Em entrevista ao jornal The Guardian, Mandetta acusou o presidente brasileiro de desempenhar um papel "fundamental" na condução do Brasil para uma catástrofe. "Bolsonaro jogou política com a vida dos cidadãos em um momento de crise global", disse ele.


O Brasil hoje tem mais de 105 mil mortes relacionados a covid-19. Atrás somente dos Estados Unidos, tanto em número de casos e óbitos.

Mandetta, que insinuou que vai desafiar Bolsonaro para a presidência em 2022, tornou-se um nome familiar nos estágios iniciais da pandemia deste ano. Ele arrancou elogios da esquerda e da direita por seus alertas acessíveis e baseados em ciência sobre a ameaça do coronavírus durante conferências diárias de imprensa.

O médico ortopedista foi nomeado ministro da saúde em novembro de 2018, logo após a eleição de Bolsonaro. Mas ele foi demitido em meados de abril, depois de ser desafiado publicamente por Bolsonaro em relação ao distanciamento social.

No dia em que Mandetta foi demitido, o número de mortos de covid-19 no Brasil era cerca de 2 mil. Quatro meses depois, subiu para mais de 105 mil. O ex-ministro é um dos muitos que culpam Bolsonaro pela escala da tragédia.


Segundo ele, a luta contra a covid-19 foi fatalmente comprometida pelo "desprezo absoluto pela ciência" de Bolsonaro - que menosprezou a doença como uma "pequena gripe" e apoiou diversas vezes tratamentos ineficazes, como a cloroquina e hidroxicloroquina.

"É interessante que ele rejeite totalmente a ciência e zombe de todos aqueles que falam de ciência. No entanto, quando há qualquer perspectiva de uma vacina ele é o primeiro a vir bater na porta da ciência ... como se uma vacina iria redimi-lo de sua marcha desconcertante através desta epidemia", disse ele ao jornal britânico.

Mandetta também atacou a "sabotagem completa" de Bolsonaro no Ministério da Saúde. Depois que Mandetta e sua equipe foram despejados, outro ministro da saúde, Nelson Teich, assumiu o comando, mas durou menos de um mês depois de também entrar em conflito com o presidente sobre a covid-19. Desde maio, o ministério tem um general do exército sem experiência médica como líder interino.

"Quando você está em uma situação onde você se cerca de pessoas que dizem o que você quer ouvir e não a verdade ... o líder acaba cegando a si mesmo para o que está acontecendo", afirmou Mandetta. "Ele ouve, mas não ouve. Ele olha, mas não vê."


O ex-ministro ainda alertou que, sem uma mudança urgente na direção, o número médio de mortes diárias - que tem sido próximo ou superior a 1.000 por quase três meses - só poderia cair no final de setembro.

"Espero que o líder que sair vitorioso em 2022 seja capaz de reconstruir o tecido social quebrado do Brasil, dando a este país um senso de unidade... e aceitar que não é normal sair por aí dizendo que os brasileiros gostam de rolar no esgoto", disse Mandetta.