A manifestação da promotora Silvia Altaf da Rocha Lima Cedrola concluiu que há indícios de fraude na transferência do domicílio eleitoral do parlamentar, corroborando as investigações da Polícia Federal (PF) que apontam que Ganem não morava na capital mineira quando disputou as eleições de 2024.

A ação contra Ganem foi movida pelo primeiro suplente da chapa, o ex-vereador Rubão. Caso a Justiça Eleitoral acolha o pedido do Mistério Público e julgue a ação procedente, Ganem perderá o cargo. Ele foi eleito nas eleições do ano passado com mais de 10 mil votos.

O ponto central do parecer do MP se baseia na falta de provas de que Lucas Ganem morasse efetivamente em Belo Horizonte antes de transferir seu título, em fevereiro de 2024. Segundo a promotoria, "não foram identificadas contas de água, energia elétrica ou telefonia em seu nome na capital mineira em período anterior ao pedido de transferência do domicílio eleitoral".

A investigação confirmou que o endereço declarado pelo vereador à Justiça Eleitoral, uma casa no Bairro Trevo, na Pampulha, nunca pertenceu a Ganem. O inquérito da Polícia Federal, aberto em outubro após denúncia anônima, já havia revelado que, ao chegarem ao local, os agentes foram recebidos por Fernanda Fraga.

Em depoimento citado pelo MP, Fernanda afirmou que mora no imóvel há mais de 10 anos com o marido e garantiu desconhecer Lucas, afirmando categoricamente que "ele não reside e nem residiu no local". O parecer do MP destaca que a própria Justiça Eleitoral teve dificuldades para encontrar o vereador.

Um mandado enviado ao endereço mencionado pelo parlamentar retornou sem cumprimento, pois ele não foi localizado. Apenas posteriormente, o vereador foi encontrado em seu gabinete na Câmara Municipal de Belo Horizonte.

Além da questão do imóvel, o Ministério Público ressaltou que os vínculos de Ganem permaneciam concentrados em São Paulo, sua terra natal. O parecer aponta que "grande parte dos fornecedores contratados [para a campanha] eram provenientes do Estado de São Paulo", o que, para a promotoria, reforça que sua base de atuação não era Belo Horizonte.

A conclusão se alinha aos dados levantados pela investigação policial, que mostram que Ganem renovou sua CNH em 2024 fornecendo um endereço na Vila Prudente, na capital paulista, e que parte de seus assessores nomeados na Câmara Municipal de BH vieram de Indaiatuba (SP), cidade onde ele atuou como assessor até 2023.

Testemunhas ouvidas no processo relataram que a campanha enfrentou dificuldades logísticas inéditas, como a impossibilidade de entregar materiais (placas e santinhos) no endereço residencial indicado, pois o candidato "não possuía comitê de campanha ou equipe para recebimento de material", algo considerado atípico.

"A testemunha Neli Pereira de Aquino relatou que o partido enfrentou dificuldades para entregar material de campanha (placas, santinhos etc.) no endereço informado, tendo o local sido visitado várias vezes, sem êxito. A testemunha também afirmou que, após as eleições, soube que o impugnado estava procurando apartamento na cidade, o que demonstra que ele não possuía residência fixa até então", diz trecho do documento citando a deputada federal Nely Aquino (Podemos).

Outra testemunha do Podemos, Leonardo Silveira Gusmão, disse ter tentado contato com Ganem em pelo menos duas ocasiões, sem sucesso, "pois não foi atendido no endereço supostamente residencial por ele indicado".

"A testemunha também afirmou que, após as eleições, soube que o impugnado estava procurando apartamento na cidade, o que demonstra que ele não possuía residência fixa até então", complementa.

Em sua defesa no processo, Lucas Ganem argumentou que possui vínculos com a capital mineira e que o imóvel no bairro Trevo lhe havia sido "cedido por um amigo". A defesa tentou ainda extinguir o processo alegando que a via judicial escolhida ação era inadequada, sustentando que a questão do domicílio já estaria preclusa - isto é, fora do prazo para questionamento.

No entanto, o Ministério Público rejeitou as preliminares da defesa, citando jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que entende o conceito de fraude de forma ampla, englobando qualquer ato que afete a normalidade das eleições, inclusive a simulação de domicílio.

Para a promotoria, a transferência de título exige comprovação de vínculos sociais, patrimoniais ou familiares, e "nenhum desses vínculos se mostrou existente ou minimamente consistente antes da transferência".

A reportagem procurou o vereador Lucas Ganem para comentar o parecer do Ministério Público, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição. O espaço segue aberto para manifestação.