O ministro da Justiça, André Mendonça, negou à defesa do ex-presidente Lula acesso a documentos de uma colaboração internacional informal feita entre procuradores de Curitiba e autoridades dos Estados Unidos. A decisão foi proferida na última sexta-feira (26/6).


A defesa de Lula, feita pelo advogado Cristiano Zanin, solicitou a cópia integral de todos os registros relativos ao intercâmbio de informações, contatos, provas e procedimentos entre Brasil e EUA no que diz respeito às investigações relativas à Petrobras na "lava jato". 

Mendonça acolheu parecer da Advocacia-Geral da União afirmando que o DRCI possui "funções institucionais relacionadas apenas ao acompanhamento das peças necessárias à instrução do pedido de cooperação internacional, não tendo acesso à integralidade das informações constantes nos processos". 

A AGU também disse que o fornecimento das informações poderia comprometer medidas judiciais eventualmente em andamento, tais como apreensão de passaportes, prisões, e operações de buscas e apreensão.

A primeira solicitação foi feita em 16 de março, com base na Lei de Acesso à Informação. A providência foi adotada em uma frente de investigação defensiva, autorizada pelo Provimento 188/18 do Conselho Nacional da OAB, que permite que a defesa possa requerer documentos diretamente de órgãos públicos e privados, sem passar pelo Judiciário. 

Departamento de Justiça dos EUA


Na petição, a defesa de Lula cita declarações feitas por Kenneth Blanco, ex-vice-procurador geral adjunto do Departamento de Justiça Norte-Americano (DoJ), e por Trevor McFadden, ex-secretário geral de justiça adjunto interino do DoJ. 

Em uma de suas falas, Blanco admitiu a existência de uma rede de colaboração entre Brasil e EUA para "construir casos" e aplicar punições aos acusados, especialmente nos processos em trâmite na "lava jato".

O membro do DoJ também fez referência ao processo do tríplex do Guarujá, em que Lula foi condenado por supostamente receber um imóvel como propina da OAS. Em troca, o ex-presidente facilitaria contratos com a Petrobras. 


"Com supedâneo na Súmula Vinculante 14, o ex-presidente Lula tem legítimo interesse e direito de ter acesso a todos os registros relativos ao intercâmbio de informações, contatos, encontros, provas, procedimentos e investigações entre as autoridades locais e norte-americanas sobre os desmandos havidos na Petrobras, ora investigados no âmbito da operação 'lava jato'", afirma a defesa de Lula. 

O advogado do petista também diz que a cooperação em moldes informais é incompatível com o Decreto 3.810/01, que incorporou ao ordenamento jurídico o acordo de assistência judiciária em matéria penal. 

De acordo com a previsão, o alcance da assistência mútua abarca fases preventivas, investigativas e persecutórias, incluindo o depoimento ou declaração de pessoas, o fornecimento de documentos, registros e bens, além da entrega de documentos. As fases, diz a defesa, não foram respeitadas no caso Lula. 

"O aludido acordo é categórico no sentido de que cada parte deve designar uma autoridade central para 'enviar e receber solicitações', sendo que para a 'República Federativa do Brasil, a autoridade central será o Ministério da Justiça' e no caso dos EUA, 'a autoridade central será o procurador-geral ou pessoa por ele designada', devendo tais autoridades comunicar-se entre si 'diretamente para as finalidades estipuladas neste tratado'", afirma a solicitação assinada por Zanin. 

Sigilo

Em 27 de março, Fabrizio Garbi, diretor-adjunto do DRCI, negou o pedido de acesso aos documentos relativos à cooperação internacional. Na ocasião, Garbi argumentou que não seria possível avaliar a necessidade de sigilo do material. Dessa forma, o compartilhamento poderia atrapalhar investigações em andamento. 

A defesa de Lula recorreu e o caso caiu na mesa de Vladimir Passos, então secretário nacional de Justiça do ex-ministro Sergio Moro. Ele negou sob o mesmo princípio: poderia haver a necessidade de sigilo com relação aos documentos. 

À ConJur, Zanin disse que "todo ato do poder público deve ser passível de revisão, assim, não se pode cogitar de segredo ou sigilo absoluto decretado por órgão público que deveria ter intervenção direta no assunto". 

"Já a afirmação de que o DRCI não possui informações sobre a cooperação internacional acaba por confirmar que as tratativas entre Brasil e EUA se deram de forma ilegal", afirma. 

"Ao reconhecer que não dispõe das informações sobre a cooperação, o Ministério da Justiça está confirmando que a cooperação das autoridades norte-americanas com a "lava jato" foi informal, direta com a força-tarefa, e, portanto, ilegal, uma vez que não obedece o que consta no Tratado firmado entre o Brasil e os Estados Unidos em matéria de cooperação penal."