DIPLOMACIA
 

Embora o presidente Jair Bolsonaro tenha exagerado na resposta à declaração da alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, de que o espaço democrático está encolhendo no Brasil, o governo não vai recuar, segundo fontes do Palácio do Planalto. Nos meios diplomáticos, o clima de confronto gerou apreensão sobre um possível mal-estar no discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, que o presidente fará no próximo dia 24, em Nova York. A reação agressiva de Bolsonaro contra a ex-presidente chilena, lembrando a morte do pai de Bachelet, torturado e morto na ditadura de Augusto Pinochet, provocou constrangimento, nesta quinta-feira (6/9), durante a primeira visita ao país do ministro das Relações Exteriores do Chile, Teodoro Ribera.


Ainda que pessoas próximas ao Planalto tenham avaliado que Bolsonaro perdeu o tom, por Bachelet ser mulher, núcleo da família tão defendida pelo presidente e seus aliados, a saída diplomática foi colocar panos quentes, diante da relevante parceria comercial entre Brasil e Chile. Após encontro com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na manhã desta quinta-feira (6), Ribera afirmou que a relação entre os dois países “transcende” pessoas e governos.


O embaixador Marcos Azambuja, conselheiro emérito do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), ex-secretário geral do Itamaraty, considerou a postura de Ribera correta. “A relação Brasil-Chile obriga à superação. Claro que os episódios têm impacto, seria preferível que nada tivesse ocorrido, mas os dois países são importantes um para o outro, a colaboração é intensa. Ao Brasil, interessa ter um vizinho com projeção sobre o Oceano Pacífico, aos chilenos interessa o nosso imenso mercado”, avaliou.

À tarde, após almoço no Itamaraty, o chanceler chileno e o ministro brasileiro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, agiram como se nada tivesse acontecido e apenas comentaram o resultado do encontro, focado nas oportunidades comerciais entre os dois países. Para Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior, apesar do efeito diplomático sério, não dá para dizer que a troca de farpas terá impacto econômico imediato. “O que vem acontecendo nos últimos meses é um desgaste com vários parceiros comerciais do país, e o Chile é o segundo principal mercado brasileiro na América do Sul. Isso afeta a marca país, ou seja, a percepção sobre o Brasil, sobre os produtos brasileiros, sobre o turismo no Brasil.”


Farpas


As recentes declarações de Bolsonaro não devem, no entanto, interferir no discurso do brasileiro na ONU, segundo um interlocutor do governo. “Se o Brasil for boicotado, boicotará, também, outros chefes de Estado, em seus respectivos discursos”, disse. Porém, a ideia é deixar no Brasil as farpas trocadas com Bachelet e com o presidente da França, Emmanuel Macron. Bolsonaro deve usar um tom firme no que diz respeito à soberania do país sobre a Amazônia e enaltecer os avanços na segurança pública, destacando a redução de 20% na criminalidade em seis meses.


No entender de Creomar de Souza, analista político da consultoria Dharma, Bolsonaro tem um temperamento de confrontação. “Quando se sente acuado, a reação é sempre assim. E será diante da próxima crítica internacional. Isso mantém coesa a base eleitoral que ele possui e que espera dele demonstração de firmeza”, afirmou. “Do ponto de vista estratégico, gera dificuldades. O trabalho de abertura na ONU não é de confrontação, mas pode acontecer algum tipo de crítica”, acrescentou.


Aproximação com os EUA


A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse nesta quinta-feira (6/9) que é necessário estreitar as relações comerciais do Brasil com os Estados Unidos para que o país possa ter mais fontes de investimento. “Os Estados Unidos são o segundo principal destino das nossas exportações e, também, origem das importações. Temos uma relação equilibrada em termos comerciais”, disse a ministra, durante a conferência Agenda do Brasil para Crescimento Econômico e Desenvolvimento, organizada pelo Council of the Americas (COA).