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O nome da deputada federal Dani Cunha, do União Brasil do Rio de Janeiro, tem sido mencionado nos bastidores como uma das principais candidatas para relatar o projeto de lei que propõe equiparar o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio simples, mesmo em casos permitidos por lei - PL 1904/24.

Parlamentares apontam a estreita relação com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), como um fator que pode ser decisivo para a escolha. Segundo deputados ouvidos pela reportagem de O TEMPO, Dani Cunha, que se autodenomina "pró-vida" e "serva de Deus", é considerada como um “nome moderado” para o posto pela bancada evangélica. 

Na última quinta-feira (13), após repercussões negativas da proposta, Lira afirmou que designaria "uma deputada mulher, de centro e moderada" para relatar o texto. Há também quem cite que a parlamentar “não se importa com pressão popular” e já "está calejada" com críticas por ser filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha.

Antes de assumir o mandato como deputada federal, Dani Cunha trabalhou com marketing político e estreitou laços com figuras influentes do Centrão, como o hoje ministro do Esporte, André Fufuca (PP-MA), e Arthur Lira. A relação entre ela e o alagoano, inclusive, remonta à época em que Eduardo Cunha era presidente da Casa. 

Durante esse período, Lira foi um dos membros mais leais da tropa de choque de Cunha. Nos bastidores, parlamentares lembram que um dos motivos que podem fazer com que Dani seja escolhida para relatar a proposição é justamente a influência do pai dela. Quando presidente da Câmara, ele tentou avançar em temas relacionados ao aborto.

Foi ele o autor do projeto, apresentado ainda em 2013, que buscava restringir o acesso ao aborto legal no Brasil. A matéria chegou a ser aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas não foi votada em plenário devido à intensa pressão popular. Em função do texto, foram realizados protestos em todo o país em 2015.

A proposta criminalizava a propaganda, o fornecimento e a indução ao aborto e a métodos abortivos, "ainda que sob o pretexto de redução de danos". Ela previa penas de detenção de quatro a oito anos se o agente fosse funcionário da saúde pública ou exercesse a profissão de médico, farmacêutico ou enfermeiro. 

Também estipulava prisão de cinco a 10 anos, com aumento de um terço da pena, se a gestante fosse menor de idade e tivesse sido induzida a usar substância ou objeto abortivo, ou recebesse orientação, ou auxílio para a prática de aborto.  Além de Cunha, outros 12 parlamentares subscreveram o PL. Naquela ocasião, Lira votou a favor da proposta. 

Com apoio de Lira, filha de Eduardo Cunha ganhou destaque na Câmara

Herdeira política do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, a deputada federal ganhou destaque durante o primeiro mandato ainda no ano passado. Graças à influência de Arthur Lira, Dani Cunha assumiu papéis de protagonismo que raramente são atribuídos a parlamentares “novatos”. 

Um exemplo disso foi a nomeação como presidente do grupo de trabalho encarregado da minirreforma eleitoral. Já neste ano, ela também foi relatora de um projeto de interesse de setores econômicos que modificou a Lei de Recuperação Judicial e Falências (PL 3/2024). Aprovado na Câmara, a matéria precisa agora do aval dos senadores. 

 Além disso, uma proposição de autoria dela, que criminaliza a discriminação de pessoas "consideradas politicamente expostas", ou seja, políticos, teve tramitação rápida na Casa. A proposição foi aprovada diretamente em plenário em 2023, sem passar por comissão. O texto, que prevê prisão de dois a quatro anos e multa, tramita agora no Senado.

Entenda o PL do Aborto

Na última quarta-feira (12), a Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência para o projeto de lei (1904/24), que equipara ao crime de homicídio simples a realização do aborto após a 22ª semana de gestação, mesmo em situações previstas por lei. A aprovação da manobra regimental ocorreu em apenas 24 segundos.

O projeto foi apresentado pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e outros 32 parlamentares. Com o regime de urgência, a proposta pode ser levada diretamente ao plenário, sem necessidade de passar pelas comissões temáticas. A decisão sobre quando o texto será analisado cabe ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Atualmente, o aborto é permitido no Brasil em três situações: gravidez resultante de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia do feto. Enquanto os dois primeiros casos estão previstos no Código Penal de 1940, o último foi permitido pelo Supremo Tribunal Federal em 2012. Não há, entretanto, um limite de semanas para a realização do procedimento.

A proposta em tramitação na Câmara prevê que, mesmo nesses casos autorizados por lei, se o aborto for realizado após a 22ª semana de gestação, a mulher poderá ser acusada de homicídio simples, com pena que varia de 6 a 20 anos. Essa punição é mais severa do que a destinada a estupradores: para vítimas adultas, a pena é de 6 a 10 anos, e para vítimas menores de idade, varia de 8 a 12 anos.

Se o texto for aprovado no plenário da Câmara, seguirá para o Senado. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), declarou que um tema dessa natureza não será tratado com urgência na Casa. Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)  considerou o projeto uma “insanidade”. 

 

Fonte: O TEMPO