Do UOL, em Brasília
A inclusão do presidente Michel Temer (MDB) em mais um inquérito em andamento no STF (Supremo Tribunal Federal), nesta sexta-feira (2), não deverá trazer riscos na Justiça ao emedebista pelos próximos nove meses.
A Polícia Federal apura se o empresário Marcelo Odebrecht acertou um repasse ilícito de R$ 10 milhões para campanhas eleitorais do MDB em troca do atendimento de interesses de sua empreiteira. A negociação teria ocorrido durante jantar no Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer, em maio de 2014, cinco meses antes das eleições daquele ano. Na ocasião, ele ainda era vice-presidente da República.
Como o suposto crime em apuração teria ocorrido antes de o emedebista assumir a Presidência, ele goza de "imunidade temporária" enquanto estiver no exercício do mandato, que se encerra em 31 de dezembro. Desta forma, Temer só pode ser eventualmente denunciado pelo caso quando deixar o Palácio do Planalto.
A "proteção" é garantida pela Constituição Federal. Consta do parágrafo 4º do artigo 86 que "o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções".
No despacho que autorizou a investigação do emedebista a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República), o ministro do STF Edson Fachin sustentou que a imunidade temporária do texto constitucional impede a responsabilização do presidente por crimes cometidos antes do mandato, mas decidiu que a investigação criminal pode ocorrer para, "por exemplo, evitar dissipação de provas".
"Tal contexto há de ser posto à prova, e opportuno tempore, à luz das garantias processuais constitucionais", escreveu Fachin, utilizando expressão em latim que significa "em tempo oportuno".
Outros inquéritos contra Temer não têm imunidade
A "imunidade temporária" não se enquadra em outros três casos abertos contra Temer no STF, dois deles já arquivados provisoriamente pela Câmara dos Deputados. Isso porque os supostos crimes cometidos nesses três processos ocorreram quando ele já era presidente da República.
Uma das investigações contra o presidente, ainda em andamento no Supremo, apura se ele favoreceu, em troca de propinas, uma empresa que atua no porto de Santos (SP) por meio de um decreto assinado em maio do ano passado.
Nas circunstâncias apuradas nesse inquérito, o emedebista já havia assumido a Presidência e desempenhava suas funções ao editar o documento posto em suspeita. No Supremo, o caso é relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso, que nesta semana autorizou a prorrogação do prazo das investigações por 60 dias.
Neste processo, a PGR pode oferecer denúncia contra Temer à Justiça ainda em 2018. O pedido de abertura de uma ação penal contra o presidente teria que passar pelo crivo da Câmara dos Deputados, como também determina a Constituição.
Isso aconteceu duas vezes no ano passado, mas ambas as denúncias foram suspensas pelos parlamentares. Na Presidência da República, Temer só poderia ser julgado pelo STF e se houvesse autorização dos deputados.
"O processo fica sobrestado, em estado de suspensão", explica o advogado e professor direito penal Leonardo Pantaleão. "Indícios colhidos durante esse processo podem ser utilizados em outras investigações."
Quando Temer deixar o cargo, as denúncias --pelos crimes de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, baseadas nas delações da JBS e do doleiro Lúcio Funaro-- devem passar pelo aval de um juiz de 1ª instância. Isso porque ele perderá o chamado "foro privilegiado".
Apesar de negar publicamente, o presidente cogita disputar as eleições deste ano. Se vencer o pleito, o prazo para o julgamento das denúncias será adiado em mais quatro anos. Na última pesquisa Datafolha, divulgada em 31 de janeiro, Temer teve 1% de intenções de voto e o maior índice de rejeição entre os pré-candidatos, de 60%.