O ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou nesta segunda-feira (17) que o Palácio do Planalto não vê "clima" nem "ambiente” político para o avanço do PL do Aborto no Congresso Nacional. Ainda segundo ele, o governo federal e diversos líderes da Câmara nunca fizeram o compromisso de votar o mérito da proposta. 

"O fato de ter sido aprovado no requerimento de urgência nesse tema do jeito que foi em nenhum momento significa qualquer compromisso de votação do mérito. Eu, inclusive, pelo o que eu ouço dos líderes, acredito que não tenha clima e ambiente (para votação). E nunca teve compromisso, inclusive dos líderes, e não só do governo, de votar o mérito", disse Padilha. 

Ele avaliou que não há ambiente nem mesmo para dar continuar ao debate do texto. “É um projeto, como eu falei para vocês, de um projeto que estabelece uma pena para o estuprador menor do que para a a menina ou mulher estuprada. Então, eu acredito que não tenha ambiente para isso”, completou. 

As declarações foram dadas após reunião entre ele e lideranças responsáveis pela articulação política do governo no Congresso Nacional com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Padilha ainda reiterou dois compromissos do governo.

O primeiro é o acordo de Lula, inclusive com líderes religiosos, de não promover qualquer alteração na legislação atual referente ao aborto. O segundo é a manutenção da orientação do Palácio do Planalto de que temas polêmicos, que podem gerar conflitos entre os parlamentares, não estejam no centro agenda legislativa.

No último sábado, Lula chamou o projeto de “insanidade”, mas reiterou seu posicionamento contrário ao aborto. “Eu acho que é insanidade alguém querer punir uma mulher com uma pena maior do que o criminoso que fez o estupro”, afirmou. “Eu sou contra o aborto. Entretanto, como o aborto é uma realidade, a gente precisa tratar como uma questão de saúde pública".

Mesmo confiantes de que o projeto tem cerca de 300 votos, o suficiente para ser aprovado na Câmara dos Deputados, parlamentares da bancada evangélica avaliam que é preciso esperar o debate sobre o tema — nas ruas e nas redes sociais — esfriar antes de avançar na Casa. 

A proposta ganhou repercussão na última quarta-feira (12), quando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), fez uma manobra regimental que foi aprovada simbolicamente em apenas 24 segundos, conferindo urgência ao texto. Com isso, a proposição não precisará passar por nenhuma comissão temática e será avaliada diretamente pelo plenário.

O projeto de lei (1904/24) equipara ao crime de homicídio simples a realização do aborto após a 22ª semana de gestação, mesmo em situações previstas por lei. Atualmente, o aborto é permitido no Brasil em três situações: gravidez resultante de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. 

A principal polêmica diz respeito à severidade da pena. Segundo a proposição, mesmo nos casos autorizados por lei, se o aborto for realizado após a 22ª semana de gestação, a mulher poderá ser acusada de homicídio simples, com pena de 6 a 20 anos. Essa punição é mais dura do que a destinada a estupradores, que varia de 6 a 10 anos para vítimas adultas e de 8 a 12 anos para vítimas menores de idade.

Deputados consideram abrandar o texto
Internamente, os deputados consideram abrandar esse trecho para evitar a impressão de que estupradores estão sendo tratados com impunidade. Uma mudança no Código Penal para aumentar a pena por violência sexual foi mencionada como uma possibilidade, mas os parlamentares avaliam que essas alterações seriam mais difíceis de implementar.

O cálculo político agora é esperar o melhor momento para que a proposta seja colocada em votação. A avaliação é de que a repercussão negativa já era esperada e, com isso, o projeto pode ficar engavetado até o segundo semestre. No entanto, esses parlamentares acreditam que a postura permanece "fiel" ao eleitorado.

Além disso, membros da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) citam ainda que, mesmo se a proposta não for aprovada ou ficar fora da pauta, os parlamentares já se consideram vencedores.  No entendimento deles, a bancada já conseguiu mostrar aos eleitores que está empenhada em atender suas demandas, apesar “da resistência dos esquerdistas".

Além de fortalecer a narrativa em um ano eleitoral, a negociação concede a eles mais espaço nas negociações na Câmara, onde o "Centrão" atualmente detém o poder e Arthur Lira pretende eleger um sucessor.  A FPE é considerada como um fator importante nessas negociações, já que conta com 205 membros.